18 Março 2021
"O Brasil se move a passos de tartaruga. Não chegamos ainda a imunizar nem sequer 5% da população, ao mesmo tempo que se alastra com velocidade assustadora o colapso do sistema de saúde, seja público ou privado", escreve o Pe. Alfredo J. Gonçalves, cs, vice-presidente do SPM
Primeiro, segundo, terceiro, quarto Ministro da Saúde no transcorrer de um ano de pandemia. Depois de Luiz Henrique Mandetta, Nelson Teich e o general Eduardo Pazuello, agora é a vez do cardiologista Marcelo Queiroga. Antes dele, a Dra. Ludhmila Raijar não aceitou o convite de Bolsonaro para comandar a pasta. Disse haver incompatibilidade entre os princípios da ciência e o modo como o atual governo vem conduzindo a crise sanitária provocada pelo Covid-19. Disse também que, para combater o contágio avassalador do coronavírus não dá para abrir mão do uso de máscara, do isolamento social e da vacinação em massa. Discordou, ainda, do “tratamento precoce” patrocinado tanto pelo presidente quanto pelo ex-ministro Pazuello.
Então para que serve a troca? – perguntarão muitos! E com toda razão. O certo é que Bolsonaro não está buscando exatamente um ministro, um profissional de saúde, e sim uma figura que lhe seja submissa. Alguém que, sem críticas e sem pretensões de protagonismo, aceite a receita com a qual o governo federal diz estar enfrentando a pandemia. Receita que, não custa lembrar, em um ano já ceifou precocemente a vida de 280 mil pessoas, chegando atualmente a nada mais e nada menos do que quase 3 mil mortes diárias. Enquanto Mandetta, com formação médica, se indispôs com o capitão por sua transparência quando aos números e rumos da doença e por sua incômoda visibilidade; Nelson Teich, também ele com formação médica, se recusou incluir a cloroquina como remédio contra o Covid-19 devido à sua ineficácia científica; E. Pazuello, um general, foi acusado e está sendo investigado por negligência no colapso de Manaus – o que se pode esperar do novo ministro Queiroga? Tomara sua nomeação não seja uma forma camuflada de “mudar algo para manter tudo como está” (Tomasi di Lampedusa em Il gattopardo).
Leva ele, consigo, um plano para o combate efetivo ao coronavírus? Será capaz de caminhar na contramão da tropa de choque que rodeia os altos escalões do poder, impondo as prescrições científicas necessárias? Dispõem o Ministério da Saúde, em particular, e o Palácio do Planalto, em geral, de uma política sanitária que o momento presente está a exigir com toda a urgência? A dicotomia artificialmente perigosa entre economia e saúde continuará fazendo parte da regra do jogo, ou então, a partir de agora, levar-se-á na devida consideração que ambas as dimensões se encontram estritamente conectadas e são indissociáveis? Em outras palavras, combater o vírus é pavimentar o caminho para uma economia sólida e saudável. E inversamente, desde um ponto de vista econômico, investir e incrementar políticas sociais profundas e de longo prazo é tornar a população menos vulnerável a esses inimigos invisíveis. “Um político [ou politiqueiro, como se diz por aqui] pensa na próxima eleição” – afirmava James Freeman Clarke – “um estadista na próxima geração”. Desgraçadamente, a campanha para as eleições majoritárias de 2022 já se impôs com força e parece navegar de vento em popa!
Impõe-se, de imediato, uma aceleração vacinação. Por enquanto, o Brasil se move a passos de tartaruga. Não chegamos ainda a imunizar nem sequer 5% da população, ao mesmo tempo que se alastra com velocidade assustadora o colapso do sistema de saúde, seja público ou privado. Doentes às dezenas (ou centenas?) estão morrendo na lista de espera por um leito nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) abarrotadas. As equipes médicas e os trabalhadores da saúde em geral demonstram sinais de esgotamento. Se é verdade que em alguns poucos hospitais ainda restam leitos vagos, faltam profissionais para operá-los. Ao lado disso de uma maior rapidez no processo de vacinação e do reforço às unidades de saúde, porém, faz-se necessário seguir à risca as medidas mais restritivas determinadas não pelo poder federal, e sim pelos poderes estadual e municipal. Sem elas, o grau de contaminação seguirá agravando-se com vertentes cada vez mais contagiosas e letais. Sair à rua e provocar aglomeração sem absoluta necessidade de trabalho ou sobrevivência – não obstante as manifestações contrárias de um punhado de fanáticos – é ainda a forma mais perniciosa de “dar carona ao vírus corona”.
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