18 Abril 2018
A aliança de ouro amarelo brilha em sua mão esquerda. David Gréa, sacerdote em Lyon por dezessete anos, pároco não-conformista de Sainte-Blandine Lyon-Centro, até escolher a vida de casado, em 2017, celebra em 15 de abril o primeiro aniversário de casamento com Magalie. Há um ano, ele afirma, vive "uma grande alegria", da qual participa o seu bebê de seis meses de idade, Léon, a sua catapora e os dentinhos brotando. Aos 48 anos, esse homem, nascido em uma família do catolicismo social de Lyon, também está em plena reciclagem profissional. Para um padre que não pode mais desempenhar sua função, não é algo fácil: "Você perde tudo: status, segurança, rede".
Escolheu um curso de formação para "coach": "De alguma forma, eu continuo fazendo o que eu aprendi a fazer".
A informação é de Cécile Chambraud, publicada por Le Monde, 14-04-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
Muitos outros sacerdotes antes dele se casaram e deixaram o ministério. O que torna a sua história diferente, é que ele teria desejado ardentemente permanecer padre, mesmo que casado. Em 18 de abril, vai publicar um livro: Une vie nouvelle: prêtre, marié, heureux (Uma nova vida: padre, casado, feliz, Ed, Les Arenes, 300 p, 18 €) em que se declara pelo fim do celibato obrigatório dos sacerdotes. Recusa-se, no entanto, a ser considerado um militante: "A militância, explica, seria colocar-me frontalmente contra a Igreja, enquanto eu me sinto parte da Igreja. Eu acho que as coisas têm de evoluir, sinto isso em meu âmago, na minha história, mas amo e honro esta Igreja. Eu aceito tudo: o que eu gosto e o que eu gosto menos".
Para apoiar sua causa, e por intermédio do Cardeal Barbarin, arcebispo de Lyon, David Gréa encontrou-se por duas vezes com o Papa Francisco, em janeiro de 2017, depois de sua decisão de se casar. A segunda vez junto com sua esposa, uma protestante. O papa argentino, que no momento está refletindo sobre a possibilidade da ordenação de homens casados, ouviu-os. Ele excluiu eventuais "soluções faça-você-mesmo" como colocá-los sob a tutela de uma Igreja oriental, que admite padres casados, e disse-lhes que ao invés de uma solução para seu caso particular, era preciso "buscar o caminho que leve à solução". Enquanto isso recomendou a eles "ficar na paciência de Deus". "A sua incrível capacidade de escuta me fez pensar que meu testemunho tenha algum significado para ele", sorri hoje David Gréa.
"Se Deus quer agir através de mim, que a Sua vontade seja feita", havia escrito à sua futura esposa.
Depois de deixar Lyon, o ex-padre evitou a mídia. Em 19 de fevereiro de 2017, seus paroquianos souberam de sua escolha de vida através da leitura de uma carta durante a missa por parte do vigário geral da diocese. O Cardeal Barbarin, a quem tinha confiado a sua intenção de se casar, havia lhe pedido para tirar alguns meses de reflexão – de discernimento, como dizem os católicos- longe do dia-a-dia tão saturado da vida de um sacerdote. Ele também havia lhe proibido celebrar a missa a partir daquele momento.
David Gréa acabou se casando pouco depois, acreditando ter suficientemente amadurecido a sua decisão com Magalie, conhecida um ano antes. Desde então, foi afastado de suas funções. Já não era mais padre David, e não podia celebrar missa. É isso que a Igreja, com uma expressão tipicamente clerical, chama de "redução ao estado laical".
O anúncio da escolha do padre David havia causado um rebuliço, já que em Lyon ele estava sob os refletores. Com uma equipe de leigos tinha revolucionado a vida das paróquias que estavam sob seus cuidados, inicialmente no centro da cidade, depois em Saint-Blandine, bairro em transformação de Confluence, a partir de 2011. Em sua chegada, vivia o ritmo frenético imposto pelos empenhos que recaem sobre os sacerdotes, cada vez menos numerosos, mas do quais os paroquianos parecem esperar tudo.
"Enfurece-me o fato de viver entrando e saindo de reuniões e ter a impressão que as pessoas esperam muito e se contentam com tão pouco", relatava. Como anunciar a mensagem cristã para além das assembleias minguadas dos mesmos fiéis de sempre, em sua maioria idosos? Estresse, cansaço: corre-se o risco de sofrer um esgotamento.
Um encontro provocaria um abalo, o encontro com Benjamin Pouzin, fundador, com dois irmãos, do grupo Glorious, que compõe e canta músicas gospel para a glória de Deus com um estilo contemporâneo, chamado pop louange (louvor pop). O músico apresentou-o às celebrações da Igreja evangélica australiana Hillsong, que atrai multidões nas celebrações fervorosas e regadas à música, com uma dimensão festiva e espetacular muito marcante. Para David Gréa, que ainda era "muito monástico em sua abordagem" com a liturgia, seria uma revelação.
"É forte o contraste com as nossas assembleias de cantos mornos, liturgias repetitivas e rostos abatidos e sem alegria", escreve em seu livro. Ficou convencido de que, a fim de anunciar o Evangelho, era preciso falar a língua de hoje. Os cultos evangélicos o deixavam espiritualmente um pouco ''indiferente', mas reconhecia a sua força:
"Falam a linguagem deste tempo para as pessoas deste tempo. Para pessoas que descobrem a fé hoje, é exatamente o que é necessário".
Com aquele grupo musical e alguns leigos entusiastas, decidiu revolucionar aquela plácida comunidade sonolenta, composta de "100-150 paroquianos, bastante idosos, extremamente participativos", poucos jovens, nenhum recém-chegado e fraca presença nos cultos, naquela paróquia dentro de um bairro em plena transformação urbana. A pop louange foi colocada no centro das celebrações. "Muda-se o cenário, o som, a linguagem", resumia.
Alguns dos idosos tentam se opor, mas "o vento de Deus não pode ser parado", dizia ele, sorrindo. Missas durante a semana, noites de louvor pensadas para os jovens renovaram o público. Houve grande afluência. Na última missa de Natal que ele oficiou, no final de 2016, 2700 pessoas amontoavam-se nas áreas de pista de patinação Lyon-Charlemagne, enquanto outras 1500 não tinham conseguido entrar por falta de espaço. Aquele vórtice, contudo, não dissipava o sentimento de solidão que se apoderava dele à noite. "Eu ficava feliz de dia no meu ministério e triste à noite na solidão", escreveria ao Papa Francisco. Ele nunca gostou de viver sozinho. Além disso, não poderia evitar desejar uma vida como casal, especialmente depois de uma relação amorosa, em 2011.
"Quando se está no seminário, explicava David Gréa, vive-se ali o celibato em um momento propício para vivê-lo plenamente. O que se quer acima de tudo é tornar-se padre. O celibato é uma questão que é colocada no segundo plano. E depois a Igreja nos promete que haverá um dom que vai nos ajudar".
Os formadores falavam com os seminaristas da dificuldade de viver em celibato e indicavam meios diferentes para lidar com isso. "Se vocês viverem mal o celibato, é melhor uma mulher do que uma garrafa, porque com uma mulher que vocês têm alguém com que se confrontar, com a garrafa não", dizia-lhes um desses formadores. Quatro anos de psicanálise o ajudam gradualmente a ver claramente. O encontro com Magalie fez o restante.
Há um ano, ele vive com sua esposa na região de Paris. Descobriu a vida de casal.
"O que eu vejo, é que a vida de marido e pai ilumina o Evangelho. Digo a mim mesmo que se eu pudesse pregar agora, teria muitas coisas novas a dizer. E espero poder fazer isso um dia", e organizou uma vigília ecumênica de oração, a pedido de um amigo pastor.
O ministério lhe faz falta? "Eu celebrei cada missa da minha vida com alegria, testemunha. Nunca fiz de forma automática, mesmo quando celebrava três ou quatro no fim de semana. Eu estava com uma comunidade e meu ministério assumia sentido naquela comunidade. E, uma vez que não estou mais em uma comunidade, a ‘razão de ser’ de celebrar desaparece".
O que não quer dizer definitivamente. Além disso, o livro que escreveu, foi assinado como "padre David Gréa".
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Casado, o ex-padre David Gréa voltaria de bom grado a pregar - Instituto Humanitas Unisinos - IHU