18 Junho 2020
"Seja Pedro ou Paulo, a vida deles repleta de provações (e aqueles que vêm de dentro são mais difíceis de suportar do que aqueles que vêm de fora) termina na solidão e na escuridão. E, apesar disso, quanta luz chegou à Igreja a partir de seus destinos cheios de obstáculos", escreve Ghislain Lafont, em artigo publicado por Munera, 11-06-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Somos muitos, e não apenas na Itália, que ficamos profundamente tocados pelo conflito que ocorreu recentemente em Bose, porque muitos de nós frequentamos esse lugar profético ou lemos os textos luminosos de Enzo Bianchi, a ponto que a prova pela qual eles estão passando também é nossa.
Seria tentador tomar partido, arriscando alimentar a ferida com comentários fora do lugar, com intervenções nas redes sociais ou de outras maneiras. Eu acredito que a atitude certa nos seja sugerida exatamente pelo que nos chega de Bose: a escuta da Palavra de Deus. Ora, o Novo Testamento não esconde conflitos graves e, portanto, dolorosos para as pessoas que passaram a vida nas primeiras comunidades. Entre Jerusalém e Antioquia, nada foi fácil: um primeiro conflito, sobre a questão da circuncisão, foi resolvido no chamado Concílio de Jerusalém (Atos 15), mas retomou algum tempo depois, em Antioquia, sobre a admissão dos pagãos convertidos à mesa da comunidade judaico-cristã.
Naquele caso, Pedro assumiu uma posição restritiva contra a qual Paulo se opunha violentamente e, ao que parece, sem sucesso. Barnabé, sempre tão próximo de Paulo, naquele caso tendia a pensar nela como Pedro (Gálatas 1,15, 36). Logo depois, Paulo e Barnabé quiseram partir juntos em missão, mas não conseguiram concordar sobre a participação na viagem de João, chamado Marcos: "Tiveram um desentendimento tão sério que se separaram" (Atos 15:36)... por trás dessas notícias relatadas, quantas discussões, quantas palavras fortes, quantos esforços vãos para chegar a um acordo - e tudo isso não entre terríveis pecadores, mas entre os primeiros apóstolos, alguns dos quais conheceram pessoalmente Cristo, ele que em sua glória havia aparecido para os outros!
Quanto ao destino final de Pedro e Paulo, não há nada de glorioso nele. Pedro desaparece dos Atos após sua libertação da prisão. Contam-nos que ele "partiu para outro lugar" (Atos 12,17), mas os exegetas acham difícil dizer qual: a tradição nos diz que ele morreu mártir em Roma. Paulo, por sua vez, planejava levar o Evangelho para a Espanha e ficar um tempo em Roma durante a viagem (Rm 15,28). Pois então, em sua última passagem para Jerusalém, ele foi preso e detido em Cesareia por dois anos. Ele realmente foi para Roma, mas como prisioneiro. Não parece que ali tenha tido muito sucesso; de qualquer forma, pois foi trancado em uma sala e só podia falar aos que o procuravam (Atos 28.30). Essa situação durou dois anos, mas nada é dito sobre seu fim. Portanto, seja Pedro ou Paulo, a vida deles repleta de provações (e aqueles que vêm de dentro são mais difíceis de suportar do que aqueles que vêm de fora) termina na solidão e na escuridão. E, apesar disso, quanta luz chegou à Igreja a partir de seus destinos cheios de obstáculos.
Ao ler e meditar esses textos, somos levados a olhar com grande respeito e doído silêncio o conflito de que fomos informados. É parte integrante da aventura de Bose e o Espírito Santo está lá, como no tempo dos Atos, para ajudar uns e outros, enquanto nós, de longe e com discrição, estamos aqui para orar com eles e por eles, para que, com o tempo, se realize o que as Escrituras dizem: "Sabemos que Deus age em todas as coisas para o bem daqueles que o amam".
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Um conflito entre santos. Artigo de Ghislain Lafont - Instituto Humanitas Unisinos - IHU