A revolução da misericórdia atinge o ex-Santo Ofício “imoral”, homofóbico e contra os pobres

Capela do Dicastério para a Doutrina da Fé. (Foto: Reprodução | Vatican News)

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05 Julho 2023

"O papa nomeou seu compatriota Víctor Manuel Fernández, conhecido como Tucho, presidente do Dicastério para a Doutrina da Fé (antigo Santo Ofício) e nunca como desta vez realizou um ato revolucionário em nome da misericórdia proclamada desde o início de seu pontificado".

O comentário é de Fabrizio D'Esposito, publicado por Il Fatto Quotidiano, 03-07-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis o comentário.

A nomeação do novo prefeito, até então arcebispo de La Plata, é de fato um golpe mortal para o árido, feroz e rígido doutrinarismo clerical perseguido até o papado de Bento XVI (por sua vez também prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé). O trecho duríssimo e crucial da carta de Francisco a Víctor Fernández, que faz tábula rasa de séculos de caça aos hereges, é este: “O Dicastério que você presidirá, em outros tempos chegou a usar métodos imorais. Aqueles eram tempos em que, mais que promover o conhecimento teológico, perseguiam-se eventuais erros doutrinários. O que espero de você é, sem dúvida, algo muito diferente”. Uma caça às heresias que serviu para esmagar a parábola dos teólogos incômodos mesmo em tempos muito recentes.

Em 2006, por exemplo, a então Congregação presidida pelo cardeal William Levada processou o teólogo jesuíta Jon Sobrino, cujos textos eram estudados nos seminários e nas escolas católicas da América latina. A Congregação notificou a Sobrino seis "proposições" que não se conformavam com a doutrina. Em particular no primeiro relevo, "os pressupostos metodológicos enunciados pelo Autor, sobre os quais se fundamenta a sua reflexão teológica", o teólogo foi contestado por ter colocado a Igreja dos pobres, "Iglesia de los pobres", como "lugar teológico fundamental”. E o próprio novo prefeito Víctor Fernández foi acusado alguns anos atrás de ser herege pelo cardeal antibergogliano Müller, outro ex-chefe ratzingeriano da Congregação.

Pelo contrário, Francisco é alérgico "à teologia de gabinete", de "uma lógica fria e dura" – onde “as questões secundárias acabam por obscurecer aquelas centrais” – convida dom Víctor Fernández a “guardar o fé" numa atitude de diálogo aberto, num "crescimento harmonioso" no qual o pensamento cristão saiba apresentar com convicção "um Deus que ama, que perdoa, que salva, que liberta, que promove as pessoas e as chama ao serviço fraterno”. Obviamente, tal nomeação já desencadeou a reação violenta da direita clerical, que no passado atacou várias vezes este prelado, ex-reitor da Pontifícia Universidade Católica argentina. Descrito como o nocivo ghostwriter de alguns dos textos fundamentais de Bergoglio, entre os quais o Amoris laetitia, que traz uma abertura para divorciados recasados, o novo prefeito foi recentemente acusado de ter escrito um livro sobre a teologia do beijo e até de ser "gay e efeminado”, segundo as palavras de um seu coirmão argentino. É preciso lembrar que, com a reforma da Congregação para a Doutrina da Fé transformada em Dicastério, uma das tarefas “disciplinares” do novo prefeito será aquela dos abusos sexuais cometidos pelo clero contra menores de idade.

É assim, em 2016, que o ex-Santo Ofício é descrito por dom Krzysztof Charamsa em sua biografia, publicada após assumir sua homossexualidade. Para Charamsa, que foi teólogo polonês da Congregação para a Doutrina da Fé, era um lugar onde a homofobia era alimentada por cardeais e prelados que viviam sua homossexualidade das formas mais díspares.

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