11 Abril 2019
A relação entre cristianismo e humanismo; a contribuição para a civilização europeia das comunidades judaicas, que, desde os primeiros séculos da diáspora, graças ao preceito do estudo, não conheceram o analfabetismo e alimentaram constantemente, mesmo nas perseguições e na hostilidade, o pensamento e a cultura do continente; a contribuição fundamental de Erasmo de Roterdã (1466-1536) contra o dogmatismo e a intolerância, e o diálogo com Lutero, que lhe pediu um apoio decisivo na luta religiosa provocada pela Reforma, a respeito da qual Erasmo decidiu permanecer neutro, atraindo, assim, a hostilidade tanto dos católicos quanto dos protestantes.
Continua a nossa viagem ideal às raízes da cultura europeia, sobre a qual dirigimos algumas perguntas ao filósofo e teólogo Giannino Piana, figura de destaque da cultura italiana e animador cultural destas terras, nas semanas que nos aproximam das eleições europeias. O que se segue é a segunda de três intervenções para o nosso jornal (o primeiro foi publicado em 15 de março).
A reportagem é de Marina Borraccino, publicada em Verbano, publicação semanal da Diocese de Novara, na Itália, 05-04-2019. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A modernidade pareceu constituir um retrocesso no processo de desenvolvimento dos valores morais e culturais das tradições originais, que deram origem ao espírito europeu. Mas será isso mesmo?
Quando se fala de modernidade, alude-se, acima de tudo, ao fenômeno da secularização, que introduziu uma visão autônoma do mundo com respeito ao horizonte sagrado da era medieval. Tal emancipação ocorreu com efeitos indubitavelmente positivos: natureza, sociedade, ciência e cultura adquiriram um estatuto próprio com fins próprios. A ética também sofreu, embora com um ritmo mais lento, um processo semelhante, distanciando-se da religião e apelando a motivações de ordem natural e a argumentações racionais. No entanto, isso não significou abdicação dos valores do humanismo clássico e da tradição cristã, que ressurgiram em uma ótica laica, conservando substancialmente o seu conteúdo original.
Nesse caso, alude-se ao humanismo renascentista?
O Renascimento foi, desse ponto de vista, um momento particularmente feliz. A redescoberta do mundo do classicismo, por um lado, e a presença de um cristianismo que ia se recuperando, graças também aos estímulos da Reforma protestante, as raízes evangélicas, favoreceram a abertura de um caminho de renovação. Assim, com a contribuição de alguns personagens iluminados, assistiu-se a um esforço de integração das duas tradições, em outros termos, à abertura de caminho de um humanismo integral, que se traduziu no desenvolvimento de um ideal de civilização de grande esplendor, em que confluíam, de modo harmônico, a valorização da pessoa em toda a riqueza das suas expressões e a abertura à transcendência como resposta última à demanda de sentido. O maior representante da tentativa de dar livre curso a esse modelo foi, sem dúvida, Erasmo de Roterdã, expoente do mundo católico que soube dialogar, por um lado, com Lutero e não hesitou, por outro, a entreter uma estreita relação com o humanismo laico, assumindo as suas reivindicações mais profundas.
Quando ocorreu a ruptura dessa síntese feliz? E por que razões ela ocorreu?
Não se pode negar que a Contrarreforma representou um momento de forte recuo em relação ao caminho descrito. A Igreja Católica, além de reagir duramente à Reforma, encastelou-se em posições defensivas contra as liberdades próprias do mundo moderno, obstruindo a possibilidade de um diálogo crítico e construtivo. O Iluminismo e a Revolução Francesa, com a ascensão da burguesia, e a afirmação dos direitos humanos também nascem, por isso, em clara oposição à Igreja. Mas os valores do humanismo não desaparecem totalmente por causa disso. Eles ressurgem, em chave laica, também na famosa tríade da Revolução Francesa, em que, em particular, a fraternidade tem claras ascendências evangélicas.
E o que dizer das lutas operárias e das ideologias socialistas e comunistas, que reagem aos desdobramentos do capitalismo, reivindicando os direitos dos oprimidos?
Também nesse caso a matriz cristã é evidente. O socialismo humanista francês e suíço, que antecipa o marxismo, faz um apelo direto, para justificar a sua doutrina e a sua ação, aos valores evangélicos. Apesar da crise do sagrado entendido em sentido tradicional, portanto, a persistência do humanismo clássico e cristão continuou fecundando a civilização europeia com a sua força vital.
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''No cristianismo, encontram-se as raízes da modernidade.'' Entrevista com Giannino Piana - Instituto Humanitas Unisinos - IHU