15 Junho 2018
As alterações ao documento norteador dos bispos dos EUA sobre a abordagem a casos de abuso sexual de menores por membros clero foram aprovadas na quinta-feira, durante a assembleia de primavera dos prelados, marcando a primeira modificação depois de 2011.
A reportagem é de Brian Roewe, publicada por National Catholic Reporter, 14-06-2018. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
Na primeira das seis votações marcadas para o segundo dia de encontro, por 185 a 5, com uma abstenção, os bispos aprovaram uma série de revisões à Carta para a Proteção de Crianças e Jovens (Charter for the Protection of Children and Young People) também conhecida como Carta de Dallas.
A votação marca a terceira vez que os bispos dos EUA fizeram alterações à carta, que foi aprovada pela primeira vez na reunião de primavera dos bispos em junho de 2002, em resposta ao escândalo de abusos clericais após uma enxurrada de relatórios da equipe do Spotlight do The Boston Globe.
As últimas alterações vão alterar o artigo 13 da carta para exigir que todos que estiveram em contato com os menores passem por verificação de antecedentes e ampliar o artigo 6º, que aborda códigos de conduta, para que qualquer pessoa que se encontre na presença de crianças respeite limites e normas de comportamento adequadas. Anteriormente, isso valia apenas para quem tinha contato frequente com os jovens.
Outra mudança deve reafirmar o sigilo da confissão em relação a denúncias de acusações a autoridades públicas. A decisão foi tomada pelo bispo Timothy Doherty, presidente do Comissão para a Tutela de Crianças e Adolescentes, disse que sua origem foi “os últimos desafios e mudanças à inviolabilidade do sigilo confessional”.
Em dezembro, a Comissão Real para Respostas Institucionais ao Abuso Sexual Infantil da Austrália recomendou que a Igreja excluísse exceções das leis de notificação compulsória do que os clérigos ficam sabendo através da confissão.
Outras revisões da Carta de Dallas procurarão promover os meios, mais especificamente canais digitais, pelos quais as acusações possam ser relatadas, adicionar referências ao estudo de causas e contextos do preâmbulo da carta e alterar o período de revisão de dois anos para sete anos.
Grande parte das mais de vinte alterações diz respeito a questões de estilo e linguagem.
As revisões não alteram as Normas essenciais para a política diocesana ao tratar das alegações de abuso sexual de menores por parte de sacerdotes ou diáconos. Desde que foram promulgadas lei da Igreja, quaisquer alterações às normas essenciais, que foram modificadas pela última vez em 2006, exigiriam a aprovação do Vaticano.
As revisões apresentadas aos bispos eram resultado de um processo envolvendo as comissões para a proteção da criança e da juventude; para o clero e a vida consagrada; para assuntos canônicos; o escritório do conselheiro geral; e o Conselho Nacional de Avaliação, o grupo de conselheiros leigos independentes aos bispos na proteção da criança.
Antes do debate de 14 de junho, os bispos puderam sugerir modificações para as revisões propostas desde o final de março até o final de maio. Essas propostas depois eram analisadas pelo comitê de proteção de criança.
Pouco se debateu sobre as revisões: uma única alteração foi sugerida em relação às revisões apresentadas no dia anterior. Michael Jackels, arcebispo de Dubuque, Iowa, perguntou se os bispos deveriam ter recebido uma lista de modificações ou alterações rejeitadas emitida antes da reunião.
"Poderia inspirar alguém a solicitar uma reconsideração", disse.
No primeiro dia de reunião, Francesco Cesareo, Presidente do Conselho Nacional de Avaliação, disse que o órgão apoiava as revisões como foram apresentadas aos bispos no debate e na sessão de retificação.
"Acho que será muito útil para que a carta seja um documento ainda mais forte e também permitirá que a Igreja seja ainda mais eficaz em seus esforços de proteção à criança e assistência às vítimas", relatou ao NCR.
Mais especificamente, mencionou que a expansão da verificação de antecedentes "será muito útil", pois agora todos que mantiverem contato com crianças vão ter que passar por essa avaliação.
