23 Julho 2021
Esta manhã numa conferência de imprensa a Comunidade fundada por Andrea Riccardi denunciou a situação insustentável em que se encontra a população moçambicana, há algum tempo à mercê do terrorismo. As novas gerações pagam o preço mais alto, afirma o padre Angelo Romano, da Assessoria de Relações Internacionais da Comunidade.
A entrevista é de Andrea De Angelis, publicada por Vatican News, 22-07-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Trinta milhões de pessoas. Estes são os habitantes de Moçambique, um país da África Oriental que se debate com uma crise que envolve e conturba a vida dos seus habitantes. Principalmente aqueles que vivem no extremo norte, na fronteira com a Tanzânia, na área de Cabo Delgado. Lá impera o terrorismo que causou centenas de milhares de refugiados internos nos últimos três anos, e especialmente nos últimos doze meses. Pessoas obrigadas a deixar tudo para fugir de ataques terroristas, mas nem sempre os deslocamentos levam à segurança: são muitas as vítimas, principalmente entre os menores, durante as viagens do desespero.
Mapa de Moçambique. (Fonte: Wikimedia Commons)
Esta manhã, numa conferência de imprensa intitulada “Não abandonemos o povo moçambicano, vítima do terrorismo”, a Comunidade de Santo Egídio ilustrou os efeitos da crise humanitária na população e as intervenções que têm realizado graças à sua presença no território moçambicano. O discurso foi proferido por padre Angelo Romano, da Assessoria de Relações Internacionais de Santo Egídio, que a seguir concedeu uma entrevista à Rádio Vaticano – Vatican News.
Padre Angelo, hoje vocês dirigem os holofotes para Moçambique, um país que muitas vezes é esquecido. Qual é a situação no momento?
No dia 4 de outubro de 1992, foi assinada em Roma, em Santo Egídio, a paz que colocava fim a uma guerra civil que durou quase 17 anos e que causou quase um milhão de mortos. Moçambique teve uma taxa de crescimento elevada, recomeçou, o país tinha todas as características para encarar o futuro com esperança. Em 2017, eclodiu uma revolta islâmica em Cabo Delgado, no extremo norte, na fronteira com a Tanzânia. Os ataques terroristas de uma organização que mais tarde passou a fazer parte, ao que parece também formalmente, do ISIS se multiplicaram. Ataques finalizados a destruir o tecido social para depois reconstruí-lo com as regras do autodenominado Estado Islâmico.
Ataques que atingem a população de forma indiscriminada. No ano passado, o número de refugiados internos cresceu enormemente, até hoje cerca de 740 mil pessoas, das quais apenas um décimo está em campos assistidos por agências internacionais. O maior número dessas pessoas refugiou-se em contextos familiares, em moradias improvisadas. A situação neste momento é, portanto, muito grave, afetando tanto a comunidade cristã como a muçulmana. Efetivamente, os terroristas consideram os muçulmanos que não seguem sua visão como inimigos, os perseguem da mesma forma que os outros. Trata-se de um projeto maligno e muito perigoso. Por muito tempo Moçambique não teve meios nem capacidade para enfrentar esta crise.
Qual tem sido a resposta da comunidade internacional, especialmente nos últimos meses? Está agindo de forma adequada?
Houve uma série de decisões, há uma intervenção de Ruanda em andamento e outra da comunidade dos estados da África Austral está prestes a começar. O treinamento europeu está começando, mas, como Santo Egídio, estamos convencidos de que a resposta não pode ser apenas militar. A população foi marginalizada, é necessário um esforço muito grande para reconquistar a confiança das pessoas e, neste sentido, a comunidade internacional pode desempenhar um papel importante.
Nesse "projeto maligno", como o definiu, que preço pagam os mais jovens? Muitas vezes o Papa, falando de cenários dramáticos, enfatizou o drama no drama que as crianças vivenciam. Qual é a situação dos pequenos no país?
As crianças estão pagando o preço mais alto desta crise. Estamos falando de uma porcentagem muito elevada desses refugiados, quase metade do total. Junto com as mulheres, representam 75% dos refugiados internos. Eles pagam o preço mais alto porque têm que interromper os estudos e muitos são sequestrados por terroristas para serem treinados como combatentes. Muitas meninas são sequestradas e escravizadas. Existe uma fragilidade adicional justamente na condição das crianças, expostas ao conflito. É preciso dizer também que esses refugiados internos, para escapar dos ataques terroristas, caminharam a pé ou se moveram em embarcações improvisadas por semanas, até meses. Muitos morreram de fome, de cansaço.
Santo Egídio aumentou sua ajuda humanitária a essas pessoas, atingimos cerca de 25 mil pessoas com centenas de toneladas de ajudas. Queremos fazer ainda mais, especialmente permitindo que as crianças estudem. Estamos construindo edifícios escolares em alguns campos de refugiados, trabalhamos para um programa de bolsas de estudo e graças a um programa já existente em Moçambique de registo de refugiados, denominado 'Bravo', atuamos para fornecer documentos a essas pessoas. De fato, mais da metade deles os perderam. Fugiram sem documentos ou os perderam no caminho e isso obviamente cria grandes problemas. A nossa ajuda consiste também em devolver-lhes os documentos necessários para poderem usufruir dos serviços do Estado.
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O grito de alarme da Comunidade Santo Egídio: não abandonemos os moçambicanos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU