06 Outubro 2021
Salvar a Fraternidade - Juntos, o apelo de dez teólogos e teólogas (aqui), sob a égide de Mons. Vincenzo Paglia e Dom Pierangelo Sequeri, é uma forma de “estar presente no próprio tempo”. Ou seja, é uma forma de dizer que “a fraternidade é uma experiência de encontro e abertura, enquanto o mundo é feito de muros, portas fechadas, arame farpado, tendência a se fechar diante do outro”.
As citações são, respectivamente, da filósofa Laura Boella e do psicanalista Massimo Recalcati. No dia 1º de outubro, coordenados pela teóloga Isabella Guanzini, participaram de um debate público (Roma, sede do Pontifício Instituto Teológico João Paulo II, de Latrão) no qual compareceram 35 pessoas (capacidade máxima em atenção às normas sanitárias) e mais de 260 conectadas, foram discutidas as implicações do próprio apelo (para rever o debate: aqui).
A reportagem é de Fabrizio Mastrofini, publicada por Settimana News, 05-10-2021. A tradução de Luisa Rabolini.
Apresentando os trabalhos, Mons. Vincenzo Paglia, presidente da Pontifícia Academia para a Vida, destacou que com esse encontro se abre o diálogo com os "Sábios", isto é, com os intelectuais do nosso tempo.
O apelo pede a eles um suplemento de diálogo, para que a fraternidade, sob o impulso da encíclica do Papa Francisco, se torne a cifra do nosso tempo, a realização daquela "promessa fracassada" do Iluminismo. E, sobretudo, se torne a cifra de um novo "humanismo", para "redescobrir o humano comum".
E Massimo Recalcati colocou o tema do humanismo no centro de sua apresentação. O humanismo, ressaltou Recalcati, vai na contramão do antropocentrismo dominante, aliás, da "loucura antropocêntrica" que diviniza a liberdade individual, o culto da economia e do dinheiro, a exploração indiscriminada de pessoas e recursos.
Porque as pessoas "são nomes, não números". E como ressalta Lacan - disse - “o amor é sempre amor pelo nome; não é amor por um genérico e indiscriminado conceito de 'vida', mas é amor por aquele nome concreto”.
Laura Boella em sua participação partiu do "fracasso" dos intelectuais do século XX, a "armadilha" em que muitos caíram foi a de não serem verdadeiros pensadores livres. Eram “pensadores de pertencimento político, partidário e ideológico. Estavam em sintonia com um partido ou uma ideologia, não intelectuais em si mesmos”. O mesmo não aconteceu com as mulheres do século XX, de Hannah Arendt a Edith Stein e Simone Weil, que, em vez disso, interpretaram em sentido pleno uma forma de "estar em seu próprio tempo" sem se alinhar com a "corrente dominante da época".
“Interpretaram plenamente um empenho de presença ativa. Um intelectual ajuda a pensar se expressa a ideia de que o que acontece fora de mim não me esmaga e não me deixa indiferente, conseguindo encontrar espaços de pensamento e ação”. Desta forma, os intelectuais interpretaram positivamente aquele ideal de "estar presente no meu tempo" e de "presença" em positivo, somo é expresso nas obras de Jeanne Hersch (1910-2000), uma filósofa de origem judia-polonesa que refletiu longamente sobre o tema liberdade e dos direitos humanos, professora nos EUA e por trinta anos em Genebra.
Recalcati reiterou a importância de uma perspectiva psicanalítica, interior, na abordagem do tema da fraternidade. “O ódio é mais antigo do que o amor, porque o estrangeiro é o mundo, fonte de perturbações, e nos faz entrar em uma atitude de defesa. O outro é o 'não-todo’, o 'não-eu', e o encontro é difícil, a fraternidade é difícil como mostra a Bíblia, onde a relação com os irmãos é sempre conflituosa, divisionista”.
Mas como tornar o apelo credível? Fazendo a pergunta, Recalcati destacou que a resposta deve ir na direção do "testemunho": no período do lockdown experimentamos a fraternidade, superando o eu, superando a "eu-cracia". Mas cuidado, acrescentou logo em seguida, porque “um dos nomes da fraternidade é a instituição.
O preconceito populista diz que as instituições são inimigas ou antagonistas da vida. Em vez disso, as instituições tornam a vida em comum possível. E a fraternidade é uma experiência importante: os irmãos nos lembram que não existimos só nós no mundo”. Um tema com o qual Laura Boella concordou: será importante repensar as modalidades da nossa relação com os outros, para trabalhar sobre a empatia, a solidariedade, a fraternidade.
No pano de fundo após o encontro de 1º. de outubro emergiram assim os temas de viver juntos na época do Covid19 e das novas tarefas da teologia, para levar a sério Fratelli tutti.
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Fraternidade: conflitual, mas indispensável - Instituto Humanitas Unisinos - IHU