17 Novembro 2022
"Enquanto as nações se reúnem em Sharm El-Sheikh, no Egito, os principais cientistas climáticos compartilham um novo relatório para apoiar políticas mais eficazes", escreve Meghie Rodrigues, escritora de Ciências, em artigo publicado por EcoDebate, 16-11-2022. A tradução e edição são de Henrique Cortez.
Um novo relatório visa adicionar mais suporte científico à vasta literatura acadêmica que apoia a discussão de políticas na Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP27) deste ano. O relatório, “10 New Insights in Climate Science”, foi divulgado pela Future Earth, The Earth League e pelo World Climate Research Programme. Ele complementa os relatórios científicos emitidos pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), de acordo com Mercedes Bustamante, membro do conselho editorial do relatório.
“Ao contrário dos relatórios do IPCC, que não são prescritivos de políticas, o relatório Insights é direcionado abertamente aos formuladores de políticas – não apenas nos governos nacionais, mas também nas esferas local e regional, bem como nos setores privado e financeiro”, disse Bustamante, coautora do IPCC e pesquisador de ecologia de sistemas da Universidade de Brasília, no Brasil.
“O relatório é baseado em novos conhecimentos que surgiram nos últimos 12 meses… Começamos após a COP a cada ano e o processo segue até a COP seguinte”, explicou Wendy Broadgate, diretora global do hub da Future Earth e membro do conselho editorial do relatório.
O relatório deste ano inclui a experiência de mais de 60 pesquisadores de todo o mundo, bem como de outros 15 do conselho editorial. “E prestamos muita atenção aos equilíbrios de especialização, gênero e geografia entre os autores”, acrescentou Broadgate.
Da adaptação ao financiamento, aqui estão as conclusões deste ano:
Em muitas partes do mundo, sociedades e ecossistemas já estão enfrentando limites para a adaptação às mudanças climáticas. “À medida que as temperaturas globais aumentam, as respostas adaptativas tornam-se menos eficazes”, escrevem os autores, e mesmo medidas de adaptação eficazes não serão capazes de evitar todas as perdas e danos. Os esforços de mitigação, dizem os autores, são “críticos para evitar a violação generalizada dos limites de adaptação”, e planos de adaptação ambiciosos são urgentes.
Os países mais vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas têm uma taxa de mortalidade causada pelo clima 15 vezes maior do que os países menos vulneráveis, observam os autores. Hoje, cerca de 1,6 bilhão de pessoas vivem em áreas altamente vulneráveis na África, Ásia, América Central e Oriente Médio – e espera-se que esse número dobre até 2050. “Essas regiões estão sujeitas a múltiplas fontes de estresse e têm menos capacidade de resposta, pois a fragilidade ambiental se funde com a vulnerabilidade social”, disse Bustamante. Priorizar os acordos internacionais que protegem os sumidouros de carbono e os pontos quentes da biodiversidade é uma das maneiras de lidar com o problema, escrevem os autores.
A mudança climática já está afetando a saúde humana, animal e ambiental em todo o mundo e é responsável por quase 40% das mortes relacionadas ao calor no mundo. Continuará a aumentar os incêndios florestais e os surtos de doenças transmitidas pela água e por vetores. Os países devem considerar o custo da inação e reajustar seus orçamentos para garantir que possam enfrentar as vulnerabilidades climáticas e de saúde e investir em prevenção adequada, sugerem os autores.
Eventos climáticos extremos já estão forçando grupos vulneráveis a se deslocarem pelo mundo, e a migração aumentará à medida que as comunidades perderem sua capacidade de adaptação. Os autores sugerem que os formuladores de políticas passem de uma resposta reativa (lidando com as emergências depois que elas ocorrem) para uma abordagem antecipatória, que envolve planejamento e gerenciamento de longo prazo.
A mudança climática pode desencadear violência ao aprofundar conflitos e vulnerabilidades já existentes. A invasão russa da Ucrânia, escrevem os autores, revelou vulnerabilidades alimentares e energéticas associadas à dependência de combustíveis fósseis. Os autores sugerem que são necessárias respostas escalonadas ao conflito, envolvendo instituições regionais, nacionais e internacionais.
O desmatamento associado à agricultura é um dos principais contribuintes para a mudança climática, enquanto, ao mesmo tempo, os efeitos de uma mudança climática estão colocando em risco a atividade agrícola. Políticas nacionais eficazes que apoiam a transição para práticas de gestão de terras mais sustentáveis e resilientes estão entre as principais ações para um uso mais inteligente e melhor da terra, sugere o relatório.
A maioria das práticas financeiras sustentáveis de hoje, apontaram os autores, são muito familiares: o capital é usado dentro dos modelos de negócios existentes, em vez de ser usado de maneiras novas e eficazes para enfrentar a mudança climática. O setor financeiro simplesmente não está se movendo na velocidade que o mundo precisa para ter uma ação real sobre a mudança climática. Uma maneira pela qual os tomadores de decisão podem abordar a questão, sugere o relatório, é desenvolver políticas e regulamentos fortes que exijam “altos níveis de transparência e precisão no relato das emissões associadas a investimentos, poupança e atividade econômica”.
Como a infraestrutura é ameaçada por eventos extremos e as regiões cedem território ao aumento do nível do mar, as perdas e danos associados às mudanças climáticas já são uma realidade em muitas partes do mundo. Algumas perdas, apontam os autores, podem ser calculadas em termos monetários, mas “há também perdas e danos não econômicos que precisam ser melhor compreendidos e contabilizados”. O relatório sugere que o mundo desenvolva uma resposta política global coordenada para o desafio.
Como a mudança climática afetará todos os indivíduos de uma forma ou de outra, todos devem ter voz nas escolhas que afetarão seu futuro. A tomada de decisão inclusiva, escrevem os autores, “demonstrou levar a resultados climáticos melhores e mais justos”. Políticas de apoio ao desenvolvimento, avaliação e expansão de iniciativas lideradas pela comunidade são formas eficazes de abordar a justiça climática.
A lacuna entre as promessas nacionais e as reduções de emissões exigidas pelo Acordo de Paris está aumentando, alerta o relatório. O mundo está preso a normas sociais que priorizam o consumo contínuo e a modelos de negócios que privilegiam a produção ininterrupta. Uma das maneiras de romper com essas barreiras estruturais, segundo o relatório, é criar e implementar instrumentos legais para lidar com a desigualdade e a injustiça.
RODRIGUES, M. (2022), 10 science insights for COP27, Eos, 103, disponível aqui.
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Conhecimentos científicos para ações mais eficazes na COP27 - Instituto Humanitas Unisinos - IHU