19 Outubro 2021
A fase diocesana do processo global sinodal, oficialmente intitulado “Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão” começou no domingo 17 de outubro, mas apenas metade das dioceses dos EUA deram o primeiro passo de nomear um coordenador local do sínodo, como requisitado pelas instruções do Vaticano.
No último mês, o time de repórteres da revista America, dos jesuítas estadunidenses, contatou todas as 196 “igrejas particulares” nos Estados Unidos – dioceses, eparquias e o Ordinariato Pessoal da Cátedra de São Pedro – e pôde confirmar a nomeação de 62 coordenadores locais do sínodo. Richard Coll, o diretor-executivo do departamento de Justiça, Paz e Desenvolvimento Humano da Conferência dos Bispos dos EUA (USCCB), quem faz o elo da conferência com esses coordenadores, disse que muitas nomeações estavam sendo feitas dias antes do sínodo, que o número era em torno de 80 na abertura da fase diocesana, representando pouco mais da metade das 176 dioceses do país.
A reportagem é de Colleen Dulle e Doug Girardot, publicada por America, 18-10-2021. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
O sínodo, chamado de “sínodo sobre a sinodalidade” objetiva mudar a Igreja para um modelo descentralizado de tomada de decisão convidando leigos e aqueles que tradicionalmente não tem voz na liderança da Igreja nessas discussões sobre como a Igreja pode ser mais inclusiva e colaborativa. Os três passos do processo incluem uma fase diocesana, de outubro de 2021 até abril de 2022; uma fase continental, do final de 2022 até início de 2023, e uma fase final, universal, que será o encontro dos bispos em outros em Roma em outubro de 2023. Embora o sínodo possa não trazer uma transformação de larga-escala nas estruturas eclesiais, o Papa Francisco o vê como um primeiro passo necessário.
Das 196 igrejas particulares contatadas por America no último mês, 105 não responderam (entre estas estavam três igrejas que foram contatas depois do processo. O artigo será atualizado quando receber respostas). Das 91 que responderam, a grande maioria havia planejado uma missa de abertura, pouco mais de dois terços tinham nomeado um coordenador local, e 35 tinham um plano prático para os encontros de escutas. Apesar das instruções do Vaticano de “deve se dar um cuidado especial para envolver aquelas pessoas que costumam ser excluídas: mulheres, mendigos, refugiados, migrantes, idosos, pobres, católicos que raramente ou nunca praticam sua fé, etc.”, poucas tinham um plano minucioso para reunir esses grupos.
Enquanto os bispos dos EUA, no geral, estão demorando para abraçar o modelo sinodal em comparação com bispos, por exemplo, da Irlanda, Alemanha, Austrália, América Latina e Caribe, o atraso nesse processo particular não pode ser inteiramente atribuído à falta de abertura à sinodalidade, alertou Coll.
As dioceses nos EUA enfrentam uma variedade de desafios para implementar o processo, incluindo tempo inadequado para preparar, uma falta de recursos informacionais e financeiros, e a atual pandemia de coronavírus – problemas que não atingem somente eles.
A Secretaria do Sínodo do Vaticano publicou dois documentos essenciais – o preparatório e o vade-mécum, para as dioceses – somente no dia 07 de setembro, o que, disseram algumas dioceses, não deu tempo suficiente para se preparar para a data de lançamento, 17 de outubro. Outras dioceses que tinham planos mais concretos no dia 17, começaram a planejar antes mesmo dos documentos do Vaticano serem distribuídos – é o caso das dioceses de Bridgeport, em Connecticut, e de Gary, em Indiana.
Outras dioceses, como a Diocese de Rockford, em Illinois, preocupam-se que o risco de contrair o coronavírus possa impedir que alguns constituintes participem das sessões de escuta. Para alcançar aqueles que ficam em casa, a Diocese de Rockford planeja coletar respostas online e pessoalmente.
A pandemia também retardou o processo de planejamento das dioceses, disse Coll. “Acho que, dada a pandemia e vários graus de retorno às secretarias diocesanas, é provavelmente um pouco menos eficiente do que poderia ser o caso”. Ele espera que a página de materiais e instrumentos para o Sínodo, publicada no site da USCCB na segunda-feira, 18 de outubro, ajude as dioceses que estão lutando para fazer seus planos.
