O amor envelhece? Porque os casais se separam depois dos 60 anos

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21 Novembro 2025

"Fizemos sacrifícios juntos ao longo de toda a vida. Compramos uma casa. Nossos dois filhos se formaram e encontraram bons empregos. Superamos problemas de saúde significativos. E agora que ambos chegamos à idade da aposentadoria, poderíamos estar juntos com alguma tranquilidade, descubro que ela procurou um advogado porque quer a separação. Com quase 70 anos, temos mesmo que nos separar? Não, é um golpe muito duro. Não sei se vou aguentar." Essa é a história de Franco, um diretor industrial de Brescia, que encontramos no escritório de advocacia de Milão onde ele pediu ajuda. Nossa investigação para entender o que existe na raiz do sempre desconcertante e às vezes absurdo fenômeno do "divórcio grisalho" parte disso. Do sofrimento de um homem que não entende o que está acontecendo com ele, por que sua esposa decidiu mudar de vida, por que, após 38 anos de casamento, com todos os altos e baixos de qualquer relacionamento, tudo tem que acabar. Tantas incógnitas e tantas esperanças, evidentemente, quando vistas pelos olhos dela. Tantas incógnitas e tanto desespero para ele.

A reportagem é de Luciano Moia, publicada por Avvenire, 16-11-2025. A tradução é de Luisa Rabolini

Franco é, de certa forma, o símbolo doloroso de um mundo de cabeça para baixo. Se até algumas décadas atrás a ideia de separação em idade avançada parecia impensável, hoje os dados mostram que casais com mais de 60 anos não estão imunes à instabilidade conjugal. Pelo contrário. E se o imaginário coletivo retratava homens na casa dos 60 anos determinados a enganar a si mesmos e a idade cronológica com mulheres mais jovens, em alguns casos atraídas pelas condições financeiras de seus amantes, hoje são principalmente as mulheres mais velhas que buscam a separação ou o divórcio. E, em muitos casos, talvez na maioria, não é porque existe outra pessoa. Em suma, elas não querem abandonar o caminho antigo porque existe um novo. Quase sempre, não existe nada além do desejo de romper com o passado.

Vamos tentar entender o porquê.

Segundo o advogado Giancarlo Savi, diretor do Observatório de Direito de Família, muitos homens de 60-70 anos sofrem de "abandono afetivo". Antigamente, os aspectos relacionais eram deixados de lado quando se chegava à idade dos cabelos grisalhos. Hoje, as dinâmicas dos relacionamentos mudaram e as pessoas, mesmo em idade mais madura, não parecem mais dispostas a ignorar aspectos tão importantes da vida a dois. "Nos 'divórcios grisalhos' que acompanhei", enfatiza Savi, "sempre encontrei muito sofrimento. Os homens começam a considerar romper com o passado quando percebem que o sentimento predominante em relação a eles é de indiferença. As mulheres estão desgastadas pela rotina, pela repetitividade pela falta de perspectivas.

Naturalmente, estamos falando de casais que se arrastaram ao longo dos anos, que acumularam tantas incompreensões e muito mal-estar. Mas também existem os casos extremos." Como aqueles que acabam diante de um juiz, às vezes com pedidos de interdição e ressarcimentos. Felizmente, nem todos os casais idosos que se divorciam vivenciam um conflito tão desastroso. Pelo contrário, em 8 de cada 10 casos, o "divórcio grisalho" termina sem recorrer a um juiz. Ainda que a decisão consensual não signifique que pelo menos uma das partes não esteja passando por uma situação de profunda desorientação diante de uma decisão que não só lhes foi imposta, como muitas vezes nem sequer era inimaginável.

Segundo a advogada Ofelia Grazia Cesaro, especialista em direito de família, ex-diretora da Vara Criminal da Infância e Juventude e autora do livro Ballare sotto la pioggia. Famiglie, separazioni e rinascite (Feltrinelli), trata-se, em todo caso, de uma fase muito delicada, com repercussões profundas. "As pessoas já não pensam mais em envelhecer juntas", explica ela, "mas sim em replanejar suas vidas sem o parceiro ou a parceira de longa data. Por quê? Muitas vezes, por trás dessas histórias, escondem-se anos de decepções e dificuldades. Muitos casais vivenciaram a vida conjugal como uma corrida de obstáculos. Primeiro o nascimento dos filhos, depois a carreira, depois a compra de uma casa maior, depois os filhos saindo de casa. Em certo ponto, a ideia de se ver sozinhos como casal, sem mais objetivos a enfrentar, torna-se insuportável. A satisfação de envelhecer juntos já não basta mais; buscam-se outros estímulos. E a ilusão de poder buscar outra vida, longe do parceiro ou da parceira de toda a vida, toma corpo”. As dificuldades não faltam. Além dos aspectos éticos, o trabalho dos advogados nesses casos é muitas vezes direcionado à proteção do cônjuge economicamente mais vulnerável. Porque, exceto por alguns casais abastados, o divórcio na terceira idade geralmente se traduz em uma piora da situação econômica de um dos parceiros. E, na idade da aposentadoria, com a perspectiva de despesas em saúde significativas, a incerteza econômica nunca é um fator reconfortante.

Os números e as causas

Mas, estatisticamente, quantos são os divórcios acima dos 60 anos? Em aumento vertiginoso em todo o mundo ocidental. Nos Estados Unidos, dobraram desde 1990. Na Itália, o ISTAT confirma: entre 2013 e 2023, aumentaram quase 60%. Em números absolutos, isso significa um salto de 3.692 divórcios em 2013 para 9.913 em 2021. Esse aumento não pode ser ignorado e levanta muitas questões sobre o que está mudando na dinâmica dos casais mais idosos. Um estudo do Eurostat indica que, entre 2005 e 2020, o número de divórcios entre pessoas com mais de 50 anos aumentou em quase todos os países da União Europeia, com picos na Alemanha, França e Suécia. Claramente, há muitas causas para um fenômeno que, de certa forma, condensa o pior aspecto das transformações socioculturais da nossa época. As pessoas estão se casando muito mais tarde, vivendo mais e, ao atingirem a idade da aposentadoria, muitos casais esperam viver mais 20 ou 30 anos. Por que fazer isso com o mesmo cônjuge se décadas de incompreensões e desgaste, de comunicação difícil e tensões de relacionamento estão por trás? Desbloqueamos o direito à felicidade — inclusive sexual — em qualquer idade e a qualquer custo. Então, por que continuar a perseguir a ideia de amor para sempre se esse amor é considerado um fardo pesado, já desprovido de atração e conteúdos? Essas são reflexões amargas, mas precisam lidar com a realidade, sem ilusões e sem romantismo.

Nos últimos anos, por exemplo, refletimos frequentemente sobre os efeitos nocivos das mídias sociais nos adolescentes, mas nunca nos perguntamos qual o impacto dos sites de namoro online e das redes sociais nas pessoas mais idosas. Em que medida foi determinante para casais que já consideravam seu casamento insatisfatório a possibilidade de conhecer novas pessoas online e a perspectiva de um novo relacionamento, mesmo na terceira idade? Essas são perguntas que, pelo menos no plano estatístico, ainda não encontram resposta. Mas é fácil imaginar que as consequências dessas transformações tenham pesado e continuam a pesar na alimentação de ilusões e sonhos de mudança que, na maioria dos casos, não lidam nem com a realidade ou com o registro civil.

Proibido generalizar

Claro, a casuística dos "divórcios grisalhos" é quase infinita, e seria errado generalizar. A advogada Cinzia Calabresi, especialista em direito de família e por muito tempo membro da Comissão de Igualdade de Oportunidades da Ordem dos Advogados de Milão, destaca que também existem decisões que, de certa forma, refletem escolhas de justiça. "Há divórcios em idade avançada que resolvem situações pregressas de longa data. Isso acontece com casais que eram apenas unidos formalmente porque ambos já viviam histórias paralelas. O fato de o casal ter decidido se divorciar somente após a aposentadoria pode ser devido, por um lado, ao respeito pelos filhos e, por outro, ao desejo de não convulsionar as suas vidas quando ambos ainda estavam absorvidos com tantos compromissos, a começar pelo trabalho."

As estatísticas, ressalta Calabresi, também incluem divórcios que completam separações decididas há 20 ou 30 anos. A separação, na verdade, não aconteceu aos 70 anos ou mais, mas havia sido decretada há muito tempo. "Mas não devemos pensar que os sentimentos deixam de importar depois de certa idade. O amor não acaba, assim como não acabam ciúmes e rivalidades." continua Calabresi. "Recentemente, acompanhei uma senhora de 85 anos que estava entrando com um pedido de separação por acreditar que seu marido, da mesma idade que ela, a estava traindo. Ela estava decidida a deixá-lo, mas consegui convencê-la de que era apenas um mal-entendido e conseguimos evitar o desastre."

Mas para cada caso que termina bem, existem dezenas de outros que, mesmo que os cônjuges já estejam idosos, acabam diante do juiz. Na vasta gama das motivações que levam um casal a se separar após um longo casamento, a traição e a infidelidade ainda figuram com destaque.

Já mencionamos o papel das mídias sociais, que são cruciais para reencontrar paixões da juventude e "antigos amores". Aqui, entra em ação o costumeiro, confuso desejo de recuperar o tempo perdido e apagar os anos que se foram. Numa época como a nossa, em que o tabu do divórcio já caiu há tempo e em que nada parece inapropriado, quando a história de um casal já parece frágil, o desejo de começar uma nova história torna-se quase uma escolha natural. "Talvez, mais simplesmente", argumenta o advogado Alessandro Simeone, presidente da AIAF Lombardia (Associação de Advogados para os Menores e a Família), "estejamos lidando com pessoas que anseiam encontrar aquela felicidade de casal que lhes escapou a vida toda. Conheci muitos casais que estavam totalmente absortos nos cuidados dos filhos. Na verdade, o casal havia desaparecido, e eles estavam juntos apenas para serem pais. E quando os filhos saíram de casa, aquela mulher e aquele homem se perguntaram por que ainda estavam juntos. Numa sociedade como a nossa, profundamente transformada, não me surpreende que essas pessoas ainda queiram procurar a felicidade e se convençam de que o único caminho possível é fazê-lo com um novo parceiro, ou nova parceira, ou até mesmo sozinhos, aos 60 ou 70 anos”.

Não se deve esquecer, frisa o especialista, que os "jovens idosos" de hoje, que procuram novas perspectivas para além do casamento que deixaram para trás, são os filhos da revolução afetiva dos anos 1970. Estão já imersos, em suma, na ideia de uma sociedade líquida que pôs em crise valores e costumes do passado. Muitas vezes, porém, dizemos isso sem termos encontrado formas realmente originais e satisfatórias de os substituir por algo que realmente valha a pena ser vivido. "Mas se o ‘divórcio grisalho’ significa instabilidade permanente, fragmentação afetiva e incerteza relacional mesmo em idade avançada, não é uma ‘normalidade’ social à qual quero me resignar", conclui o amigo Franco, diretor industrial, ainda à espera no escritório de advocacia. Nós também não. Pais (e avós) separados.

Um terremoto para a família

O impacto do divórcio ou da separação dos pais nos filhos em idade escolar ou naqueles adolescentes é o foco de inúmeros estudos. Decidir se separar quando os filhos ainda são pequenos pode levar — entre outras consequências — a fragilidades e inseguranças, pode influir no equilíbrio psicológico e físico, pode se traduzir numa queda no desempenho escolar, pode tornar a esfera emocional mais instável e impactar negativamente o relacionamento entre pais e filhos, mas também a rede alargada dos parentes e amigos. Embora separações e divórcios sejam hoje considerados uma escolha "normal" da vida de casal, as consequências sofridas por crianças e adolescentes ainda são numerosas e, com mais frequência do que se imagina, podem levar a situações preocupantes.

Esse risco é bem conhecido por psicólogos e neuropsiquiatras infantis, e já o aprofundamos várias vezes em nossas páginas. Menos conhecidas, aliás, quase totalmente ignoradas em nosso país, são as consequências do chamado "divórcio grisalho". Por que se preocupar, alguém poderia pensar, visto que os filhos de casais mais idosos que decidem mudar de vida agora são adultos, com 35 a 40 anos ou mais, e na maioria dos casos já têm seus próprios relacionamentos estabelecidos? Trata-se de uma consideração que não leva em conta um ponto fundamental. Em qualquer idade, os pais continuam sendo figuras de referência insubstituíveis aos olhos dos filhos. E um divórcio decidido pelos pais aos 60-70 anos tem um "efeito sísmico" sobre os filhos adultos, com consequências difíceis de avaliar. Essa afirmação é encontrada em diversos estudos nos EUA, onde o fenômeno do "divórcio grisalho" vem sendo estudado há pelo menos 30 anos, incluindo seu impacto sobre os filhos. Em particular, destaca-se como os efeitos mais negativos recaem sobre os pais, especialmente se a decisão de se divorciar não parte deles. Os relacionamentos quase sempre se interrompem ou, na melhor das hipóteses, sofrem graves repercussões.

Carol Hughes, terapeuta de casais e da família da Califórnia e coautora de "Home Will Never Be the Same Again: A Guide for Adult Children of Gray Divorce" (A casa nunca mais será a mesma: um guia para filhos adultos de um divórcio grisalho, e tradução livre), explicou: "Muitas vezes ouvi filhos adultos dizerem: 'Sinto como se a rocha que era minha família tivesse sido engolida por um terremoto'". Os filhos adultos vivenciam um tipo de sofrimento diferente das crianças e dos adolescentes que testemunham o divórcio dos pais. Há uma consciência mais profunda e uma capacidade mais intensa de se colocar no lugar do pai ou da mãe, com uma série de perguntas que seriam impossíveis para crianças pequenas: "Meus pais foram realmente felizes? Será que resistiram até agora só para não me fazer sofrer? Como foi a qualidade de sua vida conjugal?" Essas são perguntas que nunca encontrarão respostas adequadas, mas que acabam transferindo nos filhos pensamentos angustiantes e sentimentos de culpa.

Há casais que tiveram relacionamentos extremamente conflituosos ao longo da vida, dos quais os filhos foram testemunhas e sofreram. Nesses casos, a primeira reação pode ser de alívio: "Ainda bem que vocês se decidiram, deveriam ter feito isso muito mais cedo." Mas essa atitude é quase imediatamente deixada de lado para dar lugar à preocupação com o futuro dos pais e a questionamentos sobre a possível felicidade deles quando estiverem sozinhos. Nos conflitos assimétricos, quando um dos pais é emocional e financeiramente mais frágil, a escolha dos filhos é imediata. Eles ficam do lado desse pai ou mãe, oferecendo apoio psicológico e até mesmo auxiliando com aconselhamento jurídico. Essas escolhas quase sempre determinam uma deterioração do relacionamento com o outro genitor. É fácil entender o porquê. As relações entre pais e filhos mudam ao longo da vida, seguindo uma trajetória mais ou menos linear. Mas, quando os pais idosos se divorciam, essa evolução é abruptamente interrompida. Os filhos, se também vivem como casal, acabam se questionando. Os que ainda são noivos questionam a escolha que estão fazendo, começam a duvidar da própria capacidade de estabilidade emocional e encaram o relacionamento que estão construindo com crescente preocupação: "Se aconteceu com a mãe e o pai, por que não poderia acontecer comigo?". Em suma, de qualquer lado que se olhe, o "divórcio grisalho" parece uma escolha devastadora, repleta de incertezas. Vale a pena?

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