11 Março 2024
Um grupo de padres formados em seminários ultraconservadores, defensores da rígida moral de João Paulo II, têm se dedicado a boicotar qualquer tentativa de reforma na Igreja praticamente sem reprovação por parte da cúpula episcopal espanhola.
A reportagem é de Jesus Bastante, publicada por Religión Digital e reproduzida por El Diario, 29-02-2024.
São conhecidos no meio religioso como a "facisfera católica". Um grupo de padres, relativamente jovens, formados em seminários ultraconservadores, defensores da rígida moral de João Paulo II e que, desde a eleição do Papa Francisco, têm se dedicado a boicotar qualquer tentativa de reforma. Uma campanha que, salvo exceções, não tem resultado em chamadas à ordem por parte dos bispos espanhóis, apesar de, em alguns casos, terem chegado a pedir a Deus a morte do Papa.
Isso mesmo ocorreu em 22 de fevereiro passado em um conhecido canal do YouTube chamado La Sacristía de la Vendée, onde o pároco toledano Gabriel Calvo Zarraute afirmava que reza "muito pelo Papa para que possa ir ao céu o mais rápido possível". Uma afirmação que provocou risos dos outros clérigos presentes na transmissão, sem que nenhum deles o repreendesse por desejar a morte, mesmo que de forma figurada, ao Pontífice.
Os protagonistas anteciparam-se à sugestão do arcebispado de pedir desculpas, embora com algumas reservas. "Sentimos pesar pelo comentário infeliz, feito em tom de humor, sobre 'rezar para que o Papa vá para o Céu o mais rápido possível'. É um comentário de mau gosto e, embora não expresse desejos de morte para o Papa, como alguns meios maliciosamente espalharam, compreendemos que possa ser entendido dessa forma", afirmou La Sacristía de la Vendée em comunicado publicado à tarde postado na rede social X.
De qualquer forma, eles deixam claro que não se trata de uma retratação: "Não nos desculpamos". Mas lamentam "os problemas causados" aos seus respectivos episcopados "com a chegada de protestos". "Reiteramos nossa adesão ao Papa Francisco (...). Repudiamos os ataques ao Papa e à unidade da Igreja e àqueles que negam a legitimidade do ministério do Papa", afirmam. Algo que têm feito, a partir desses e de outros púlpitos mediáticos, há anos.
Ao longo desta década, sacerdotes como Patxi Bronchalo ou Jesús Silva têm distribuído críticas às aberturas de Francisco sem que seus superiores, os bispos de Getafe ou Madri, lhes tenham dito nada. Eles fazem isto, todavia, tentando não ultrapassar certos limites, como as críticas diretas ao Papa Francisco ou à sua doutrina.
Agora, parece que algumas coisas começam a mudar, embora ainda de forma tímida. Especialmente após as duras críticas à declaração Fiducia Supplicans que permite abençoar casais homossexuais e à mobilização pública liderada por alguns padres, tanto o arcebispado de Madri como a diocese de Toledo (berço de muitos dos padres ultraconservadores) tiveram que intervir e exigir que os padres retirassem seus nomes.
Quase todos os envolvidos acataram a ordem (incluindo José Manuel Alonso Ampuero, Julio Alonso Ampuero e José María Cabrero, bem como o controverso ex-ecônomo da diocese de Cádiz e Ceuta, Antonio Diufaín Mora), exceto Francisco J. Delgado (agora em reserva em Dallas, EUA), sem que houvesse qualquer sanção por parte de seu bispo.
Até agora. Francisco José Vegara, um desses padres, foi sancionado nada mais nada menos que por José Ignacio Munilla – um dos bispos mais ultraconservadores –, que lhe proibiu de oficiar em público depois de não cessar em seu empenho de classificar Francisco como "herege", bem como de denunciar que ele foi eleito de maneira inválida.
Curiosamente, o próprio Munilla exigiu esta mesma semana a retirada de Fiducia Supplicans. Este bispo é, juntamente com Jesús Sanz, uma figura proeminente nas críticas episcopais às reformas deste pontificado.
"Nos últimos meses, tanto o bispo como outros por ele designados têm se reunido com o padre Vegara Cerezo para ouvi-lo, dialogar e, por fim, diante de sua posição reiterada, admoestá-lo por escrito. Neste período, também foram constatados possíveis condicionantes pessoais que podem estar afetando seu comportamento e o exercício adequado de seu ministério pastoral", explica o episcopado em nota enviada à agência ACI.
"Sou um padre cancelado", ri o clérigo em um vídeo depois de saber da sanção, que ocorreu após denunciar por heresia tanto o prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, Dom Víctor Manuel Fernández, quanto o Papa Francisco. "Agora só falta que me condenem em Roma por heresia, quando sou eu que os estou acusando de hereges", zomba em uma gravação publicada há três dias.
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A 'fascisfera' católica: jovens sacerdotes ultraconservadores que rezam no YouTube pela morte do Papa Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU