“Fratelli Tutti”. Papa rejeita “dogma de fé neoliberal” no mercado

Papa Francisco celebra a missa e assina a encíclica "Fratelli tutti" em Assis. | Foto: Vatican Media

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05 Outubro 2020

Nova encíclica defende reforma da "arquitetura econômica e financeira internacional".

A reportagem é de Octávio Carmo, publicada por Agência Ecclesia, 04-10-2020.

O Papa Francisco defende na sua nova encíclica ‘Fratelli Tutti’, publicada hoje, que é preciso superar o “dogma de fé neoliberal” no mercado, pedindo mudanças de paradigma, no pós-pandemia.

“O mercado, por si só, não resolve tudo, embora às vezes nos queiram fazer crer neste dogma de fé neoliberal. Trata-se de um pensamento pobre, repetitivo, que propõe sempre as mesmas receitas perante qualquer desafio que surja”, escreve, num texto divulgado pelo Vaticano.

A encíclica, primeiro documento do gênero em cinco anos, realça que a “fragilidade dos sistemas mundiais perante a pandemia evidenciou que nem tudo se resolve com a liberdade de mercado”.

Num texto que tem como temática central a fraternidade e amizade social, o Papa condena a “especulação financeira”, marcada por uma “ganância do lucro fácil”.

Segundo Francisco, é necessária uma reforma da Organização das Nações Unidas e da “arquitetura econômica e financeira internacional”.

“O direito de alguns à liberdade de empresa ou de mercado não pode estar acima dos direitos dos povos e da dignidade dos pobres nem acima do respeito pelo ambiente”, escreve.

O texto define a solidariedade como “pensar e agir em termos de comunidade, de prioridade da vida de todos sobre a apropriação dos bens por parte de alguns”.

Este documento, dirigido a católicos e não-católicos, convida a “lutar contra as causas estruturais da pobreza, a desigualdade, a falta de trabalho, a terra e a casa, a negação dos direitos sociais e laborais”.

O Papa lamenta a instrumentalização dos conflitos pela “economia global, para impor um modelo cultural único”.

Francisco espera que a atual pandemia tenha um desfecho diferente da crise financeira dos anos 2007 e 2008, na qual considera ter-se perdido a oportunidade de promover uma “nova regulamentação da atividade financeira especulativa e da riqueza virtual”.

A ‘Fratelli Tutti’ procura contrariar o discurso da meritocracia e sustenta que ninguém pode ser excluído pelo seu local de nascimento ou condição social.

O Papa realça que as pessoas oriundas de famílias com boas condições econômicas “seguramente não precisarão dum Estado ativo e apenas pedirão liberdade”.

“Obviamente, não se aplica a mesma regra a uma pessoa com deficiência, a alguém que nasceu num lar extremamente pobre, a alguém que cresceu com uma educação de baixa qualidade e com reduzidas possibilidades para cuidar adequadamente das suas doenças”, prossegue.

Propondo um novo modelo de convivência para a humanidade, Francisco espera por uma “transformação da história que beneficie os últimos”, considerando que “a grande questão é o trabalho”, pelo que condena a “obsessão por reduzir os custos laborais”.

A encíclica é o grau máximo das cartas que um Papa escreve e a expressão "Fratelli Tutti" (todos irmãos) remete para os escritos de São Francisco de Assis, o religioso que inspirou o pontífice argentino na escolha do seu nome.

Francisco retoma as suas críticas à cultura do descarte, realçando que “partes da humanidade parecem sacrificáveis”

O Papa reconhece um aumento da riqueza, mas “sem equidade”, o que levou a “novas pobrezas”.

“Crises fazem morrer à fome milhões de crianças, já reduzidas a esqueletos humanos por causa da pobreza e da fome. Reina um inaceitável silêncio internacional”, denuncia o Papa na ‘Fratelli Tutti’.

As duas anteriores encíclicas do atual pontificado foram a ‘Lumen Fidei’ (A luz da Fé), de 2013, que recolhe reflexões de Bento XVI, Papa emérito; e a ‘Laudato Si’, de 2015, sobre a ecologia integral.

O antecessor de Francisco publicou três encíclicas, no seu pontificado (2005-2013); antes de Bento XVI, João Paulo II assinou 14 encíclicas, entre 1979 e 2003.

 

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