29 Março 2025
A Rede Brasileira de Teólogas (RBT) surgiu no segundo semestre de 2022. "Cada mulher da Rede Brasileira de Teólogas (atualmente somos cerca de 80), das mais diversas partes do nosso país, trouxe e traz, em comum, o ardente desejo de formarmos um grupo de mulheres cristãs que possam fazer teologia, praticar teologia e construir teologia a partir das próprias experiências, necessidades, realidades, desejos e anseios", conforme o relato do artigo a seguir, o qual foi enviado ao IHU por suas autoras: Andréa Moller, Ivenise T G Santinon, Karen Colares, Perla C Doneda, Priscila Cirino.
Desde que a Rede Brasileira de Teólogas (RBT) surgiu, no segundo semestre de 2022, sua identidade foi-se delineando pouco a pouco, em um caminho de diálogos e de busca para encontrar o modo como desejamos ser uma rede, formada por mulheres, que vivenciam a teologia como seu espaço de missão na sociedade. Um passo muito importante neste processo foi dado no 2º Encontro Presencial da RBT, realizado em São Paulo, de 15 a 17 de novembro de 2024. Antes, porém, de falar sobre esse encontro, vamos nos apresentar.
Cada mulher da Rede Brasileira de Teólogas (atualmente somos cerca de 80), das mais diversas partes do nosso país, trouxe e traz, em comum, o ardente desejo de formarmos um grupo de mulheres cristãs que possam fazer teologia, praticar teologia e construir teologia a partir das próprias experiências, necessidades, realidades, desejos e anseios. Sempre soubemos que éramos centenas de nós, espalhadas por esse Brasil, cada uma agindo ou abrindo brechas onde fosse possível, e por vezes até impossível, o ano inteiro e o dia todo. Portanto, temos consciência de que a RBT pode e deve ser maior do que é hoje. E aquelas que hoje compõem a Rede expressam um mesmo desejo: o de nos unirmos para construir juntas o que, como teólogas, queremos oferecer às nossas comunidades cristãs e à sociedade.
Cada uma traz a sua experiência e, na pluralidade que nos constitui, vamos construindo nossas respostas – e também nossas perguntas – neste mundo também plural, múltiplo e dinâmico. Nesse processo de elaboração e buscas, além de reuniões online, a RBT realizou o primeiro Encontro Presencial, na cidade do Rio de Janeiro, nos dias de 10 a 13 de novembro de 2023, e o segundo encontro presencial na cidade de São Paulo, de 15 a 17 de novembro de 2024.
Uma rede em construção
Motivadas pelo tema Mulheres teólogas em Rede: desafios e perspectivas libertadoras, 30 membras da RBT estivemos reunidas em São Paulo, em um fim de semana que se tornou oportunidade para avaliar o percurso feito, acolher novas integrantes, pontuar falhas no processo, traçar novos rumos e metas. Criamos espaço para uma ampla escuta das envolvidas, visando o engajamento de todas as participantes, inclusive das que não poderiam participar presencialmente do evento. Isso foi feito através de um formulário disponibilizado previamente, por meio do qual poderiam ser levantados dados sensíveis à RTB.
Por ser uma Rede ainda embrionária, em processo de construção, o encontro teve como propósito aprofundar reflexões e resoluções do encontro anterior e avaliar o caminho percorrido até então. O fim de semana foi permeado de muito diálogo em grupos pequenos e em plenárias, e também nos intervalos das sessões propostas. Contamos ainda com duas conferências, proferidas por Ivone Gebara e Karen Colares, que trouxeram também elementos significativos para nossa reflexão.
Algumas perguntas orientaram nossas reflexões e partilhas: Somos de fato Rede? Que Rede queremos ser? Como podemos e devemos nos organizar? De quais valores não podemos “abrir mão”? Quais são as nossas bases inegociáveis? Qual linha teológica e hermenêutica teremos?
Fomos notando que a necessidade prioritária era refletir com maior consistência a identidade, a missão e o modo de atuação da Rede Brasileira de Teólogas (RBT), sobretudo com base em uma teologia crítica de libertação. Percebemos também a necessidade de uma maior articulação das integrantes e de uma organização da Rede efetivamente como rede.
Ivone Gebara nos instigou a refletir sobre as implicações da misoginia do nosso tempo e do quanto a reproduzimos nas nossas ideias, cultura, falas ou ações. Demonstrou o quanto fomos e somos plasmadas pelo cristianismo androcêntrico, em que o poder masculino se impõe como universal nas relações de toda sociedade. Gebara trouxe ainda diversas reflexões sobre como pensar a rede em uma dinâmica servidora, acolhedora e comprometida com a realidade.
As palavras proféticas de Ivone Gebara encontraram eco em nossos anseios e inquietações. De modo geral, havia entre as presentes no encontro muita insatisfação com a forma como algumas importantes questões foram respondidas pela RBT. Percebíamos que era necessário sermos mais incisivas em posicionamentos, especialmente a respeito de comportamentos sociais e/ou eclesiais em que a discriminação de gênero, raça ou classe social é patente. Havia também um descontentamento em relação a uma tendência de que a Rede se tornasse um grupo tão somente para divulgação de textos acadêmicos.
Com tudo isso, depois de diversos espaços de diálogo, partilha, escuta e votações, sempre visando respeitar o consenso, percebemos a necessidade de dar novos passos na construção da Rede Brasileira de Teólogas. Foi assim que reformulados a identidade e a missão da RBT, para que expressassem melhor a caminhada que já realizamos e o que desejamos ser daqui para frente. Nossa identidade ficou expressa da seguinte forma: “A Rede Brasileira de Teólogas é composta por mulheres, que tenham teologia ao nível acadêmico, trabalhem e/ou pesquisem na área”. Por sua vez, “a missão da RBT é produzir e divulgar o fazer teológico na perspectiva feminista, promovendo a interação fé e vida”.
Além disso, decidimos reestruturar as comissões de trabalho que viabilizam nosso funcionamento e passamos a contar com três comissões: Comunicação, Secretaria e Jurídico-Financeira. As integrantes de cada uma delas escolhem sua coordenadora. As três coordenadoras, por sua vez, a coordenação geral da RBT.
Finalmente, decidimos também implementar um novo modo de atuação, em que estaremos distribuídas em “comunidades temáticas”. Elas serão espaço propício para continuarmos construindo juntas a Rede que queremos ser. Reunidas em grupos menores e segundo nossos principais interesses e campos de atuação, poderemos nos conhecer melhor e potencializar nossas produções teológicas e nossa ação pastoral. Atualmente, as comunidades temáticas estão em vias de iniciar seus trabalhos.
Nosso encontro, encerrou-se com a conferência “Esperanças, utopias e interseccionalidade em rede”. Karen Colares trabalhou, principalmente, a partir do texto bíblico de Gênesis 38, como eixo de esperança para as mulheres no enfrentamento de estruturas que nos tratam de modo injusto e limitante. Nesse sentido, nos comprometemos a abordar nas temáticas de grupo e nas mais variadas atividades que entendemos como nossa identidade e missão, a luta contra a violência sexual e moral das mulheres, crianças e adolescentes. As mulheres presentes manifestaram alegria e renovação, diante da esperança utópica para a qual a conferência apontou. As palavras de Karen serviram como impulso para percorrer os caminhos instigantes a que nos propusemos.
Desafios e perspectivas
Desde que finalizamos nosso encontro presencial, vivenciamos alguns desafios em nosso peregrinar. Ao mesmo tempo, confirmamos o avanço dado na construção de nossa identidade, assim como a importância da Rede diante dos desafios da atualidade.
Na medida em que vamos nos constituindo como Rede Brasileira de Teólogas, entendemos ser importante pontuar que a identificação da RBT a partir da perspectiva feminista não significa que apenas os debates feministas na teologia nos interessem, mas que toda a teologia é encarada a partir de um posicionamento ético que se pauta na equidade.
Uma vez que não há construção de conhecimento sem que haja ponto de partida, a suposta isenção e neutralidade apenas serve ao ocultamento dos reais pontos de partida da produção que se tem em foco. O pensar teológico feminista está para além de uma circunscrita área da teologia – a teologia feminista. Trata-se de um modo de ver a realidade, de existir no mundo e – também – de fazer teologia, que surge da constatação de que a realidade da mulher na história da teologia e igreja é marcada por injustiças. A partir daí, nossas vidas se pautam em vistas da construção da equidade de gênero e, por ela, se estende a todas as outras lutas em prol da justiça.
Para conhecer mais sobre a Rede Brasileira de Teólogas, acesse nosso site: www.redebrasileiradeteólogas.org.
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