Quem critica o modo como os bispos lidaram com a crise de abusos reitera o pedido por uma revisão da carta que coloque sob auditoria as normas essenciais e os bispos envolvidos no encobrimento de abusos no âmbito da política de tolerância zero.
Além disso, o Catholic Whistleblowers, grupo de defesa de vítimas de abuso, escreveu aos bispos em abril pedindo que eles revisassem a carta e incluíssem a obrigatoriedade de as dioceses publicarem os nomes de pessoas com alegações significativas de abuso; a inclusão de auditoria paroquial no processo de auditoria geral e a nomeação de uma vítima para colaborar na coordenação de novos processos de revisão.
Doherty, que é bispo de Lafayette, Indiana, disse, numa conferência de imprensa, que a carta deveria se concentrar no clero e que os bispos, em termos de jurisdição da Igreja, estão sob a Santa Sé.
"Não estamos em posição legal para agir sobre os bispos, de acordo com a lei da Igreja”, afirmou, embora salientasse também ações tomadas pelo Vaticano nos últimos meses em relação a bispos que lidaram com alegações de abuso de forma inadequada.
Cesareo disse que uma revisão que ele gostaria que os bispos fizessem era as auditorias paroquiais. Ele declarou que esperava que, conforme mais dioceses fizessem suas revisões, os bispos as sistematizariam em lei na carta, talvez na próxima revisão.
Na auditoria de 2017, outras 15 dioceses e eparquias fizeram auditorias paroquiais internas ou externas, o que foi um "resultado encorajador" para a comissão de revisão.
Quanto à decisão de realizar o processo de revisão a cada sete anos, Cesareo concorda com Doherty que a implementação das mudanças requer tempo, bem como avaliar seus resultados e aprender com os novos acontecimentos.
Antes de as revisões propostas serem formalizadas, Cesareo apresentou um relatório das etapas de implementação através de uma visão geral da última auditoria anual.
Assim como os relatórios anteriores, a auditoria de 2017 relatou "um senso de complacência" entre cada vez mais dioceses, embora Cesareo tenha observado que a maioria das dioceses está cumprindo as exigências da carta. (Cinquenta e oito de 61 dioceses que estão sendo visitadas estavam seguindo as exigências, assim como 133 participantes da coleta de dados.)
"Não há espaço para complacência nesta luta para proteger nossas crianças, jovens e adultos mais vulneráveis", disse Cesareo.
Para ele, apesar dos progressos realizados na implementação de protocolos de prevenção de abuso, muitos católicos e outras pessoas ainda questionam o comprometimento da Igreja - e principalmente dos bispos - com a questão.
"Não se pode hesitar no compromisso com a promessa de proteger e curar", afirmou aos bispos.
A auditoria de 2017 relatou menos alegações de abuso sexual do que as de 2015 e 2016, com um número de alegações (695) mais próximo do de 2014. Ao mesmo tempo, levantaram-se relatos de violações de limite.
"Estes sinais de alerta não podem ser ignorados", afirmou Cesareo, acrescentando que as 24 acusados relatadas por menores demonstraram por que "cada alegação recebida por uma diocese deve servir como um lembrete importante de que é preciso estar atento".
Cesareo disse ao NCR que não acredita que o sentimento de complacência tenha sido mais forte na última auditoria que nos anos anteriores. Para ele, deve-se a mudanças na liderança pessoal e diocesana, que às vezes pode trazer uma falta de urgência.
"É mais uma falta de urgência. Quando se tem toda essa estrutura, ela deve se manter, mas elas nunca se mantêm sozinhas. Por isso acredito que seja isso”, observou.
Em 13 de junho, o cardeal Daniel DiNardo, presidente dos bispos dos EUA, nomeou três novos membros para a Comissão Nacional de Revisão:
Com as novas nomeações, o conselho chega a 16 membros.
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EUA. Maior verificação de antecedentes está entre as mudanças da carta de proteção aos menores - Instituto Humanitas Unisinos - IHU