30 Abril 2024
"O que me torna pessimista, muito pessimista é que, como foi entre 2014 e 2018 no Brasil, não há como tentar de tornar o debate um pouco mais racional", escreve Giuseppe Cocco, professor da da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, em comentário publicado em seu Facebook, 26-04-2024.
Eis o artigo.
Olhando para o que rola no mundo hoje, temos uma série de tendências de fundo - estruturais - que são uma mais ruim que a outra. Visto desde o Brasil e América Latina, tínhamos a deriva fascista de certos governos ditos progressistas (Venezuela in primis). Depois disso, apareceu a versão brasileira do fascismo global (anti-globalização), ao mesmo tempo bem brasileira (um mix de milicianos, evangélicos e elites - financeiras e militares- escandalizadas diante dos escândalos (não por causa da corrupção, mas porque enfim ela era combatida) - e bem internacional (Bannon, Dugin que tem como público e leitores o Trump ou o Lula).
Agora temos uma guerra de alta intensidade, tocada por um eixo de ditaduras neo-patriarcais que encontra seu maior apoio no pessoal que atribuiu o patriarcado ao neoliberalismo (ao passo que esse tenta apenas de lucrar sobre o fim do patriarcado). A esquerda - na sua maioria - apoia uma guerra de colonização (contra a Ucrânia) em nome do "decolonial".
Se mobiliza pelo oriente médio sem piscar os olhos diante do que décadas de fundamentalismo islâmico produziram no Irã.
No pequeno Brasil, o abismo se abriu na não abertura da esquerda às reivindicações de junho de 2013, na maluquice das eleições de 2014 (o PT polarizando com se a derrota de Dilma fosse o fim do mundo). Todo o mundo entrou nessa espiral doida, de uma polarização cultural totalmente descolada de qualquer projeto ou dinâmica de transformação social e material.
Polarizando para sentar juntos aos brazões ... até intelectuais que dizem se dedicar ao pensamento da diferença (que deveria desbinarizar) transformaram essa pauta (sentar com os brazões) em uma profissão e andam por ai orgulhosos, falando até de ciência.
Sempre fiquei impressionado por como essa doxa doente da esquerda brasileira vigorava ainda mais forte "lá fora", nas universidades do dito "primeiro mundo" e hoje tenho uma resposta, mesmo que parcial: essa maluquice pegou lá fora e até mais do que no Brasil.
Não é o "decolonial" aplicado como maionesa a qualquer legume que explica a dinâmica nacional socialista das esquerda no Sul Global, é esse delírio geral da esquerda universitária (identitária) que explica o uso dessa maionesa de maneira generalizada.
O que me torna pessimista, muito pessimista é que, como foi entre 2014 e 2018 no Brasil, não há como tentar de tornar o debate um pouco mais racional.
O abismo está aberto e o rebanho luta com força para precipitar nele.
Luta-se para ficar no rebanho e quando o rebanho está formado, não adianta dizer, há um Bolsonero (sic.) lá na frente, um Trump que volta, um novo nazismo no eixo entre Rússia, Irã, China, Korea do Norte.
Não adianta, o rebanho continua abestado .. e por aí vamos... rumo à catástrofe.
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Formando o rebanho, rumo ao abismo... Artigo de Giuseppe Cocco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU