26 Junho 2020
Abandonada a ideia fantasiosa de que o país teria atingido “platô” de casos. Mas a descoordenação persiste: não há política nacional alguma. E mais: Começa a se desenhar uma trágica Geopolitica da Covid-19. Adivinhe quem perde.
A reportagem é de Maíra Mathias e Raquel Torres, publicada por Outras Palavras, 25-06-2020.
Há exatamente uma semana, o Ministério da Saúde dizia que o Brasil parecia caminhar para um “platô” na curva de contágios. Os números que mostravam uma estabilização eram desmascarados quando os dados eram observados localmente: em alguns estados e municípios, crescimento descontrolado; em outros, queda efetiva. Além disso, o platô era um verdadeiro planalto, com o número de casos diários sempre ficando acima de 20 mil, e o de mortes, em torno de mil.
Com esse cenário e flexibilizações de isolamento por toda parte, o resultado obviamente não poderia ser bom. Ontem falamos sobre a nova alta no país, com 40 mil casos registrados de segunda para terça-feira. Não tínhamos a posição do Ministério, que, mesmo diante de dados tão preocupantes, não havia se manifestado. Nesta quarta, os péssimos números se repetiram: 40.995 novos casos e 1.103 novas mortes. E, finalmente, a pasta fez uma coletiva de imprensa no fim da tarde.
“A gente tinha falado que parecia que a curva tenderia a certa estabilização, ou diminuição do número de casos. A gente vê que nesta semana tivemos aumento significativo de casos novos”, reconheceu o secretário de Vigilância em Saúde, Arnaldo Correia. Ele se refere não a esses últimos dias, mas a uma alta verificada a partir da semana epidemiológica 25, que terminou no dia 20 de junho. Em relação à semana anterior, houve um aumento de 22% nos casos e 7% nas mortes. “[Isso] nos mostra atenção que precisamos ter a essa doença a cada semana que passa”, completou, constatando o óbvio.
E o que levou ao aumento? O Ministério reconhece que o vírus está subindo onde antes não havia se espalhado com força. Sabemos que as reaberturas estão acontecendo de forma desordenada em todo o país, mesmo que municípios e estados estejam em momentos epidemiológicos distintos. Vimos cidades tentando fechar de novo seus comércios após flexibilizações fora de hora. Em Minas Gerais, a taxa total de ocupação das UTIs passou de 69% para 90,6% em um mês, após a reabertura em vários municípios, e hoje são nove os estados que têm mais de 80% de suas UTIs para covid-19 ocupadas.
Mas, para os representantes da pasta, as flexibilizações do isolamento não parecem fazer parte do problema. Eles preferem falar sobre a “mudança de estação”: “O inverno começou agora na região Sul, Sudeste e Centro-Oeste, e coincidiu com o aumento no número de casos notificados e confirmados de covid-19 nessa região”, disse Eduardo Macário, diretor do Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis, recomendando que “a população busque se proteger o máximo possível”. O mistério é como a população vai fazer para se proteger por conta própria – já que mesmo quem estava em casa começa a precisar trabalhar de novo, o auxílio emergencial vai sendo ameaçado e o país não tem orientações claras das autoridades para lidar com a pandemia.
Na coletiva de imprensa da Organização Mundial da Saúde (OMS) de ontem, o diretor de emergências da entidade, Michael Ryan, foi questionado sobre a situação brasileira. Disse que é difícil prever qualquer coisa, porque os rumos da pandemia dependem das respostas locais: “O que você faz afeta o pico. Afeta a altura do pico, afeta o comprimento do pico e afeta a trajetória para baixo. Isso tem tudo a ver com a intervenção do governo para responder, com a cooperação da comunidade com essa intervenção e com a capacidade de atuação dos sistemas de saúde e de saúde pública. O vírus não age sozinho. O vírus explora uma vigilância fraca. O vírus explora sistemas de saúde fracos. O vírus explora uma má governança. O vírus explora a falta de educação e a falta de empoderamento das comunidades”. No Brasil de hoje, ele encontra pouco ou nenhum limite para avançar.
