19 Outubro 2018
"Você concorda que todo(a)s que discordam do seu candidato sejam tachado(a)s de comunistas, e assim incluído(a)s no rol de 30 mil que o candidato já disse que será preciso matar?", escreve Adriano Pilatti, professor de Direito Constitucional da PUC-Rio, em artigo publicado em sua página no Facebook.
Gostaria que este texto fosse lido por quem vai votar ou já votou no candidato que ganhou o primeiro turno presidencial (o que é um direito sagrado e intocável). Mas que não votou nem vai votar por concordar com tudo que o candidato e seu vice dizem, nem por ser “fascista”, racista ou misógino. E sim por estar cansado do “sistema”, por não aceitar a roubalheira, por não suportar mais a insegurança, por ter ojeriza do partido do outro candidato, etc.
Escrevo com respeito e espero ser lido com a mesma boa fé que me move, e que me impõe o dever de esclarecer que não votei no segundo colocado, mas que pretendo votar agora. E não vou dizer o porquê, pois os motivos ficarão evidentes.
Não vou fazer discurso, nem tenho direito de fazer sermão. Gostaria só de pedir licença para propor, “de boas”, algumas perguntas, numa espécie de entrevista imaginária que você (permita-me esse tratamento informal e cordial) desse a você mesmo, respondendo ou passando a pergunta, livremente.
Estas perguntas se baseiam num entendimento que você poderá compartilhar comigo: um pretendente a líder (ainda mais se for pretendente a líder máximo do Estado que nos domina) deve ser avaliado não apenas por suas qualidades ou defeitos individuais, mas pelas qualidades e defeitos dos sentimentos, atitudes e ações que inspira, instiga e mobiliza.
Se você chegou até aqui e não quer mais ler, compreendo e respeito. Mas se topa continuar, vamos às perguntas. Elas se referem a fatos e declarações reais.
Você concorda com a afirmação de que qualquer mulher que vote no outro candidato deva ser estuprada?
Você considera certo que um mestre reverenciado de uma arte ancestral (ou qualquer outra pessoa) seja esfaqueado até a morte por dizer que votou no partido que você rejeita?
Você acha natural que uma médica rasgue uma receita que acabara de prescrever para uma senhora idosa e pobre quando esta lhe diz que votou no partido que você reprova?
Você acha normal que um garoto seja espancado por usar o boné de um movimento social?
Você acha válido que livros sobre direitos de todos os seres humanos sejam rasgados na biblioteca de uma universidade ou em qualquer outro lugar?
Você concorda que todo(a)s que discordam do seu candidato sejam tachado(a)s de comunistas, e assim incluído(a)s no rol de 30 mil que o candidato já disse que será preciso matar?
Você já pensou no quanto as pessoas que praticam esses crimes (essas ações e apologias são crimes) se sentirão à vontade para fazer isso quando seus inspiradores e instigadores estiverem no poder? Você é a favor da impunidade para esse tipo de crime?
Você quer ser confundido com pessoas que fazem ou dizem coisas desse tipo? Você se sente à vontade em sua companhia? Você se sentiria confortável colaborando, ainda que por omissão, com elas?
Você pensa que essas ações, atitudes e afirmações sejam aceitáveis para pessoas de bem?
Você tem certeza de que, nem hoje nem amanhã nem nunca, nenhum de seus entes queridos (filha ou filho, irmã ou irmão, amada ou amado, amiga ou amigo, prima ou primo, namorada ou namorado…) adotará ideias ou terá posições diferentes das suas? Se por acaso acontecer, você deseja que, só por isso, esse ente querido fique à mercê dessas maldades e dos líderes que as inspiram e instigam?
Você tem certeza de que você e os seus se sentirão mesmo mais seguros se todos os sem-noção que você conhece, conheceu ou conhecerá puderem puxar uma arma (inclusive para você ou para um ente querido seu) por qualquer desavença de trânsito, ou em estacionamento, cinema, supermercado, universidade, restaurante?
Haveria muitas perguntas mais desse tipo, você sabe. Se a sua convicção no seu voto é firme, ela certamente prevalecerá mesmo se você se fizer essas perguntas. E todas aquelas perguntas que você mesmo(a), a partir desses exemplos, saberá formular.
Por isso me permito, respeitosa e humildemente, sugerir que você se faça esses questionamentos em qualquer momento antes votar. Só isso, nada mais. Nem menos. E lhe desejo boa sorte. Hoje, no dia da votação, e no futuro que o seu voto ajudar a definir para você, seus entes queridos e todos nós. Máxima gratidão por ter lido.
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