Por: Wagner Fernandes de Azevedo | 23 Junho 2018
A Comissão Internacional de Direitos Humanos — CIDH, denuncia a Nicarágua por graves violações de direitos humanos. Durante os dias 17 e 21 de maio a Comissão esteve no país coletando informações e depoimentos acerca dos violentos conflitos perpetrados pelo governo de Daniel Ortega. Nesta sexta-feira, 22-6, o organismo apresentou em sessão extraordinária da Organização dos Estados Americanos — OEA o relatório final que apresenta que até o dia 19-6 foram 212 mortos, 1337 feridos e 507 presos. O relatório é composto por 1007 depoimentos, 135 petições e 188 solicitações de medidas cautelares.
O relatório apresentado pelo CIDH expõe ao menos seis pontos de violação de direitos humanos pelo estado nicaraguense: direito à vida e a integridade da pessoa humana; direito à saúde e ao atendimento médico; direito à liberdade e integridade pessoal no contexto de detenções; direito à liberdade de expressão; direito de livre circulação; e direito à verdade e justiça. Sob esses seis pontos a acusação da Comissão conclui que o governo tem recrudescido as ações violentas e intensificado a gravidade da crise no país.
Os protestos da população iniciaram ao final de março e início de abril pautando a revogação do projeto de reforma previdenciária apresentada por Daniel Ortega. O CIDH apresenta que a partir do dia 18 abril começaram os atos violentos contra as manifestações pacíficas. Nesta data grupos paramilitares atiraram contra estudantes e professores na Universidade Centro-Americana — UCA, na capital Manágua. A partir deste evento espalharam-se mobilizações por outras universidade e cidades do país, em especial León, Masaya, Granada, Matagalpa, Estelí, Carazo, Rivas, Bluefields, Ocotal e Camoapa, além de diversos pontos da capital.
Nos primeiros protestos foram contabilizadas pelo menos 35 mortes, entre os dias 19 a 22 de abril. Todos por uso de armas de fogo, inclusive por AK-47, pela polícia ou grupos paramilitares. O relatório apresenta padrões na forma da repressão, com tiros à queima roupa e na cabeça, elementos que concluem à participação de franco-atiradores. O emprego deliberado da força pelo Estado foi considerado abusivo por ser direcionado a manifestações pacíficas, sem justificação legal para tal atirar ou utilização de armamentos pesados.
O abuso de violência ocorreu também contra crianças e adolescentes, chegando pelo menos a 16 mortos, até o dia 21 de junho. Cinco desses apresentavam impactos de bala na cabeça e no tórax. Uma das vítimas foi Álvaro Manuel Conrado Dávila, de 15 anos, cujo, no dia 20 de abril, em Manágua, “apoiava o protesto levando água para os manifestantes da Universidade Politécnica”, segundo depoimento recebido pelo CIDH.
O adolescente Álvaro é um dos 800 casos denunciados por recusa do atendimento de saúde nos hospitais do país. O relatório conclui que a negação de atendimento médico aconteceu em casos de ferimentos graves e configura violações dos tratados de direitos humanos. A acusação do CIDH aponta que a falta de atendimento médico foi represália por parte do governo aos manifestantes.
Na sessão da OEA, Denis Moncada Colindres, chanceler nicaraguense, rechaçou o relatório, julgando-o por “subjetivo, tendencioso e parcial” e que as violações de direitos humanos não foram por ações do Estado. A Venezuela coadunou com a Nicarágua denunciando a OEA por “atacar à democracia” e “pela falta de profissionalismo, imparcialidade e porque é proteção aos grupos desestabilizadores contra o governo”. A Bolívia também se posicionou em defesa de Daniel Ortega.
Os demais países apresentaram suas preocupações com a violência e a situação política. A maioria dos países defendeu que Daniel Ortega siga as 15 recomendações da OEA, que incluem o fim da repressão das manifestações, a garantia de meios de comunicação livres e o acesso de organismos internacionais de direitos humanos no país. O secretário-geral da OEA, Luis Almagro, apontou a necessidade de serem adiantadas as eleições. Canadá e Estados Unidos fizeram eco ao presidente.
A proposta de antecipação das eleições para 2019 já foi apresentada pela Conferência Episcopal Nicaraguense que lidera as negociações com o governo. Na tarde de quinta-feira, 21-6, os bispos do país se reuniram em Masaya para uma manifestação pela paz. Ocorreu diálogo com um comissário do governo, Ramón Avellán, comprometeu-se com o episcopado de cessar imediatamente a repressão no país. O chanceler chileno, Juan Barría, prestou reconhecimento à atuação da Igreja “por ser tão determinante na democratização da Nicarágua”.
Es vergonzoso el discurso cínico. El cinismo funciona como una droga para no afrontar la realidad, como un sedante para soportar la vergüenza por el mal cometido y como un estimulante para dar apariencia de fortaleza. Al final el cínico acaba intoxicado.@CIDH
— Silvio José Báez (@silviojbaez) 22 de junho de 2018
Entretanto, o depoimento do chanceler nicaraguense na OEA resultou em manifestação dos bispos. Dom Silvio Baez qualificou o discurso como “cínico e vergonhoso”. Dioceses do país já anunciaram o cancelamento de missas, catequese e atividades pastorais. A poetisa Gioconda Belli afirmou que pelo posicionamento de Colindres “se pode deduzir que o governo seguirá com a sua posição e atuação repressiva”.
Colindres habla de la Constitución como si ellos no la hubiesen convertido desde que llegaron al poder en un mamarracho reescrito para conveniencia de Daniel Ortega y su intención de perpetuarse en el poder y seguir ejerciendo un poder absoluto. Es indignante.
— Gioconda Belli (@GiocondaBelliP) 22 de junho de 2018
Podemos deducir, del informe del Canciller Colindres, que su gobierno seguirá "defendiendo" su posición y su actuación represiva. Su discurso es un pronóstico de que no detendrán su actuación violenta y aumentarán sus intentos de que haya una reacción por parte de la población.
— Gioconda Belli (@GiocondaBelliP) 22 de junho de 2018
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Nicarágua. Informe da CIDH denuncia uso abusivo da força do Estado contra crianças e adolescentes - Instituto Humanitas Unisinos - IHU