O mais novo livro do padre jesuíta James Martin, “Come Forth: The Promise of Jesus’s Greatest Miracle” [Vem para fora: a promessa do maior milagre de Jesus], explora as nossas mortes e ressurreições metafóricas cotidianas por meio da história bíblica de Jesus e Lázaro.
Martin conversou com o National Catholic Reporter sobre o que ele aprendeu ao escrever sobre essa misteriosa figura do Evangelho, sobre por que o relato é relevante ainda hoje e sobre as esperanças que ele tem para os leitores do livro.
A reportagem é de Shannon Evans, publicada por National Catholic Reporter, 05-09-2023. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Há muitas personagens e narrativas fascinantes nos Evangelhos que você poderia ter escolhido como tema para um novo livro. O que ocorre na história de Lázaro que lhe parece mais atraente?
Quando eu era adolescente nos anos 1970, vi na TV a minissérie “Jesus de Nazaré”, de Franco Zeffirelli, e, de todas as cenas, a ressurreição de Lázaro foi a que mais me cativou. Basicamente, ver Jesus chamar um homem morto para fora de seu túmulo me fascinou, me aterrorizou e, acima de tudo, me fez querer saber mais sobre o que aconteceu há tantos anos.
Mais recentemente, nos últimos anos desde que comecei a liderar peregrinações à Terra Santa, tenho visto como é poderoso para os peregrinos visitar o túmulo de Lázaro em Al-Eizariya, atual Betânia, agora em território palestino. Eu sempre os convido a pensar em deixar algo “morrer” no túmulo, e essa quase sempre se revela uma experiência poderosa. Tudo isso levou a este novo livro.
Como a história de Lázaro pode ser particularmente relevante nos nossos dias e na nossa época?
À primeira vista, a história de Jesus ressuscitando alguém dos mortos (a propósito, uma das três vezes que ele faz isso nos Evangelhos) pode parecer ter pouca relevância para as nossas vidas diárias. No entanto, essa história pode falar a todos nós, uma vez que todos temos coisas que nos mantêm presos ou não livres.
O tema em geral do livro é como Deus chama a cada um de nós para deixar certas coisas “morrerem” (talvez um antigo ressentimento, um ego arrogante, um desejo de estar sempre certo) a fim de seguirmos a Deus mais de perto. Em vários momentos das nossas vidas, Deus nos chama para fora dos nossos “túmulos” e para uma nova vida.
Você defende muito a inclusão plena dos católicos LGBTQ+ na vida da Igreja. Acha que essa história do Evangelho fala da libertação das pessoas marginalizadas?
Sim, absolutamente! De fato, as palavras que Jesus usa no túmulo de Lázaro em Betânia, traduzidas do grego da maneira mais simples, são “Come out!” [expressão que, em inglês, também pode significar “sair do armário”]. Eu disse ao meu editor que, se esse fosse o título, as pessoas iriam interpretá-lo mal! Mas o convite a “sair” e a abraçar quem você é, celebrar seus dons e aceitar como Deus o ama é algo que muitas pessoas marginalizadas entenderão. É claro que todos somos chamados à conversão e a olhar para os nossos padrões pecaminosos, mas o convite mais profundo é a aceitar o amor de Deus como se é.
O que lhe surpreendeu ao pesquisar ou ao escrever “Come Forth”?
Muitas coisas, mas principalmente a possibilidade de Lázaro ser o discípulo amado do Evangelho de João, uma figura sobre cuja identidade os estudiosos ainda debatem. No livro, eu exploro as razões pelas quais alguns estudiosos do Novo Testamento acreditam nisso. Por exemplo, quando Marta e Maria avisam Jesus que seu irmão está doente, elas o chamam de “aquele a quem você ama”. Depois desse incidente, o discípulo amado começa a aparecer no Evangelho, como se fosse sua introdução na narrativa.
Mais tarde, em João 21, no café da manhã à beira-mar, quando Cristo ressuscitado mantém um longo diálogo com Pedro, há outra indicação. No fim do diálogo, Jesus diz a Pedro sobre o discípulo amado: “Se é minha vontade que ele permaneça até que eu volte, o que você tem com isso?” Então, João escreve que surgiu o boato de que esse discípulo não morreria.
Agora, por que eles acreditariam nisso, digamos, sobre um pescador galileu? Somente Lázaro, o homem ressuscitado dentre os mortos, faz sentido nesse contexto. De qualquer forma, o livro examina todas as “provas” de Lázaro como “discípulo amado”.
Lázaro é uma figura familiar na nossa cultura, muitas vezes servindo de metáfora ou ponto de referência, mesmo entre os não cristãos. Você encontrou inspiração na arte, na música, na poesia ou em qualquer outro meio que possa ser considerado improvável?
Uma boa parte do livro trata exatamente disso, de Lázaro tal como foi retratado na cultura ao longo dos séculos, em todos os gêneros que você mencionou. Ironicamente, um tema recorrente da história de Lázaro na poesia e nas peças de teatro é que ele não quer voltar dos mortos!
Mas acho que as influências artísticas mais poderosas sobre mim foram dois romances, “Lazarus is Dead”, de Richard Beard, e “The Gospel According to Lazarus”, de Richard Zimler, ambos os quais tentam recriar o mundo da Betânia do primeiro século e dar a Lázaro um pouco de pano de fundo. É claro que quase tudo isso é imaginativo, mas precisamos lembrar que Lázaro, assim como suas irmãs Marta e Maria, não são personagens de ficção, mas pessoas reais com histórias reais em um lugar real. Parte do meu livro pretende reconstruir essas histórias e responder à pergunta: “O que podemos saber sobre eles?”
O que você espera que o leitor leve com esse livro?
Que embora não sejamos Lázaro e não estejamos trancados nos nossos túmulos em Betânia há 2.000 anos, há partes de nós que precisam “morrer” ou ser “deixadas para trás no túmulo”, a fim de experimentarem uma nova vida. E que, nos momentos-chave da nossa vida, Deus nos oferece uma nova vida e novas possibilidades, dizendo-nos, assim como Jesus disse a Lázaro: “Vem para fora!”