A propósito, o Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou a emissão de um alerta ao governo sobre a falta de estratégia para combater a covid-19. O relatório do ministro Vital do Rêgo aponta que não há gerenciamento de risco nem profissionais de saúde suficientes para mitigar a transmissão. E menciona a ausência de um ministro efetivo da Saúde, a ocupação de cargos na pasta por pessoas sem formação na área e a falta de transparência nas informações do governo.
O Ministério da Saúde oficializou ontem a reciclagem do programa ‘Diagnosticar para Cuidar’, apresentado originalmente pelo ex-ministro Nelson Teich em maio (e nunca colocado em prática). É o novo esquema de testagens que mencionamos aqui. No lançamento, a pasta anunciou que vai comprar um novo tipo de exame de anticorpos, mais preciso, e que de fato vai adotar o uso de critério clínico (sem testes) para diagnosticar a covid-19. Esse critério engloba uma análise dos sintomas e outros exames, como tomografias. Quando um médico diagnosticar a doença dessa maneira, o paciente vai entrar nas estatísticas oficiais. Isso deve gerar um aumento grande no número de casos, mas não necessariamente nas mortes… Porque elas vão continuar sendo consideradas como decorrentes da covid-19 apenas quando os pacientes tiverem sido testados. Nosso palpite é que, em breve, o país pode ter um imenso número de casos, mas com uma baixa taxa de letalidade (a razão entre o número de vítimas fatais e de infectados).
E o ministro interino da Saúde Eduardo Pazuello decidiu, enfim, nomear o empresário Airton Soligo como assessor especial em seu gabinete. Soligo, conhecido como Cascavel, atuava há semanas no Ministério, reunindo-se com governadores e secretários estaduais e viajando com Pazuello, mesmo sem ter vínculo nenhum com a pasta.
“Até 1 milhão de empregos”. “Investimentos de até R$ 700 bilhões”. “Corrigir uma situação do século 19”. Essas frases otimistas foram escritas ou enunciadas por veículos da mídia brasileira ontem, e dizem respeito à aprovação do novo marco legal do saneamento básico. A votação foi concluída de noite pelo Senado, com um placar de 65 votos favoráveis e 13 contrários. O projeto de lei segue diretamente para sanção presidencial – o que deve acontecer bem rápido, já que Jair Bolsonaro disse que essa é a questão “mais importante no momento”.
Essa história é longa e cheia de lapsos de memória convenientes. A agenda começou a ser tocada como prioridade do governo federal assim que Michel Temer assumiu a Presidência. Isso aconteceu de duas formas. A partir de uma medida provisória editada assim que se sentou na cadeira, Temer instituiu o Programa de Parcerias em Investimento (PPI), que tinha como objetivo no saneamento que o BNDES operacionalizasse a privatização das companhias estaduais. Em paralelo, a Casa Civil começou a articular, em afinada sintonia com entidades que representam o setor privado, a criação de um “mercado de saneamento” – expressão presente em uma apresentação feita no longínquo setembro de 2016. Na época, o governo criticava a lei do saneamento, aprovada em 2007, por “favorecer a assunção dos contratos por empresas públicas” e “dificultar a entrada de empresas privadas”.
O governo Temer estudou mexer no marco legal de várias formas, sempre tendo como interlocutores apenas entidades que concordavam com e advogavam pela privatização do saneamento, como o Instituto Trata Brasil, think tank que tem entre seus apoiadores empresas como Aegea, Braskem, Tigre, Amanco, Coca-Cola. Foi uma denúncia de corrupção que deu um breque nessa movimentação: tudo mudou quando a conversa entre Temer e Joesley Batista veio a público e o governo precisou usar todo o seu poder de fogo para evitar um impeachment. Mas foi ele quem introduziu o assunto no Congresso Nacional, via medida provisória (844) enviada em 9 de julho, que caducou em novembro. No apagar das luzes da gestão, Temer ainda fez uma última tentativa, em 28 de dezembro de 2018, com a MP 868.