Finalmente, cerca de 40% das dioceses dos EUA são consideradas dioceses de “missão”, o que significa que cobrem uma grande área, têm poucos católicos ou enfrentam dificuldades financeiras. As eparquias católicas orientais enfrentam muitos desses mesmos desafios. Por causa das grandes distâncias e recursos escassos, o planejamento de sessões de escuta que alcancem o maior número de pessoas possível tem sido particularmente difícil. Um porta-voz de uma dessas dioceses, a Arquidiocese de Anchorage-Juneau, no Alasca, disse à America que não poderia fornecer nenhuma informação sobre os planos do sínodo.
Coll, que anteriormente trabalhou na Catholic Home Missions da USCCB, que financia as dioceses missionárias do país, disse que queria priorizar o apoio aos esforços sinodais dessas dioceses. Em particular, ele espera apoiar as eparquias, que, como outras igrejas orientais, têm usado o modelo sinodal por séculos, ao passo que se tornou um foco de igrejas de rito romano somente após o Concílio Vaticano II.
“Eles têm, é claro, um dom especial porque, como eles diriam, eles sempre tiveram uma tradição mais sinodal em termos de como eles abordam suas decisões como membros de comunidades de rito oriental”, disse Coll. “Mas eles também enfrentam problemas financeiros porque, novamente, como grandes territórios, nem tantos fiéis fazem parte das eparquias... Portanto, obter os benefícios de seus dons e, ao mesmo tempo, apoiá-los de maneira prática, acho que será muito valioso e importante”.
Apesar dos desafios logísticos que enfrentam muitas dioceses nos Estados Unidos, várias que a America procurou indicaram que estavam bem preparadas.
Na Diocese de Gary, Indiana, dom Robert J. McClory disse em uma entrevista por telefone que sua diocese decidiu começar a se preparar para o Sínodo assim que o Vaticano anunciou seus planos em maio de 2021. Meses antes do início do Sínodo, a diocese manteve encontros com os padres da diocese e com o conselho pastoral diocesano. As dificuldades logísticas deste processo foram amenizadas pelo fato de que a Diocese de Gary realizou seu próprio sínodo local em 2017. Na mesma época desse sínodo, dom McClory estava envolvido na coordenação de outro sínodo na Arquidiocese de Detroit, onde ele havia servido como vigário geral antes de ser ordenado bispo de Gary.
Da mesma forma, a Diocese de Bridgeport, em Connecticut, iniciou o processo durante o verão. No final de agosto, dom Frank Caggianno enviou uma carta aos pastores da diocese explicando os objetivos do sínodo e instruiu as paróquias a escolherem os delegados sinodais até 15 de setembro – um mês antes da missa de abertura do sínodo.
Em Gary e em várias outras dioceses, incluindo Corpus Christi, no Texas; Marquette, em Michigan; Phoenix, no Arizona; e Reno, em Nevada, os líderes do processo sinodal têm planos de alcançar uma ampla gama de grupos que tradicionalmente foram deixados de fora das discussões da Igreja, conforme as recomendações do Vaticano. Em Gary, a diocese conduzirá discussões com jovens, idosos e populações interculturais, fazendo isso em grupos de apenas sete pessoas por vez para encorajar discussões sinceras.
Enquanto isso, o padre Timothy Ekaitis, que atua como coordenador sinodal na Diocese de Marquette, Michigan, disse, por e-mail, que sua diocese está fazendo esforços para envolver membros de tribos indígenas americanas, cristãos de outras denominações e católicos de rito oriental. Em Phoenix, os organizadores sinodais se empenharão em incluir perspectivas de pessoas sem-teto e pessoas que não praticam mais a fé católica.
Claro, uma coisa é aspirar a incluir pessoas de origens diversas e outra é fazê-lo – especialmente quando uma determinada diocese inclui pessoas que falam uma variedade de línguas e vêm de culturas diferentes. As dioceses que estão mais bem preparadas para o Sínodo têm feito esforços para enfrentar este desafio, assumindo a tarefa de alcançar um grupo representativo de pessoas, empregando estratégias que se assemelham a campanhas de voto antes das eleições nacionais.
Na Diocese de St. Augustine, na Flórida, os coordenadores enviam cartões postais às casas católicas, realizam uma campanha nas redes sociais e distribuem folhetos promocionais em sete línguas diferentes. Além disso, os delegados de cada paróquia foram instruídos a encorajar outros paroquianos a se envolverem no sínodo. A diocese planeja designar pessoas de diferentes culturas para liderar alguns dos grupos de escuta para que todos os participantes sintam-se confortáveis.
