05 Outubro 2020
Enquanto o Papa, pela primeira vez após o lockdown, deixa o Vaticano para assinar sua terceira encíclica em Assis, Fratelli tutti, nos sagrados palácios o clima é de confronto final. As investigações da promotoria da Santa Sé sobre a compra do prédio da Avenida Sloane pela Secretaria de Estado não só revelaram um giro de negócios de centenas de milhões de euros, mas inflamaram o confronto entre as várias facções no Vaticano.
A reportagem é de Francesco Antonio Grana, publicada por Il Fatto Quotidiano, 04-10-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
A repentina destituição do cardeal Angelo Becciu do cargo de prefeito da Congregação para as Causas dos Santos foi que acendeu o pavio. Mas sobretudo a decisão de Bergoglio de privá-lo também dos direitos ligados ao cardinalato, impedindo-o de votar no próximo conclave. Um movimento que desalojou os seguidores do ex-substituto da Secretaria de Estado. É evidente, de fato, que Becciu teria desempenhado um papel fundamental na Capela Sistina entre os dois principais e atuais candidatos italianos à sucessão de Bergoglio. De um lado, o Cardeal Secretário de Estado, Pietro Parolin, e do outro o Cardeal Arcebispo de Bolonha, Matteo Maria Zuppi, que cresceu na Comunidade de Santo Egídio.
Certamente Becciu não poderá representar no conclave o partido dos descontentes de Francisco entre os quais estão três nostálgicos cardeais da Cúria: Gerhard Ludwig Müller, Raymond Leo Burke e Robert Sarah. Aos quais podemos acrescentar também Angelo Comastri, afastado e submetido a investigação no caso dos contratos da Fábrica de São Pedro, e Fernando Filoni, antecessor de Becciu na Secretaria de Estado, a quem o Papa destituiu prematuramente como prefeito da Congregação para a evangelização dos povos.
Parolin, o papável.
No momento em que a Secretaria de Estado é abalada por um escândalo financeiro sem precedentes, é inevitável a repercussão sobre Parolin. Sempre foi considerado um papável perfeito, também por causa de sua carreira curial antes de retornar a Roma da Venezuela, para onde foi enviado como núncio por Bento XVI por vontade de seu predecessor direto, o cardeal Tarcisio Bertone. Aparentemente seu perfil não sofreu desgaste, mas é óbvio que excessiva mansidão de Parolin, que não escondeu o fato de ter sido informado pelo noticiário do afastamento de Becciu, pode virar contra ele.
O peso de Zuppi cresce e, apesar de ter criticado a forma como Becciu foi demitido, ele se apresenta cada vez mais como mediador. O episcopado italiano já o vê no seu vértice quando o cardeal arcebispo de Perugia-Città della Pieve, Gualtiero Bassetti, hoje com 78 anos, decidir se aposentar. Zuppi presidente do CEI e depois Papa é o cenário que muitos nos sagrados palácios consideram possível. Duas cartas jogam principalmente a favor do cardeal: a notoriedade internacional num momento em que muitos cardeais não se conhecem, e o fato de ele não ter vínculos, exceto pertencer à Comunidade de Santo Egídio.
No entanto, não devemos subestimar o papel do cardeal Luis Antonio Gokim Tagle, que Bergoglio chamou de Manila como prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos. O cardeal filipino, pupilo de Ratzinger que quis nomeá-lo cardeal em seu último consistório, também foi considerado papável no conclave que mais tarde elegeu Bergoglio. Ele é certamente um homem que pode representar uma síntese entre os diferentes ânimos da Igreja, especialmente dentro do Vaticano. De fato, a defenestração de Becciu recompactou repentinamente a Cúria Romana contra o Papa. Uma aversão que já perdura desde o Natal de 2014, quando Francisco apontou o dedo para seus colaboradores mais próximos ao falar de 15 doenças curiais.
Entre os vencedores do momento está certamente o cardeal George Pell, ex-prefeito do Secretariado da Economia, absolvido das acusações de pedofilia e que recentemente voltou a Roma para ser reabilitado. Mas a sua idade e seus modos rudes nunca lhe deram seguidores, especialmente na Cúria.
Por fim, não se deve esquecer dois importantes outsiders, como o cardeal vigário de Roma, Angelo De Donatis, e o Patriarca de Bagdá, Louis Raphaël I Sako. Duas figuras em torno das quais logo poderia se registrar um notável consenso.
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Dos ‘fratelli tutti’ do Papa aos ‘fratelli coltelli’ (irmãos traiçoeiros) na Cúria - Instituto Humanitas Unisinos - IHU