O assunto ganhou um novo fôlego quando o relator da 868, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) resolveu botar a mão na massa 48 horas depois desta MP também caducar. Ele basicamente transpôs seu conteúdo para o projeto de lei 3.261. Sempre com muitas dificuldades, o tema não prosperava. Com o assunto em alta novamente, o governo federal entrou em campo e apresentou outro PL, o 4.162 – que foi aprovado com festa ontem.
Os defensores do novo marco dizem, basicamente, que o Brasil não tem recursos para investir em saneamento e que esse dinheiro precisa vir da iniciativa privada. Na época do PPI, o BNDES topava emprestar recursos para empresas privadas, mas colocava um milhão de obstáculos no empréstimo às estatais. Sempre fica a dúvida sobre quem, de fato, catapulta os investimentos em infraestrutura.
Os críticos do novo marco, por seu turno, apontam que basicamente a concessão à iniciativa privada dos serviços de abastecimento de água e tratamento de esgoto nunca foi proibido. Existem, aliás, em vários municípios. O que a nova regra faz é dificultar que municípios e estados assinem contratos entre si, como sempre aconteceu sem a necessidade de abertura de licitação. Eles também apontam que a iniciativa privada quer o “filé” – cidades populosas, ricas – não se interessando pela maior parte das cidades do país, que definitivamente não têm essas características. Há um exemplo bastante importante – e sempre esquecido nas análises de grande parte da mídia – no Tocantins.
O Joio e O Trigo foi um dos poucos veículos a contar essa história: “As ações da Saneatins foram vendidas em 1998, por R$ 2 milhões, para a Empresa Sul-Americana de Montagens. Em 2010, sem ter interesse em 78 dos 139 municípios, a concessionária devolveu-os ao governo do estado, que criou a Aquatins, responsável também por cuidar das áreas rurais, exatamente onde é mais dispendioso realizar obras. Ou seja, o poder público ficou com aquelas municípios deficitários. Naquele ano, apenas 12 cidades contavam com serviços de coleta de esgoto”.
Ontem, o líder do PDT no Senado Weverton (MA), voltou a expressar essa preocupação: “Sabemos que, infelizmente quanto às cidades pequenas, principalmente do Norte e do Nordeste, esses investimentos não vão chegar, como foi aqui falado. É um projeto que vai beneficiar os grandes centros, claro, onde as grandes empresas têm interesse de investir, mas no entorno nós vamos continuar ainda à margem, ainda na dificuldade e, quem sabe, não sabemos ainda nem mensurar o prejuízo que vamos ter quanto à questão da tentativa de levar a política de saneamento de água para essas cidades menores e menos assistidas no país”.
Outra observação, esta feita pela bancada do PT no Senado, que votou fechada contra o projeto, é sobre o ‘timing’. Por que votar um assunto tão controverso agora, em plena pandemia? Há argumentos contrários: uma doença que exige lavagem de mãos sistemática desvela a realidade brutal de que 35 milhões de pessoas não têm água tratada no país, e mais de cem milhões não são atendidos por coleta de esgoto.
O onipresente Tasso Jereissati – que é dono de uma empresa chamada Solar, que detém todo o engarrafamento e distribuição dos produtos da Coca-Cola no Nordeste e parte do Centro-Oeste –, relator do PL aprovado, tem dito que o poder público poderá fazer um “amarrado” e negociar a concessão de um ‘filé’ junto com outras cidades deficitárias. É muito confuso isso, já que a titularidade do serviço de saneamento é, constitucionalmente, dos municípios. A novela, apesar de ter sido cheia de reviravoltas, parece estar só começando.
