19 Novembro 2021
O documento dos bispos dos Estados Unidos sobre a “coerência eucarística” pode desaparecer silenciosamente, mas a ineficácia das lideranças da nossa Igreja permanecerá.
Publicamos o editorial do jornal National Catholic Reporter, 18-11-2021. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Em sua assembleia geral de outono, os bispos dos Estados Unidos finalmente aprovaram, por um placar de 222 votos a oito e três abstenções, o tão falado documento sobre a “coerência eucarística”, originalmente projetado para abordar o problema de um presidente católico pró-escolha após a eleição de Joe Biden.
Em junho passado, quando alguns bispos dos Estados Unidos já estavam tentando desviar o documento de uma ênfase na negação da Comunhão a políticos pró-escolha, os convidados de um talk show da EWTN reclamaram que o fracasso em abordar essa questão resultaria na perda de credibilidade dos bispos.
“Se eles não fizerem nada, se eles produzirem um documento que poderia ter sido produzido antes de tudo isso começar e não disserem nada de especial sobre os políticos pró-escolha, então realmente será uma derrota para a Igreja”, disse o Pe. Gerald Murray, membro da chamada “Papal Posse”, ao apresentador Raymond Arroyo, no programa “The World Over”.
Cinco meses depois, o plano parece ser fingir que o documento nunca tinha nada a ver com os políticos – apesar das muitas evidências em contrário, inclusive por parte dos próprios bispos.
E muitos na ala direita subiram a bordo do enredo alternativo de que esse documento fazia parte de um esforço mais amplo de “reavivamento eucarístico”, um plano para a realização de eventos locais e nacionais que os bispos aprovaram separadamente em sua reunião de novembro.
Não é de se surpreender que os bispos culpem a mídia por fazer isso em relação a Biden. Que falta de imaginação.
O colunista católico conservador George Weigel, escrevendo na semana anterior à reunião de novembro, culpou a “grande imprensa que consistentemente deturpou o que os bispos estão fazendo” e afirmou que esse documento é apenas parte da “ânsia dos bispos em reacender a vitalidade e a reverência eucarísticas em toda a Igreja”.
Mas, acrescenta Weigel, “a revitalização eucarística será seriamente impedida, no entanto, se os bispos não se dirigirem diretamente à recepção da Sagrada Comunhão por quem não está em plena comunhão com a Igreja”.
Do lado de fora do hotel onde os bispos estavam reunidos de 15 a 17 de novembro, os manifestantes do evento “Bispos: já chega”, organizado pela organização midiática de direita Church Militant, foram mais contundentes: cartazes e oradores chamaram os bispos de “monstros de mitra” e de “sórdido enxame de escória e vilania” devido a diversos fracassos, incluindo o recuo em relação à intenção original do documento sobre a coerência eucarística.
“Vocês veem que escândalo para o mundo é o fato de os bispos não estarem utilizando toda a magnitude da sua autoridade e influência morais para pôr fim a esse assassinato em massa diário que está em curso?”, disse Jim Havens, organizador da Marcha Nacional de Homens pelo Fim do Aborto que ocorreu no dia 15 de novembro em Baltimore, à multidão do Church Militant.
Portanto, o fato de os bispos terem aprovado, sem muito alarde, um documento brando que, de modo geral, ignora a questão dos políticos e da Comunhão provavelmente será visto por muitos na direita como uma capitulação e uma derrota. E os progressistas poderiam recolher isso como uma vitória.
Exceto pelo fato de que não se trata de uma vitória, nem mesmo forçando a imaginação.
Não se trata de uma vitória para os bispos dos Estados Unidos, que permanecem profundamente divididos, apesar de suas tentativas bem-sucedidas de manter a mensagem dentro do ângulo de leitura de que “nunca se tratou dos políticos”.
Não se trata de uma vitória para a Igreja, que sofreu durante um ano com as péssimas relações públicas que retrataram o catolicismo como apenas mais uma peça na guerra cultural.
Não se trata de uma vitória para todas as questões sobre as quais os bispos poderiam ter sido proféticos – especialmente durante este ano de pandemia e um tempo de acerto de contas racial –, mas, ao invés disso, preferiram colocar na mira o segundo presidente católico.
Não se trata sequer de uma vitória para a teologia eucarística, já que o documento, como foi aprovado, parece que poderia ter sido escrito antes do Concílio Vaticano II.
E certamente não se trata de uma vitória para a verdade, já que o presidente da Conferência Episcopal mentiu descaradamente em uma coletiva de imprensa sobre as origens do documento.
Não, não se trata de uma vitória. O documento dos bispos dos Estados Unidos sobre a “coerência eucarística” pode desaparecer silenciosamente, mas a ineficácia das lideranças da nossa Igreja permanecerá.
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EUA. Documento sobre Eucaristia desaparecerá, mas ineficácia dos bispos permanecerá. Editorial do National Catholic Reporter - Instituto Humanitas Unisinos - IHU