19 Abril 2024
Este ano, a gigante tecnológica do Vale do Silício assinou um acordo de colaboração com Israel que, segundo os seus próprios trabalhadores, pode aumentar a videovigilância e a seleção de alvos militares através do Google Photos.
A reportagem é de Pablo Elorduy, publicada por El Salto, 14-04-2024. A tradução é do Cepat.
É oficial: o exército israelense utiliza a infraestrutura do Google. Depois de negá-lo aos seus trabalhadores e à opinião pública, as informações reveladas na sexta-feira pela revista Time confirmaram as denúncias, que realçaram, há pelo menos três anos, que a gigante do Vale do Silício continuou negociando com as Forças de Defesa de Israel (FDI) para fornecer mais ferramentas que são supostamente utilizadas para a localização e identificação de alvos por parte do regime sionista.
O documento revelado pela revista estadunidense detalha que as FDI possuem sua própria “zona de aterrissagem” no Google Cloud, a “nuvem” na qual a empresa unifica as informações armazenadas em seus servidores e na qual estão integradas diferentes ferramentas de inteligência artificial e big data.
O aprofundamento da relação entre a empresa estadunidense e o exército israelense permitiu que “múltiplas unidades” das FDI tivessem acesso a estes serviços. Além disso, trata-se de uma ampliação financeira do polêmico Projeto Nimbus, do qual também participa a Amazon Cloud, anunciado em 2018 e por meio do qual, desde 2021, Israel recebe tecnologia para uso militar e civil. O próprio Ministério das Finanças israelense garantiu naquele ano que o Nimbus seria usado pelas FDI e gabou-se de que o Google teria pouca margem para limitar ações com suas ferramentas. O acordo, de mais de 1,2 bilhão de euros, inclui cláusulas para que o Google não intervenha mesmo que a pressão dos cidadãos o leve a querer fazê-lo.
O fato de esta nova oferta de ferramentas ter sido reconhecida confirma o possível envolvimento do Google na rede de reconhecimento facial em toda a Faixa de Gaza, noticiada por Sheera Frenkel em outro meio de comunicação americano, o New York Times, através da qual se está fazendo o escaneamento de palestinos comuns à medida que se deslocam pelo devastado território. O meio de comunicação especializado The Intercept amplia as informações sobre a nuvem fornecida a Israel, e como ela lhe daria “capacidades para a identificação facial, a categorização automatizada de imagens, o rastreamento de objetos e inclusive a análise de sentimento que visa avaliar o conteúdo emocional de imagens e discursos”.
Embora não haja confirmação oficial de que a tecnologia do Google Cloud esteja sendo utilizada para esses fins, o fato é que, no âmbito do Nimbus, a empresa estadunidense quase não tem condições de controlar o que é feito com suas ferramentas e isso apesar de, em seus próprios termos de responsabilidade corporativa, o Google proibir o uso de sua ferramenta fotográfica “para promover atividades, bens, serviços ou informações que provoquem danos graves e imediatos às pessoas”.
As informações revelaram que o sistema de reconhecimento estava baseado em tecnologia fabricada pela empreiteira israelense Corsight e outra que capta imagens subidas para o Google Photos. Os agentes da Unidade 8200 do exército israelense, da Inteligência, subiram as bases de dados de “suspeitos” na ferramenta do Google, a partir da qual usaram uma função de busca para localizar pessoas.
Uma delas foi o poeta Mosab Abu Toha, que foi parado num bloqueio de estrada e espancado, no que mais tarde foi apresentado como um erro de identificação das FDI.
As ações do Google têm sido duramente criticadas por um número crescente de funcionários da empresa. Organizados no movimento No tech for Apartheid (Não às Tecnologias para o Apartheid), as denúncias vêm acontecendo desde a aprovação do programa Nimbus. A acusação inicial, que deu nome ao grupo, enfatizava que o Google e a Amazon estão fazendo negócios com o apartheid: “Ao expandir a capacidade de computação em nuvem pública e fornecer a sua tecnologia de ponta ao governo e às forças armadas israelenses, a Amazon e o Google estão ajudando a tornar o apartheid israelense mais eficiente, mais violento e ainda mais mortal para os palestinos”, afirmou este grupo de programadores e funcionários ligado à alta tecnologia. Estima-se que, além dos simpatizantes, o grupo seja formado por mais de 200 funcionários do Google.
Em 2021, um grupo de programadores judeus do Google (jewglers) denunciou que o acordo permitiria à empresa ajudar a construir centros de dados e fornecer infraestrutura em nuvem “para várias agências governamentais israelenses, incluindo o Exército de Israel, e a Autoridade de Terras de Israel, que é a agência responsável por roubar mais terras palestinas para assentamentos ilegais israelenses”. A carta é assinada por 500 trabalhadores que preservaram o anonimato por medo de represálias.
Uma das programadoras, Ariel Koren, foi demitida por causa dessa carta, o que gerou os protestos de mais uma centena de funcionários da gigante da tecnologia. Koren escreveu um artigo no qual detalha as circunstâncias do assédio que sofreu até ser demitida: “O Google silencia sistematicamente as vozes palestinas, judaicas, árabes e muçulmanas preocupadas com a cumplicidade do Google nas violações dos direitos humanos na Palestina, a ponto de praticar retaliações formais contra os trabalhadores e criar um clima de terror”.
Já após o início da campanha de extermínio liderada por Israel desde o dia 7 de outubro de 2023, os protestos entre os funcionários do Google deram origem a episódios relevantes. O mais conhecido foi um protesto do funcionário Eddie Hatfield durante uma conferência do CEO do Google Israel, Barak Regev, em Nova York, no dia 4 de março. Hatfield foi demitido e em solidariedade dois outros trabalhadores pediram demissão.
Na terça-feira, dia 16, os funcionários do Google estão programados para participar de três concentrações simultâneas em frente às sedes da empresa em Nova York, Seattle e Sunnyvale, no Vale do Silício, na Califórnia: “Agora é a hora de nos levantarmos contra o Projeto Nimbus, em apoio à libertação da Palestina, e unir-nos aos apelos para acabar com a ocupação israelense e o genocídio dos palestinos em Gaza. Isso nunca foi tão urgente”, diz a convocatória.
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Protestos entre empregadas das big tech diante da cumplicidade do Google com o genocídio israelense na Palestina - Instituto Humanitas Unisinos - IHU