Na segunda-feira, falamos aqui sobre o problema de abastecimento no Peru, onde cilindros de oxigênio estão em falta nos serviços de saúde, o que tem estimulado a formação de um mercado paralelo com preços nas alturas para famílias desesperadas que chegam a desembolsar o equivalente a R$ 7 mil por garrafa do insumo. Pois ontem, a Organização Mundial da Saúde (OMS) informou que a situação é generalizada. Principalmente por conta da aceleração da pandemia, que está num ritmo de um milhão de novos casos por semana – o que significa um uso de 88 cilindros grandes por dia. “Atualmente, a demanda está superando a oferta“, concluiu o diretor-geral do organismo, Tedros Adhanom Ghebreyesus.
O alerta foi acompanhado de um anúncio: a OMS comprou 14 mil tanques e planeja enviá-los para 120 países nas próximas semanas. Há no horizonte a possibilidade de uma compra centralizada de nada menos do que 170 mil insumos desses nos próximos seis meses, a um valor total de US$ 100 milhões. Tudo vai depender da evolução da pandemia. Amanhã, devemos chegar aos dez milhões de casos.
Receber oxigênio por cateter nasal ou, nos casos mais graves, via ventilador pulmonar é um tratamento crucial para a covid-19, já que a doença derruba os níveis deste gás no sangue. E, é claro, também aqui há uma diferença entre países ricos e o resto. Na Europa e na América do Norte, é comum ter oxigênio canalizado nos hospitais.
“Os hospitais de muitos países com poucos recursos não têm capacidade para produzir oxigênio – e tanques pesados de gás são frequentemente transportados de fábricas a quilômetros de distância ou importados de outros países. Muitos tanques das próprias fábricas de oxigênio dos países de baixa renda também podem conter ferrugem ou produtos químicos que podem danificar os pulmões dos pacientes com coronavírus, pois essas fábricas produzem principalmente o gás para uso na construção ou mineração”, resumiu Paul Molinaro, chefe de logística e suporte operacional da OMS.
Aqui no Brasil, estamos acompanhando outro tipo de escassez: a dos medicamentos necessários para intubar pacientes graves. A primeira notícia nesse sentido veio à tona no dia 8 de junho, quando o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) divulgou que 24 estados relatavam dificuldades na compra do bloqueador muscular necessário para realizar o procedimento. E mais da metade das secretarias já estava em apuros para adquirir outros remédios. O problema afetava também o setor privado, principalmente hospitais localizados no Norte e no Nordeste do país.
Semana passada, o ministro interino Eduardo Pazuello prometeu entrar em campo, fazendo compras centralizadas pelo Ministério e também via Organização Pan-Americana da Saúde (Opas).
Ontem, o Conass expôs o problema em uma audiência promovida pela Câmara dos Deputados. E o quadro piorou: 21 estados e o Distrito Federal relatam terem zerado estoques de ao menos um sedativo necessário à intubação. A lista de medicamentos da pesquisa do Conass inclui 22 produtos. O estado na pior situação é Mato Grosso, sem 13 medicamentos; seguido por Maranhão e Ceará (12).
Mas os sedativos que ainda em estoque também estão acabando. No Amapá, 11 produtos acabaram, outros 11 têm abastecimento garantido para… dez dias. O Conass cobrou mais agilidade do Ministério da Saúde, e também da Anvisa, na compra e distribuição dos medicamentos. Isso porque a pasta diz estar aguardando um parecer da agência reguladora para prosseguir com a compra via Opas. Já a compra interna deve sair em, no máximo, três semanas, de acordo com Alessandro Glauco, do Ministério. É muito tempo, se pensarmos na situação do Amapá.
A Pnad Covid-19 (edição extraordinária da Pesquisa Nacional por Amostra em Domicílios, do IBGE), confirmou que os mais afetados pelo novo coronavírus são os pretos, pardos, pobres e sem estudo. O levantamento tem algumas limitações – como ter sido feito por telefone e não ter se baseado em diagnósticos, e sim em relatos de sintomas –, mas os achados indicam uma tendência bem demarcada. No geral, 4,2 milhões de pessoas disseram ter apresentado sintomas de covid-19 em maio (3,8 milhões informaram perda de cheiro ou de sabor; um milhão falaram de tosse, febre e dificuldade para respirar; e 991 mil relataram tosse, febre e dor no peito). Entre todos os que relataram sintomas, 70% são pretos ou pardos; e quase metade têm ensino fundamental incompleto ou ensino médio incompleto.