Alguns estados mais ao oeste, no Texas, a Arquidiocese de San Antonio enviou um brilhoso e colorido cartão avisando o propósito do sínodo e descrevendo detalhadamente como as pessoas da arquidiocese podem participar. Os cartões foram impressos nas línguas inglesa e espanhola, a fim de chegar ao máximo de pessoas possíveis, numa área de grande população latina.
As apostas são altas. Embora os papas tenham convocado o Sínodo dos Bispos desde a conclusão do Concílio Vaticano II (30 vezes desde 1967), talvez nenhuma outra reunião sinodal tenha tido tanto potencial para mudar as estruturas da Igreja, ou pelo menos a imagem que a Igreja tem por si mesmo – mudando de um modelo que identifica a Igreja principalmente com a hierarquia para uma visão da Igreja como o “povo de Deus”, uma forte ênfase do Vaticano II. O Papa Francisco fez da implementação do concílio um dos principais objetivos de seu pontificado, e o “sínodo sobre a sinodalidade” poderia moldar significativamente seu legado.
O que permanece em questão é o efeito que o sínodo terá na Igreja dos Estados Unidos e se uma comunidade católica e um episcopado dividido em linhas políticas serão capazes de se reunir para discussões abertas que certamente tocarão em questões polêmicas que dividiram a Igreja estadunidense por décadas. O Papa acredita fortemente no poder transformador do encontro e da escuta entre as pessoas que discordam, mas ele acertadamente alertou contra os sínodos se tornarem “parlamentos”. Sem um compromisso de escuta, de humildade e de caridade, essas discussões sinodais correm o risco de traçar linhas de batalha cada vez mais profundas na já dividida Igreja Católica dos EUA.
Um outro risco é a inclusão. Muitas das dioceses contatadas por America relataram nenhum plano para ir além das paróquias, e os grupos de discussão paroquiais provavelmente atrairão apenas aqueles que já estão mais envolvidos na paróquia. Embora essas vozes sejam certamente importantes, o Vaticano enfatizou a possibilidade de alcançar aqueles que estão à margem da Igreja ou fora dela.
“Acho que se fosse limitado a vozes tradicionais, por mais importantes que sejam, isso não seria um bom resultado, porque estaríamos excluindo exatamente o tipo de vozes que são mais cruciais para o processo sinodal”, afirmou o diretor Coll. Ele disse que se medirá o sucesso do processo “pela duração e amplitude do diálogo e pela inclusão de comunidades e grupos de indivíduos que têm percepções múltiplas, divergentes e distintas sobre como a Igreja Católica pode ser uma igreja mais sinodal, tanto em termos de seu funcionamento interno, bem como sua relação com o mundo mais amplo”.
Para esse fim, ele está envolvendo organizações católicas que vão ao encontro das pessoas que estão às margens, como a Caritas e a Catholic Relief Services. Quando questionado sobre seu conselho para indivíduos que desejavam participar do processo, mas não receberam informações de suas dioceses, Coll sugeriu entrar em contato com a diocese e enviar o feedback para o seu escritório na USCCB, pelo site da conferência.
Talvez o maior desafio que os bispos estadunidenses enfrentam neste processo seja o objetivo final do próprio processo: aumentar a colaboração e descentralizar o poder. O Sínodo procura mover a Igreja de um modelo puramente de pregação para um que escuta, se engaja no diálogo e discerne junto com uma variedade de pessoas. Esta seria uma mudança significativa para vários bispos americanos.
Existem alguns sinais de esperança. Embora os bispos dos Estados Unidos não tenham se dedicado ao sínodo em sua reunião de junho – sua última reunião antes do início do processo – eles planejam discuti-lo por 45 minutos em sua reunião de novembro, disse Coll. Ele disse estar confiante de que quanto mais dioceses iniciarem seus processos, outras seguirão o exemplo.
Aqueles que já participaram de sínodos anteriormente, como dom McClory de Gary, Indiana, também enfatizam que o próprio processo sinodal pode ser transformador.
McClory disse acreditar que este sínodo “contém muitas promessas”, mesmo que a tarefa seja um tanto assustadora. “Tenho experimentado, direta e indiretamente, a vitalidade que eles [sínodos] podem agregar a uma Igreja local”, disse ele.
McClory disse que quando perguntou aos membros de sua diocese quando eles achavam que a diocese estava no seu melhor momento, eles responderam que era durante o sínodo diocesano de 2017. “Aquela experiência sinodal foi realmente um momento de grande alegria para eles. Então, eu quero construir em cima disso”.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
EUA. Quais são os planos das dioceses para o sínodo? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU