18 Julho 2019
Educadores e especialistas em financiamento do ensino superior ouvidos pelo Estado levantaram dúvidas sobre os detalhes do programa anunciado pelo Ministério da Educação (MEC) para atrair investimentos privados às universidades federais.
Pesquisadores da área veem como positiva a “intenção” manifestada no plano, mas questionam quais regras que vão garantir o volume de investimentos esperado, a segurança jurídica, e que o programa não aumente a desigualdade entre as instituições.
A reportagem é de Tulio Kruse, publicada por O Estado de S. Paulo, 18-07-2019.
Sérgio Firpo, coordenador de pesquisa e pós-graduação strito-sensu do Insper.
Qual sua opinião sobre as mudanças na legislação para permitir que universidade federais captem recursos da iniciativa privada?
É extremamente difícil captar doações num país em que a cultura de doação é ainda incipiente, não só pelo lado da oferta de doadores mas também pelo lado da demanda. Em geral, um doador gostaria de ver a doação ter algum impacto social, algum tipo de impacto que faça valer a doação.
Não é apenas dizer que se está aberto a doações, mas dizer como o dinheiro será utilizado.
A sociedade como um todo já coloca dinheiro (em universidades públicas) em impostos. Não está muito claro quais são as contrapartidas nesse projeto.
Há uma outra série de delicadezas. É preciso deixar muito claro que o dinheiro desse fundo não será utilizado para outras atividades, e que há todas as garantias legais para que isso vai acontecer. O sucesso desse tipo de iniciativa vai depender muito da fase de implementação
O que o senhor acha da ideia de dar mais autonomia orçamentária às universidades e, ao mesmo tempo, criar um ‘fundo soberano’ para ajudar a financiá-las?
As principais (universidades federais) talvez já tenham alguma estrutura de arrecadação. Talvez elas não precisem. Talvez as que mais precisem sejam justamente aquelas para as quais ninguém quer doar.
O problema é mais do lado de quem vai doar do que de quem vai receber. Minha preocupação é que seja uma verba que as universidades encarem como um dinheiro marcado para gastar com finalidades específicas. Se isso for incorporado no orçamento geral, vai acabar sendo utilizado para contratar mais, para aumentar salário, coisas que não necessariamente estarão atreladas ao destino original do recurso.
Qual sua opinião sobre estimular a competição dessa forma?
Seria legal ter flexibilidade e regras claras para poder premiar pesquisadores e grupos de pesquisa que têm impacto na sociedade, na comunidade científica. O setor público tem uma dificuldade de premiar ou punir professores pela sua produtividade.
A questão é só definir claramente quais são as métricas. O Brasil acabou tomando uma obsessão por metas objetivas que não necessariamente refletem qualidade de publicação ou impacto na comunidade científica.
Nossas universidades federais geram um número de doutores do que diversas consideradas de ponta, várias “top 10” americanas. Isso significa que temos mais impacto na produção intelectual? Não.
Temos talvez muito volume com baixo impacto. Então temos que definir quais são as nossas metas.
A íntegra da reportagem com as entrevistas com Nilson Machado, professor da Faculdade de Educação da USP e com Simon Schwartzman, sociólogo e membro da Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior, está disponível aqui.
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Universidades federais devem captar recursos privados? Especialistas respondem - Instituto Humanitas Unisinos - IHU