A mesma pesquisa analisou o peso do coronavírus no mercado de trabalho. Durante a pandemia, 19 milhões de pessoas foram afastadas do serviço, sendo que 9,7 milhões ficaram sem remuneração. Destes, a maior parte está nas regiões Norte e Nordeste. E também aí o levantamento traduz em números uma situação já esperada. Entre os trabalhadores brancos, 16,1% foram afastados do trabalho; entre negros, 20,8%. Só 9% nos pretos e pardos puderam fazer home office, contra 17,6% dos brancos. A maior taxa de afastamento se deu entre trabalhadores informais: domésticos sem carteira assinada (33,6%), empregados do setor público sem carteira (29,8%) e empregados do setor privado sem carteira (22,9%).
Jair Bolsonaro e Paulo Guedes, como sabemos, querem acabar logo com o auxílio emergencial. Têm sido pressionados por setores do próprio governo e por aliados do Congresso para manter o benefício. Por isso, segundo a Folha, a equipe econômica está acelerando a elaboração do “Renda Brasil”, que pode ser apresentado já em agosto ou setembro.
Em tempo: a Agência Pública vai começar a pesquisar que fatores influenciam nas mortes por covid-19 no Brasil. Os dados oficiais não são a melhor fonte para isso, já que vários estados não dão informações como raça e profissão das vítimas. Por enquanto, o projeto “Histórias que Contam” tem um questionário a ser preenchido por familiares de mortos pela doença; a partir das respostas, a investigação vai começar.
Aldeias indígenas têm implementado cordões de isolamento e vigilância por conta própria, mas, às vezes, isso não é suficiente. Muitas estão próximas a grandes plantações ou frigoríficos, e frequentemente indígenas trabalham nessas atividades. “Alguns saem para trabalhar… Se estiver contaminado, volta e acaba contagiando seis ou doze pessoas que estão dentro de casa”, diz Erileide Domingues, que atua em uma barreira na Reserva Indígena de Dourados, na matéria da Repórter Brasil. Lá, a primeira morte de um indígena por covid-19 foi registrada na semana passada. E a doença entrou justamente com uma funcionária indígena de um frigorífico da JBS.
Segundo Ernesto Galindo, pesquisador do Ipea, os frigoríficos se tornaram os principais vetores de disseminação da doença no Mato Grosso do Sul e no oeste do Paraná, por conta do deslocamento dos trabalhadores entre diferentes municípios e aldeias. “Os epidemiologistas se preocupam com o contágio no contato de pessoa a pessoa; a gente, com o contágio de uma aldeia para outra”, diz ele. Seus estudos apontam que o número de casos de covid-19 é muito maior nos locais mais próximos dos abatedouros. O afastamento preventivo dos trabalhadores indígenas – com seus salários assegurados – teria evitado esse problema, mas isso não aconteceu. Procuradores do Ministério Público Federal e do Ministério Público do Trabalho pressionaram e pediram esse afastamento em alguns casos. Com isso, grandes grupos, como JBS e Raizen, chegaram a afastar trabalhadores, mas só depois da confirmação dos primeiros casos. Foi muito tarde.
Uma matéria do Cimi (Conselho Indigenista Missionário) ilustra bem essa dinâmica. Nos Avá-Guarani da Terra Indígena Oco’y, em São Miguel do Iguaçu (PR), os casos estouraram na semana passada. Apenas entre os indígenas que trabalham o Frigorífico Lar Cooperativa Agroindustrial, a 50 quilômetros da aldeia, houve 35 infecções confirmadas.
Na primeira quinzena de junho, 10% das reclamações feitas por usuários de planos de saúde à ANS têm raiz na dificuldade em obter a autorização para tratamentos e exames relativos à covid-19. É o recorde desde que a pandemia chegou ao Brasil, segundo boletim da Agência Nacional de Saúde Suplementar, publicado quinzenalmente. No acumulado, já foram recebidas 4.701 reclamações de consumidores. A maioria (43%) diz respeito à assistência a outros problemas de saúde, comprometida pela pandemia. Na sequência, com 36%, vêm os problemas relacionados diretamente ao novo coronavírus.
A notícia de que a dexametasona reduziu a taxa de mortalidade de pacientes graves hospitalizados foi uma das melhores que já recebemos nesta pandemia do novo coronavírus. Mas há um alerta a ser reforçado: não só o corticoide não ajuda nos quadros leves da doença, como pode ser arriscado tomá-lo nesses casos.
Na semana passada, falamos tudo sobre o que se sabia sobre o corticoide até então – e destacamos que a dexametasona não ataca o coronavírus, mas atua suprimindo o sistema imunológico, o que pode dificultar que o corpo combata a infecção, dependendo do estágio de desenvolvimento da doença.
Ontem, uma reportagem do New York Times, foi nessa direção. “Na fase inicial da doença, o sistema imunológico é nosso amigo”, disse Martin Landray, principal autor do estudo feito pela Universidade de Oxford sobre a dexametasona (que, aliás, continua sem revisão de pares e publicação na íntegra). Ele explica de maneira bem didática por que amortecer o sistema imunológico nesse estágio não é uma boa ideia: “É quase como uma doença com duas fases. Uma fase em que o vírus domina e a fase imunológica, em que o dano causado pelo sistema imunológico é dominante”. Aí, sim, convém usar o corticoide que tem efeito anti-inflamatório e imunossupressor.
Aliás: Martin Landray contou à Wired como os resultados dessa pesquisa surpreenderam até mesmo os cientistas que a conduziram. E justifica o anúncio por meio de release à imprensa por conta dos resultados. O site conta em detalhes como funciona esse esforço de pesquisa chamado “Recovery”, que envolve uma dúzia de medicamentos.
Quem viveu a epidemia de H1N1 no Brasil com certeza vai lembrar das notícias de mortes de gestantes. A gravidez transforma o corpo de várias maneiras, e uma delas é colocar em marcha um mecanismo de supressão do sistema imunológico para que a mulher possa acomodar o feto. Com o novo coronavírus, ainda não se tinham muitos dados preocupantes. Mas ontem, o Centro de Controle de Doenças dos EUA apresentou um estudo que pode reforçar essa preocupação.
É importante dizer que há certas inconsistências. Por exemplo, o levantamento concluiu que 31% das mulheres grávidas foram hospitalizadas, em comparação com cerca de 6% das mulheres que não estavam grávidas – mas não detalhou se essas hospitalizações de gestantes tinham a ver com o trabalho de parto e parto. Há outros achados. De acordo com o CDC, as mulheres grávidas eram mais propensas a serem admitidas em UTI (1,5%) do que as não grávidas (0,9%) e precisar de ventilação mecânica (0,5% versus 0,3%). Os números, contudo, não são muito discrepantes. O CDC analisou informações de 8.207 mulheres grávidas entre 15 e 44 anos, que foram comparadas com 83.205 mulheres na mesma faixa etária que não estavam grávidas entre de 22 de janeiro a 7 de junho. É a maior análise do tipo até o momento no mundo.
E porque não bastava o coronavírus, uma nova linhagem de zika está em circulação no Sul e no Sudeste do Brasil, segundo uma pesquisa da Fiocruz Bahia. O trabalho detectou sequências genéticas de um tipo africano do vírus que ainda não tinha circulado no país e, por ser novo aqui, os pesquisadores acreditam que há potencial para gerar uma epidemia.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
O ministério da Saúde adverte: “estamos perdidos” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU