04 Novembro 2022
Uma viagem semelhante até alguns anos atrás seria inimaginável, especialmente devido às circunstâncias. O Papa Francisco coloca os pés no riquíssimo reino do Bahrein, um arquipélago formado por 33 ilhas em frente à Arábia Saudita, onde acaba de ser inaugurada, no meio do deserto, a maior catedral católica de todo o Golfo e onde os Estados Unidos têm uma das maiores bases militares da região. Quando foi consagrada em dezembro passado, o cardeal filipino Luis Antonio Tagle a definiu como de "um oásis de graça viva", embora já existisse uma pequena igreja construída em 1939. São apenas 80.000 cristãos - principalmente imigrantes filipinos e indianos - em uma população de 1,2 milhão de pessoas, e gozam de relativa liberdade de culto e não são perseguidos, ao contrário do que é reservado aos muçulmanos xiitas.
A reportagem é de Franca Giansoldati, publicada por Il Messaggero, 03-11-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
A minoria sunita (24%) à qual pertencem a classe dominante e a casa real, além de deter o poder, exerce pesada discriminação contra a maioria xiita acusada de ser controlada remotamente pelo Irã e tornar toda a região instável. Em 2011 - na onda da Primavera Árabe - houve extensos protestos em todo o reino. A chamada Revolta das Pérolas - animada por xiitas - nasceu para pedir justiça e democracia. A revolta, no entanto, foi reprimida com sangue com o apoio dos militares sauditas e dos Emirados (também sunitas). Naquele contexto, várias mesquitas xiitas foram destruídas e os revoltosos acabaram presos sob a acusação de terrorismo e de serem fomentados por Teerã, arqui-inimigo do reino do Bahrein e do rei Hamad Bin Isa al Khalifah. A comunidade xiita espera que o Papa Francisco possa se tornar emissário de uma mensagem ao rei para a libertação de vários prisioneiros.
O país tem uma importância estratégica nos equilíbrios políticos da região: não apenas por sua localização geográfica no Estreito de Ormuz, por onde passa 20% do petróleo mundial, mas por abrigar uma das maiores bases navais estadunidenses. Nesse contexto, amadureceu a normalização das relações diplomáticas com Israel em setembro de 2020 com a assinatura dos Acordos de Abraão – mediados pelos Estados Unidos na época do governo Trump – aos quais também aderiram Emirados Árabes Unidos, Egito e Marrocos.
O Papa Francisco será convidado pessoal do rei Hamad Bin Isa al Khalifa e ficará alojado em um edifício real. A principal razão para esta visita de quatro dias (o retorno a Roma está previsto para 6 de novembro) é o fórum sobre o diálogo das religiões que o rei do Bahrein promove periodicamente para incentivar as relações entre as diferentes religiões (exceto depois perseguir sistematicamente os xiitas). Em 4 de novembro, o Papa Francisco concluirá o Fórum Bahrain para o Diálogo: “Oriente e Ocidente para a Coexistência Humana"e, nesse cenário, também haverá um encontro com Al Tayyeb, o Grande Imã da Universidade de al Azhar, a maior centro de teologia sunita localizado no Cairo. Trata-se de seu sexto encontro e já se estabeleceu um bom entendimento humano entre os dois, tanto que se chamam de “irmãos”, se abraçam, ligam e trocam informações. Um acordo sobre a Fraternidade foi assinado com Al Tayyeb em 2019, nos Emirados Árabes Unidos. Um documento do Vaticano que fortalece o diálogo com o Islã e neutraliza – em perspectiva – os riscos de um choque entre civilizações. Dentro da Igreja, o documento há muito é criticado por ter omitido a declaração Dominus Jesus, emitida pelo então Papa Bento XVI, com a qual se reafirmava a unicidade e universalidade salvífica de Jesus Cristo e da Igreja.
Francisco será o primeiro pontífice da história a visitar o Bahrein na esperança de consolidar os laços com o Islã. O pontífice fez da aproximação com as comunidades muçulmanas uma prioridade durante seu pontificado, visitando vários países do Oriente Médio. Jordânia, Turquia, Bósnia-Herzegovina, Egito, Bangladesh, Marrocos, Iraque e mais recentemente, em setembro, Cazaquistão.
No programa oficial está previsto também um encontro com o “Conselho Islâmico dos Anciãos”, criado em 2014 para promover a paz na comunidade muçulmana.
O Papa também celebrará uma missa em um estádio na segunda cidade do Bahrein, Riffa, diante de 28.000 fiéis. Lá, está prevista uma homilia em espanhol para atender os muitos imigrantes.
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Papa Francisco parte para o Reino do Bahrein, o motivo pelo que ele quer retornar ao Golfo novamente - Instituto Humanitas Unisinos - IHU