Na próxima terça-feira, dia 05 de outubro, às 10h, o Prof. Dr. Roberto Marchesini, médico veterinário, etologista e filósofo, estará no IHU para debater sobre “A condição pós-humana em um mundo maquínico. Tecnosfera, presença e responsabilidade social”.
Em um artigo enviado pelo próprio professor para o IHU em março deste ano, Marchesini introduz esta discussão asseverando que “ o pós-humano é uma condição própria do ser humano, uma entidade que, desde as primeiras expressões, fizeram da hibridação uma das expressões mais típicas da própria natureza. Podemos, portanto, afirmar que sempre fomos pós-humanos”.
Segundo o pensamento pós-humanista, Marchesini comenta que “a espécie humana apresenta características inatas – entendidas como tendências motivacionais, características cognitivas, dimensão de umwelt, gamas de possíveis resultados ontogenéticos – assim como todas as outras espécies. Estas são o fruto do percurso filogenético, ou seja, das pressões seletivas e da linhagem particular de derivação, da espécie Homo sapiens”. E aponta para o fato de “de uma natureza humana que representa tanto as condições de partida do indivíduo, quanto o perímetro do campo de desenvolvimento possível para o ser humano. Ao contrário do trans-humanismo, para a perspectiva pós-humanista não existe uma total liquidez da condição humana, mas apenas uma relevante plasticidade, atribuível ao excesso somático, por exemplo o grande número de neurônios e a flexibilidade da conformação pratognósica, e não a uma suposta incompletude”.
A hibridização inerente a nossa espécie incita não apenas elucubrações filosóficas e ontológicas, mas também sociais, éticas e políticas. Conforme expressado pelo professor em outro artigo publicado no início de 2021, “a queda da centralidade universalista do ser humano é evidente. O humanismo, antes, oferecia valores-bússola, mas hoje não é mais capaz de fazê-lo. A filosofia pós-humanista tenta dar novos pontos de referência, em um cenário em que a técnica não é mais um instrumento, mas sim um agente de mudança do humano”.
A mudança de objetos técnicos analógicos para digitais é um dos elementos essenciais para revisarmos nossas acepções sobre a Técnica. Conforme este filósofo, “se até a primeira metade do século XX ainda se podia falar de téchne como de um conjunto de entidades de suporte, parceladas em uma multidão de instrumentos disjuntos, com o advento da revolução digitálica, ela, ultrapassando a condição analógica dos elementos instrumentais separados entre si, assume uma consistência dimensional, ou seja, faz-se ecossistema. A téchne torna-se, portanto, um segundo ambiente que, mesmo quando põe em contato, coloca o sujeito em uma condição de relacionalidade dessomatizada, razão pela qual falamos de tecnosfera”.
E continua: “na tecnosfera, o ser humano é chamado a uma ação de projeção, ou seja, em termos de plena vivência ou de adesão a uma segunda realidade, a fim de poder usufruir das diversas utilidades funcionais – tanto a leitura de um texto, a assinatura de um documento, a escuta de um trecho musical ou a assistência de um filme – movendo-se de modo dimensional entre elas, exatamente como se fosse em um ambiente. Isso muda consideravelmente a noção de presença e responsabilidade nas práticas, uma vez que toda produção do sujeito – seja ela uma simples postagem em uma mídia social ou uma decisão que envolva centenas de pessoas agida com um simples clique – é sempre mediada de modo desestrutural em relação ao plano somático e não se limita ao âmbito telecinético”.
Roberto Marchesini é médico veterinário, etologista e filósofo que se dedica ao estudo de animais desde a década de 1980. Ele combina perspectivas científicas e filosóficas para abordar uma série de questões sobre evolução, comportamento, mente, subjetividade, cultura e ética. Com colegas, ele desenvolveu uma escola de interação e treinamento animal que se baseia em tratar os animais (cães, cavalos, gatos, outros) como interlocutores mentais em uma interação social, ao invés do uso de reforço negativo e simples condicionamento. Ele é o expoente mais conhecido da zooantropologia e do pós-humanismo na Itália, e desenvolveu versões únicas de ambos que podem contribuir para a literatura anglófona sobre eles.
Este debate faz parte do Ciclo de Estudos – A condição humana entre a Biosfera, a Tecnosfera e a Infosfera em tempos sindêmicos.
Para saber mais sobre a Tecnosfera, pós-humanismo, transumanismo e a condição humana, acompanhe a palestra do Prof. Dr. Roberto Marchesini aqui.
A fala do professor Marchesini engloba alguns temas já explorados pelo Prof. Dr. José Manuel de Cózar, professor de Lógica e Filosofia da Ciência na Universidade de La Laguna – Espanha. Acompanhe a íntegra da palestra de José Manuel de Cózar aqui.
O Ciclo de Estudos – A condição humana entre a Biosfera, a Tecnosfera e a Infosfera em tempos sindêmicos debate interdisciplinarmente questões relacionadas às cosmotécnicas, ética, transumanismo, pós-humanismo, tecnofeudalismo, digitalização da governança, sistemas de poder, tecnosfera, biosfera e responsabilidade socioambiental. Estas discussões têm o intuito de evidenciar questões humanitárias em meio às transformações ambientais, climáticas e tecnossocietais globalmente vigentes.
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