22 Fevereiro 2019
Escuta e concretude. Nessas duas palavras, tão fáceis de pronunciar quanto difíceis de transformar em prática, girou o primeiro dia dos trabalhos realizados na aula nova do Sínodo. Para confirmar isso, no briefing realizado no final da manhã desta quinta-feira, no Instituto Patrístico Augustinianum, foram os arcebispos de Brisbane, Mark Benedict Coleridge, e de Malta, Charles J. Scicluna, o prefeito do Dicastério para a comunicação, Paolo Ruffini, os jesuítas Federico Lombardi, moderador do encontro, e Hans Zollner, referente do Comitê organizador do encontro, cujas apresentações foram moderadas pelo diretor "interino" da Sala de Imprensa da Santa Sé, Alessandro Gisotti.
A reportagem é de Marco Bellizi, publicada por L'Osservatore Romano, 21 e 22-02-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
Escuta e concretude, portanto. A manhã do primeiro dia dos trabalhos caracterizou-se, além das duas apresentações proferidas pelo cardeal Tagle, e pelo próprio arcebispo Scicluna, pela escuta dos testemunhos das vítimas. Histórias duras, impressionantes. Sem concessões. "Depois de ouvir essas histórias, não podemos continuar a ser os mesmos. Quero antes de tudo agradecer a essas pessoas. Porque é certamente importante - disse o padre Zollner durante o briefing - falar, sim de normas, de procedimentos, mas é igualmente tão importante apropriar-se dessas experiências, entrar nelas para perceber a viva exigência de compromisso para ter certeza de que tudo isso nunca mais volte a acontecer. Esses testemunhos são um apelo à ação comum". Ação concreta, justamente, mas que parte da conscientização de que as feridas pertencem à Igreja, chamada a não desviar o olhar, mas, aliás, a tocar diretamente a dor, como a meditação oferecida pelo cardeal Tagle lembrou na sua apresentação. "Para compreender a magnitude do que aconteceu é preciso ouvir - explicou dom Scicluna - e entender que se está entrando em solo sagrado", aquele do sofrimento, da Cruz enfrentada por Cristo, das feridas “que permanecem em seu corpo mesmo depois de ele ter ressuscitado". Na difícil tarefa de aliviar essas feridas, reiterou monsenhor Scicluna, "o bispo não pode ser deixado sozinho, mas deve enfrentar esse processo junto com a comunidade dos fiéis. Não temos poder coercitivo - continuou ele - nem temos saudade da Inquisição. É por isso que a jurisdição do estado é essencial". Inclusive porque, para alguns tipos de comportamento a serem reprimidos, como a pornografia infantil na internet, os bispos não têm evidentemente nenhuma das ferramentas de investigação que somente um órgão judicial estatal pode ter.
A questão da modalidade de relação entre o bispo e a comunidade não por acaso foi um dos temas que foram abordados no debate, como ilustrado por Paolo Ruffini: em especial, “falamos sobre como oferecer ajuda para Igrejas menores que não têm experiência suficiente com essas questões. Algumas recomendações de caráter procedural foram fornecidas, insistindo no tema da proximidade com as vítimas dos abusos. Alguns sacerdotes podem encontrar-se em posição de escapar da autoridade do bispo, que é limitada, e é por isso que a colaboração com as instituições civis é ainda mais importante". Naturalmente, o padre Lombardi observou, como está expresso pelos 21 pontos de reflexão oferecidos pelo Papa aos participantes do encontro, muito espaço deve ser dado à questão da prevenção e transparência "de modo que exista um acesso fácil" por parte das vítimas às pessoas e instituições aptas a atender as denúncias. Os 21 pontos, além disso, mesmo sendo um ponto de partida, como explicou o padre Lombardi, são um verdadeiro roteiro, que deve se traduzir em ações subsequentes, ainda que que harmonizadas com os diferentes contextos culturais.
O aspecto da diferente percepção do fenômeno dos abusos sexuais é um tema dentro do tema. "Nos discursos desta primeira manhã - disse o arcebispo Coleridge - logo ficou muito evidente qual é a importância das diferenças culturais". Para alguns países, estabelecer o princípio da colaboração entre o Estado e a Igreja é, de certa forma, um passo histórico. O elemento comum, no entanto, tanto na Europa como na América do Norte e na África, é a verificação precisa dos fatos, com a proteção das vítimas e de quem possa ser acusado. "Sou da opinião - disse o monsenhor Scicluna - que, para publicar os nomes dos abusadores, é necessário que as acusações sejam concretas e circunstanciadas. Caso contrário, dá-se vazão a um sistema primitivo", que não é útil para a causa. Menos ainda, acrescentou o prelado, deve-se cair em generalizações: "Não existe uma categoria mais predisposta ao crime do que outras". Como o padre Lombardi explicou, é opinião comum dos participantes do encontro que não exista nenhum nexo entre abusos e celibato dos sacerdotes.
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Os temas do primeiro dia de trabalho foram apresentados durante o encontro com os jornalistas. No solo sagrado do sofrimento - Instituto Humanitas Unisinos - IHU