21 Dezembro 2020
Pequeno, franzino, Dom Luiz Fernando Lisboa, de 64 anos, engana-nos pela fragilidade da aparência. Basta começar a falar para, na humildade e serenidade das suas palavras, percebermos como é grande o missionário que ali se esconde. Brasileiro de nascença, Passionista de Congregação, Dom Luiz é missionário em Moçambique há quase 20 anos. Foi escolhido para ser o Bispo de uma das zonas mais ‘quentes ‘da África Oriental: a Diocese de Pemba que tem por geografia a Província de Cabo Delgado.
A reportagem é de Tony Neves, missionário Espiritano em Roma, publicada por Consolata América, 21-12-2020.
Por muitas razões (ainda pouco claras), esta região do norte de Moçambique está a ferro e fogo, sobretudo desde 2017. Grupos armados invadem povoações, matam (mais de 2 mil), destroem, semeiam o pânico e põem as pessoas em fuga. São já muitos milhares os deslocados (mais de 600 mil), muitos abandonados à sua pobreza, apenas ajudados pelas famílias, pelo bom povo da região e por instituições como a Caritas da Diocese de Pemba.
O rosto mais notável da denúncia desta situação e da tragédia que este povo sofre é o do seu Pastor, Dom Luiz Lisboa, que tem a cabeça a prêmio. Os seus gritos ao mundo têm ecoado e irritado muita gente, mas também aberto muitos caminhos de solidariedade. O Papa Francisco fez da tragédia de Cabo Delgado tema da sua intervenção e bênção ‘Urbe et Orbe’ de Páscoa, em Roma. Depois, telefonou-lhe a 19 de agosto: ‘um grande susto porque nunca esperei um telefonema do Papa’ – confessa. Agora mandou apoio financeiro de 100 mil euros, ‘para construir dois hospitais de campanha para os deslocados’. Esta sexta-feira, 18, recebeu-o no Vaticano, ‘nuns longos e inesperados 45 minutos em portunhol’. Diz que este Papa vindo de uma periferia, ao se interessar pela dramática situação de Cabo Delgado traz as periferias para o centro: ‘isto tem tudo a ver com a Encarnação, com o Natal’. Mas, para o Bispo de Pemba, ‘não é possível viver o Natal sem pensar nas crianças que estão a viver nas tendas dos deslocados’.
Tudo isto e muito mais partilhou Dom Luiz na homilia da Eucaristia que presidiu na Igreja de Santa Maria ai Monti, em Roma, neste domingo, 20, com a participação de representantes da comunidade moçambicana, brasileira e amigos. Concelebraram cerca de 20 padres de Moçambique, Brasil e Itália. Os cânticos foram entoados pelo coro dos Moçambicanos Católicos na Itália (MOCATI). A celebração lembrou as vítimas da violência que arrasa o norte do país, bem como as pessoas atingidas pela pandemia e suas muitas consequências. No momento penitencial, o Bispo pediu perdão pelos pecados de cada um, ‘pelos que não pedem perdão e por aquelas empresas que não olham a meios para ter lucro e apenas zelar pelos seus interesses’.
Dom Luiz voltou a ser claro, durante a homilia, na denúncia da gravidade da situação que atinge as populações de Cabo Delgado. Insistiu na ideia de que a violência não tem motivações essencialmente religiosas, mas claramente econômicas: há jogos de interesses que têm a ver com a riqueza da região e a necessidade de expulsar as pessoas da área. O fato dos bandos armados se confessarem muçulmanos não é o mais relevante, segundo o Bispo, pois eles também matam crentes islâmicos.
Missa pela paz em Cabo Delgado celebrada na Paróquia Santa Maria ai Monti em Roma. (Foto: IMC/Jaime C. Patias)
Tenta explicar que não é mais possível silenciar a situação que ali se vive, mas, sobretudo, quer indicar-nos caminhos para apoiar as populações martirizadas e acabar com a tragédia. Pede três coisas: oração, denúncia das barbaridades para se combater a indiferença do mundo e solidariedade com ajuda financeira para apoiar as vítimas. É muito claro ao afirmar que reconstruir Igrejas não é a prioridade atual. Agora há que investir na reconstrução de vidas que é urgente salvar.
O Bispo fala em nome das pessoas que gritam por ajuda, mas a sua voz é fraca e não se ouve ao longe: ‘a voz da Igreja é a voz dos sem voz!’. A Igreja em Pemba é samaritana e as populações locais estão a dar ao mundo um exemplo enorme de hospitalidade: ‘há famílias que acolheram nas suas casas e quintais duas ou três famílias de deslocados!’.
No fim, Dom Luiz voltou a exprimir a sua grande convicção: ‘Deus não nos abandonou; Ele caminha conosco e sofre conosco’. E – citando a Fratelli Tutti do Papa Francisco – concluiu: ‘Somos todos irmãos e irmãs, responsáveis uns pelos outros’.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Dar a vida pela Missão em Moçambique: Bispo de Pemba celebra missa em Roma - Instituto Humanitas Unisinos - IHU