04 Novembro 2021
"Não me surpreende que o Papa Francisco, que é ’pró-vida’ e um convicto opositor do aborto, também tenha dito que discorda da abordagem de privar os políticos do sacramento da Comunhão apenas por causa de sua posição sobre o aborto”. São as palavras de James Martin, 60, reverendo de Manhattan, editor da revista jesuita America, autor de best-sellers, apresentador de programas de TV, consultor de Martin Scorsese para "O Silêncio" (e figurante em "The Irishman"). O reverendo é um dos expoentes mais abertos da Igreja estadunidense também em relação à comunidade LGBT e falou sobre esses temas com o Papa em um encontro privado no Vaticano em 2019.
A entrevista é de Viviana Mazza, publicada por Corriere della Sera, 01-11-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Qual é a razão para essa diferença entre o Papa e os bispos estadunidenses sobre o aborto?
Para os bispos estadunidenses, o aborto é a questão "preeminente" da vida; o Santo Padre escreveu em Gaudete et Exsultate que "igualmente sagradas" são as vidas daqueles que já nasceram, inclusive os pobres, os migrantes, os refugiados e as outras pessoas vulneráveis. Portanto, concentrar-se quase exclusivamente em uma questão para decidir se alguém pode ou não receber a comunhão não é uma abordagem com a qual o Papa concorda. Além disso, o Papa provavelmente não quer interferir na decisão do bispo local, o cardeal Wilton Gregory, que disse que não deveria ser negada ao presidente Biden a comunhão em Washington DC.
Pode nos explicar a questão da Eucaristia e de Biden, o segundo presidente católico dos Estados Unidos, levantada pelos bispos norte-americanos?
Na última conferência episcopal, os bispos estadunidenses decidiram que escreveriam um documento sobre a Eucaristia para ajudar a explicar o Sacramento e quem pode e quem não pode recebê-lo. De um lado, alguns deles disseram que não tem nada a ver com Joe Biden. Por outro lado, no entanto, bispo após bispo foi repetindo como é terrível Biden receber a comunhão. Então é difícil não ver isso como algo politicamente motivado. E é nisso que focam sua atenção após uma pandemia global? Sobre o fato de Biden poder receber a comunhão ou não?
Como é a relação entre Biden e a Igreja nos EUA?
Depende de como você define a Igreja. Se você a definir como o povo de Deus, muitos católicos votaram nele. Se falamos de hierarquia, muitos são contra ele, infelizmente porque pensam em apenas uma única questão, o aborto, em relação a todas as outras. Os bispos não levantaram problemas quando o ex-ministro da Justiça, William Barr, acelerou várias execuções da pena de morte, o que também vai contra os ensinamentos da Igreja.
Sobre as vacinas, a maioria dos bispos caminha na mesma direção do Papa, que definiu vacinar-se como um ato de amor, certo?
O Papa disse que vacinar-se é algo que se faz para si e também para os outros. Muitos bispos estão tentando ajudar os fiéis a entender que as vacinas são aceitáveis e que não deveriam buscar uma isenção baseada na religião. No entanto, houve quem tentou levantar a objeção de que as vacinas foram criadas por meio de pesquisas que incluíam células fetais; mas nenhum teólogo moral identificou isso como um problema.
Com base no que alguns católicos pedem isenção religiosa?
“Existem alguns padres de extrema direita que se opõem à vacina, e até mesmo alguns bispos e cardeais, como o cardeal Burke, que depois pegou Covid e foi hospitalizado, mas são vozes muito minoritárias. E tornou-se algo político porque muitos conservadores acreditam nas teorias de conspiração sobre a vacina. Alguns casam suas objeções políticas com o desejo de encontrar uma razão religiosa que lhes permita evitar a vacinação. Os católicos não são um grupo monolítico. E essas ideias têm mais a ver com orientação política do que com religião”.
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“Os bispos norte-americanos pensam apenas no aborto: o Papa Francisco não” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU