14 Outubro 2022
Kevin é um detento, Victoria uma prostituta. Eles nunca imaginariam ouvir a seguinte pergunta de um teólogo: "O que você tem a dizer a Deus e à Igreja?". A confusão crescia a cada pergunta subsequente: "Quem é Deus?", "O que é o pecado?", "Quem é Jesus?".
No entanto, eles não recuaram. Aliás, as palavras jorraram radicais e profundas, às vezes surpreendentes, mas nunca erradas e sempre capazes de capturar um fragmento do Evangelho. O mesmo aconteceu todas as vezes que a experiência foi repetida, nos últimos meses, em quarenta cidades do planeta, de Milão a Chicago, de Santiago a Manila. Sinal de que realmente os "marginais" são lugar teológico e, portanto, sujeito da teologia. Como escreve o Papa Francisco na “Evangelii gaudium”: “Somos chamados a acolher a misteriosa sabedoria que Deus quer nos comunicar através deles”.
A reportagem é de Lucia Capuzzi, publicada por Avvenire, 13-10-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Essa consciência deu origem à inédita pesquisa internacional "Fazer teologia a partir das periferias existenciais, promovida pela seção "Migrantes e Refugiados" do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral: ontem os resultados do projeto foram apresentados durante uma conferência na Pontifícia Universidade Urbaniana de Roma da qual participaram, entre outros, os Cardeais Michael Czerny e Louis Antonio Tagle e a Irmã Nathalie Becquart.
“Estamos vivendo, como o Pontífice nos lembra muitas vezes, uma mudança de época. A teologia, no entanto, está tendo dificuldades para acompanhar esse tempo. Para ligá-la mais à missão, fizemos uma inversão de perspectiva: partimos das vozes de homens e mulheres, não dos livros porque, como ensina o Concílio, a escuta da fé nutre a teologia. E fomos para os “periféricos”: aqueles descartados pelo sistema socioeconômico, mas também aqueles que normalmente não são ouvidos pela Igreja”, explica Dom Sergio Massironi, diretor da pesquisa, da qual participaram cerca de noventa teólogos, organizados em grupos continentais.
A ideia, nascida entre maio e junho de 2021, se concretizou em janeiro passado com um programa piloto em Barcelona, coordenado pela monja beneditina Teresa Forcades. De lá se disseminou pelo mundo. "Depois de ter formado as equipes regionais e escolhido cerca de quarenta cidades, identificamos dez temas de aprofundamento, a partir da releitura de "Evangelii gaudium","Laudato si'" e "Fratelli tutti" e o que os teólogos já havia escrito a respeito.
São questões cruciais para a teologia atual: da relação entre vulnerabilidade e ternura, à relação entre esperança e confiança, do abandono do clericalismo, ao papel dos cristãos na vida pública e sua consciência ecológica. A escuta se dividiu em duas modalidades: a entrevista longa semiestruturada e os grupos de reflexão temática”, ressalta Dom Massironi. Da análise das transcrições de mais de quinhentas conversas, nasceram as primeiras interpretações, sistematizadas em sínteses continentais.
“Encontramo-nos diante de verdadeiras pérolas que mudaram o nosso olhar. Foi muito forte escutar de quem parece ter fracassado como a vida é uma bênção, como pode ser importante a liturgia ou que sede existe de ministérios femininos, que manifestam o rosto materno da Igreja”. Dois pontos fixos emergem fortemente. A credibilidade da Igreja está cada vez mais baseada em sua capacidade de não deixar ninguém de fora, ou seja, de não rejeitar, com a doutrina e com os fatos.
O maior drama a ser enfrentado em todo o mundo nas vozes dos pobres é aquele do clericalismo. "Assiste-se quase a um ‘cisma’ entre as preocupações do clero e a vida real do povo de Deus. Padres e bispos parecem cada vez mais assoberbados e concentrados em questões administrativas e doutrinais, enquanto os fiéis, muito mais conscientes e maduros do que se acredita, se sentem abandonados e incompreendidos em relação às circunstâncias em que devem se virar todos os dias, que é como se na Igreja e na pregação não entrassem”.
Enquanto isso, os resultados iniciais do projeto já estão dando uma sacudida evangélica à teologia e despertando o interesse até de muitos não crentes. E esse é apenas o primeiro passo. Tornar-se-á uma área de pesquisa teológica estável dentro do Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral e os resultados desse projeto serão compartilhados com a secretaria do Sínodo, para que a voz dos pobres possa participar do caminho sinodal.
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A teologia na escola dos últimos. Mais perto das pessoas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU