10 Dezembro 2020
O desmatamento, as queimadas e a mineração ilegal aumentaram nos últimos oito anos, sinalizando o avanço da devastação na região e uma tendência que não mostra sinais de reversão, segundo o novo Atlas de Raisg.
A reportagem é publicada por Amazônia.org, 08-12-2020.
O avanço das atividades extrativas, dos projetos de infraestrutura, incêndios, do desmatamento e da perda de carbono indicam que a Amazônia está muito mais ameaçada do que há oito anos. O novo Atlas Amazônia Sob Pressão da Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada (Raisg), lançado nesta terça-feira (08/12), faz uma radiografia das principais ameaças que pairam sobre a maior floresta tropical do mundo e o avanço da sua deterioração. A boa notícia é que os territórios indígenas e áreas naturais protegidas continuam a ser um escudo contra a devastação.
Segundo o Atlas, 7% do território amazônico está sob pressão “muito alta” e 26%, “alta”. As áreas de maior pressão estão localizadas nas regiões periféricas do bioma, em áreas montanhosas e de piemonte localizadas na Amazônia Ocidental, principalmente no Equador, no norte da Venezuela e no sul da Amazônia brasileira. As informações geradas neste Atlas podem facilitar a gestão da região por meio de políticas públicas abrangentes que levem em consideração a conectividade ambiental e climática de todo o território, conectividade que transcende as fronteiras dos países que a compartilham.
É a primeira vez desde 2012 que a Raisg decide reunir todos os seus grupos técnicos para trabalhar um retrato completo da situação da Amazônia. O Atlas foi atualizado a partir do trabalho de 10 grupos técnicos que geraram 23 mapas que mostram a situação de toda a região, além de dezenas de gráficos e tabelas informativas que facilitam o entendimento da complexidade socioambiental da região, seus conflitos, pressões, ameaças, bem como sua importância para a América do Sul e o planeta.
Embora 2003 continue sendo o pior ano para as florestas amazônicas desde 2000, com uma perda total de 49.240 km2, o desmatamento tem se acelerado desde 2012, após atingir o mínimo em 2010 (17.674 km2). A área perdida a cada ano triplicou entre 2015 e 2018. Só em 2018, 31.269 km2 foram desmatados em toda a Amazônia, o maior desmatamento anual desde o pico em 2003.
Entre 2000 e 2018, o avanço do desmatamento na região amazônica acumulou a perda de 513.016 km2 de floresta nativa, um território equivalente à área da Espanha, 8% da área total de 6,3 milhões de km2 de floresta que existia em 2000.
A realidade regional pode ser diferente da nacional(2) em cada país amazônico. A tendência descrita para toda a Amazônia é fortemente determinada pela situação do Brasil, que concentra 61,8% do território amazônico. Além do Brasil, Bolívia e Colômbia são os países que mais imitaram essas tendências nos últimos anos, com um desmatamento total de 425.051, 31.878 e 20.515 km2, respectivamente. Os demais países não apresentam tendências claras de crescimento ou diminuição.
A Amazônia possui instrumentos nacionais e locais de gestão sustentável de seus ecossistemas. Esses instrumentos variam de país para país em termos jurídicos e grau de reconhecimento pelos Estados. A Raisg os classifica para suas análises em Áreas Naturais Protegidas (ANP – voltadas principalmente para a preservação de ecossistemas) e em Territórios Indígenas (TI – voltados para a preservação das culturas indígenas amazônicas). A eficácia desses territórios como barreiras ao avanço do desmatamento pode ser avaliada com base nas conclusões da Raisg.
Em nível regional, a maior parte do desmatamento (87,5%) detectado entre 2000 e 2018 ocorreu fora dos territórios indígenas e áreas naturais protegidas. Essa tendência se mantém para todos os países. Esses dados evidenciam que os instrumentos de gestão territorial para fins conservação e o manejo indígena das florestas constituem mecanismos eficazes para a preservação da Amazônia.
No entanto, existem diferenças nesta eficácia entre os países, evidenciando a necessidade de políticas transfronteiriças para a gestão da Amazônia na escala regional. Brasil, Bolívia, Colômbia e Venezuela devem dedicar especial atenção às ANP e TI amazônicos, pois eles apresentam maior vulnerabilidade a partir de 2015, à medida que o desmatamento, a mineração ilegal e os incêndios se tornam mais comuns dentro de seus territórios.
A mineração é uma pressão constante na Amazônia há várias décadas e é uma das causas do desmatamento, da poluição e dos conflitos sociais que mais preocupa. Amazônia Sob Pressão também apresenta dados atualizados até 2020 sobre a mineração na Amazônia, que mostra uma tendência de aumento da atividade, especialmente do garimpo ilegal.
Foram identificadas 4.472 localidades desta atividade ilícita. A maior parte (83%) impacta vários hectares ou os rios amazônicos diretamente. Mais da metade desses pontos estão no Brasil (53,8%), mas deve-se notar que 32% deles estão na Venezuela, país que contém apenas 5,6% de todo o território da Amazônia. A Venezuela também é o país com a maior proporção de TI e ANP afetada pelo garimpo ilegal. Em toda a Amazônia, são 664 TI e 129 ANP com presença de atividades ilícitas de mineração.
Embora um incêndio não implique necessariamente em desmatamento, o aumento da incidência anual de incêndios e queimadas aumenta a pressão nesse sentido. O Atlas relata esse processo que revela a vulnerabilidade da região, considerando que 13% da superfície da Amazônia queimou, pelo menos uma vez, desde 2001; ou seja, 1,1 milhão de km2 foram afetados. Essa área é comparável, em extensão, ao território de toda a Bolívia, país que coincidentemente é o mais atingido pelo fenômeno, com até 27% de seu território amazônico afetado. Em média, a cada ano desde 2001, 169.000 km2 da Amazônia foram queimados, 26.000 deles dentro de ANP e 35.000 dentro de TI.
As análises da Raisg fazem parte de um trabalho contínuo de avaliação das pressões e ameaças à Amazônia. Assim, constituem uma das séries de dados mais precisas publicadas até o momento sobre a perda de cobertura vegetal no conjunto mais extenso e biodiverso de ecossistemas terrestres tropicais do planeta.
Os estudos são realizados, sob metodologias padronizadas, por profissionais dos países amazônicos capazes de adequar os procedimentos considerando as realidades locais. As avaliações sistemáticas, que incorporam a experiência local, são fundamentais para a compreensão do estado do patrimônio ecossistêmico da região amazônica, bem como para a formulação de políticas públicas de conservação baseadas em evidências. A conservação da Amazônia implica na preservação dos benefícios ambientais que proporciona a todo o continente, favorecendo o bem-estar e o desenvolvimento sustentável de seus 35 milhões de habitantes.
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Amazônia se deteriorou em oito anos, mostra análise inédita feita em nove países - Instituto Humanitas Unisinos - IHU