07 Dezembro 2023
Participação de apoiadores da indústria fóssil na conferência aumentou. São pelo menos 2.456 representantes, contra 636 do ano passado.
A reportagem é de Priscila Pacheco, publicada por Observatório do Clima, 05-12-2023.
A conferência do clima da ONU realizada em Dubai neste momento segue uma tradição amarga: a forte presença de integrantes de petroleiras e de grupos comerciais que apoiam essa indústria. Uma análise publicada nesta terça-feira (5/12) pela coalizão Kick Big Polluters Out (KBPO, ou Expulse os Grandes Poluidores em tradução livre) mostra que pelo menos 2.456 lobistas tiveram acesso à COP28. O número é 7,7 vezes maior do que o de representantes indígenas oficiais, que totalizam 316.
Para Brenna Two Bears, coordenadora líder da Rede Ambiental Indígena, dos Estados Unidos, a COP não vai tomar medidas verdadeiras para enfrentar a crise do clima com essa configuração. “Isso é evidente na forma como a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês) permite quase oito vezes mais crachás para lobistas de combustíveis fósseis do que para delegados indígenas do Fórum Internacional dos Povos Indígenas sobre Mudanças Climáticas”, reclama.
A análise da KBPO é divulgada no mesmo dia em que a COP28 deu início às negociações sobre quando e como acabar com a dependência do uso de combustíveis fósseis. Nesta terça-feira também foi lançado o relatório anual Global Carbon Budget, que concluiu que as emissões globais de carbono seguem em crescimento – sendo quase 90% delas oriundas do uso de combustíveis fósseis. Os pesquisadores preveem emissões de 36,8 bilhões de toneladas em 2023 de CO2, 1,1% acima do registrado em 2022, ano no qual as emissões já eram cerca de 51% mais altas do que os níveis pré-industriais (1850-1900).
Representantes da indústria petroleira ocupam espaço em COPs desde a primeira edição realizada em 1995, afirma a KBPO. No entanto, a quantidade de lobistas tem aumentado no evento. O número atual é quase quatro vezes maior do registrado no ano passado no Egito, quando ao menos 636 lobistas foram identificados. Em Glasgow, conferência realizada em 2021, foram 503.
Joseph Sikulu, diretor-geral da 350.org para o Pacífico, comenta que o grande número de lobistas de combustíveis fósseis nas negociações é injustificável. “A presença crescente na COP mina a integridade do processo como um todo. Viemos aqui para lutar pela nossa sobrevivência, mas quais hipóteses temos se as nossas vozes são sufocadas pela influência dos grandes poluidores?”, questiona.
As presenças deste ano seguem o perfil da análise publicada em novembro também pela KBPO, quando foi identificado que pelo menos 7.200 lobistas participaram das conferências do clima nos últimos 20 anos. Muitos lobistas chegaram a Dubai como parte de uma associação comercial que representa os interesses de petroleiras, sendo que nove dos dez maiores grupos são do Norte global. A Associação Internacional de Comércio de Emissões (IETA, na sigla em inglês), que tem sede na Suíça, por exemplo, levou 116 pessoas à COP28. Algumas são representantes de petroleiras gigantes, como a britânica Shell, a francesa TotalEnergies e a norueguesa Equinor.
“Não é nenhuma surpresa que a maioria das empresas que influenciam as negociações sejam do Norte global. Nos últimos anos, as COPs tornaram-se uma via para muitas empresas fazerem uma lavagem verde dos seus negócios”, diz Caroline Muturi, representante da IBON África.
Delegações nacionais também contam com representantes petroleiros. A França levou mais integrantes da TotalEnergies, além de pessoas da empresa de eletricidade EDF. A Itália aparece com funcionários da petroleira ENI. A italiana ENI ainda enviou representantes pela delegação da União Europeia, que também levou funcionários da britânica BP e da americana ExxonMobil. A delegação brasileira foi com a Petrobras. Nesta segunda-feira (4/12), inclusive, Jean Paul Prates disse que a Petrobras, empresa que ele preside, será uma das últimas a parar de explorar petróleo no mundo.
Alexia Leclercq, co-fundadora da Start:Empowerment, organização ambiental sediada nos Estados Unidos, acredita que a presença de lobistas petroleiros impede o avanço para reduzir a produção de combustíveis fósseis. “Eles são a razão pela qual a COP28 está envolta em uma névoa de negação climática, e não na realidade climática”, diz.
“Estamos onde estamos devido a anos de negação, atrasos e falsas soluções por parte dos próprios grupos responsáveis pelo problema”, completa Hwei Mian Lim, do Grupo Constituinte de Mulheres e Gênero.
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COP28 tem 7 lobistas fósseis para cada indígena - Instituto Humanitas Unisinos - IHU