"Bonhoeffer nos ensinou, entre outras coisas, que se opor à guerra não significa desistir da luta e que não pode haver paz verdadeira sem justiça plena”. A palavra de paz é, não por acaso, o título escolhido para o encontro. Mais uma vez, a ressonância bíblica é inegável", escreve Alessandro Zaccuri, em artigo publicado por Avvenire, 10-09-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Nem sempre nascemos estúpidos. Na maioria das vezes nos tornamos: por conveniência, por comodidade, por capitulação a um poder pelo qual acabamos por ser possuídos e como que ocupados internamente. Quem dizia isso, nas trevas do totalitarismo, era Dietrich Bonhoeffer, o grande teólogo luterano cuja figura foi lembrada ontem no Festivaletteratura do Claustro do Museu Diocesano, num diálogo entre a pastora batista Lidia Maggi e Dom Roberto Fiorini, autor pela editora Gabrielli de um perfil detalhado do autor (Dietrich Bonhoeffer. Testimone contro il nazismo, 168 p. 15,00 euros). “Do ponto de vista bíblico - ressaltou Maggi - 'testemunho' é uma palavra que indica algo diferente e muito mais exigente do que o simples fato de assistir a um determinado acontecimento.
O testemunho, como Bonhoeffer nos mostrou, comporta uma responsabilidade radical, que nos leva a assumir a realidade em toda a sua complexidade e com todas as suas contradições”. Essa é a origem da “teologia da Cruz”, na qual culmina o pensamento e a própria vida de Bonhoeffer, sinteticamente repercorrida por Fiorini através de uma série de etapas que, desde o nascimento em 1906, numa família abastada da culta burguesia alemã chega ao seu enforcamento em 9 de abril de 1945, poucos dias antes do fim da guerra, no campo de concentração de Flössenburg, onde Bonhoeffer estava preso por ter participado do fracassado atentado contra o Führer. “Conheci os seus escritos no início dos anos 1970 - relata Fiorini, aludindo também à sua experiência como padre operário.
Campo de concentração de Flössenburg (Foto: Wikimedia Commons)
Foi um período fortemente marcado pelos conflitos, tanto no âmbito social como eclesial. As primeiras traduções para o italiano dos textos de Bonhoeffer, editadas pelo padre Italo Mancini, me impressionaram muito, induzindo-me a estudar, a me aprofundar. Bonhoeffer nos ensinou, entre outras coisas, que se opor à guerra não significa desistir da luta e que não pode haver paz verdadeira sem justiça plena”. A palavra de paz é, não por acaso, o título escolhido para o encontro. Mais uma vez, a ressonância bíblica é inegável. “Na Escritura - insiste Maggi - a paz é tudo menos a ausência de guerra. A imagem que melhor representa o ideal de shalom é a barriga de uma mulher grávida, em um presente grávido de futuro”.
Prisioneiros do campo de concentração de Flössenburg, em 1942 (Foto: www.gedenkstaette-flossenbuerg.de)
A analogia entre o martírio de Bonhoeffer e as tribulações de nossos anos fica subentendida. Fiorini, por exemplo, insiste no perigo de que a mitologia do homem forte volte a crescer entre os jovens, enquanto Maggi reitera a necessidade de cultivar uma atitude de complexidade contra qualquer tentativa de simplificação. “Para aquele que crê - diz - não há palavras de ordem às quais se adequar”. Afinal, Bonhoeffer também pensava assim quando contestava o apoio das confissões cristãs ao nazismo, alertando que nas igrejas não pode haver "altares laterais para a adoração dos homens".