11 Junho 2015
Dois sobreviventes de abuso sexual cometido pelo clero católico, e que hoje participam de uma comissão que assessora o Papa Francisco, saudaram a criação, do próprio pontífice, de um novo tribunal vaticano projetado para responsabilizar os bispos que lidarem, de forma inadequada, com as queixas de abuso em suas jurisdições.
O leigo britânico Peter Saunders considerou o anúncio, feito quarta-feira, como “uma boa notícia”, dizendo que “é um passo positivo que indica claramente que o Papa Francisco está escutando a sua Comissão”.
A reportagem é de Inés San Martín, publicada por Crux, 10-06-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
A irlandesa Marie Collins, membro da comissão, disse via Twitter que estava “muito satisfeita” com a decisão do papa de lançar um novo tribunal para conduzir os processos com base no Direito Canônico contra os bispos que fracassarem ao agir na sequência de uma acusação de abuso.
Esta aprovação por parte de Saunders e Collins é significativa, dado que ambos vêm sendo abertamente críticos de vários aspectos da resposta do Vaticano aos escândalos de abuso, especialmente a carência percebida na questão da responsabilização.
Em fevereiro passado, Saunders disse que havia “um histórico enorme de respostas equivocadas dadas por sacerdotes e dioceses de todo o mundo”.
Saunders também causou polêmica recentemente ao criticar a resposta do Cardeal George Pell a uma investigação australiana relativa ao tratamento dado por ele às denúncias de abuso sexual na Austrália, chamando a forma como o prelado se refere às vítimas de “sociopata” em uma entrevista na televisão.
A criação do novo tribunal foi proposta pela Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores, órgão presidido pelo Cardeal de Boston Sean P. O’Malley.
O sistema apresentado na quarta-feira dá poderes para que Congregação para a Doutrina da Fé julgue os bispos que “abusam de seu ofício” ao lidar com casos de abuso sexual.
Um porta-voz do Vaticano disse que, embora o papa ainda terá a palavra final onde haver acusações de má gestão contra um bispo, “não há nenhuma razão para esperar que ele vá anular a decisão do tribunal”.
Para garantir o direito de todos a um julgamento justo, acrescentou o porta-voz, os bispos poderão recorrer das decisões.
Especialistas dizem que o que Francisco fez na quarta-feira não criou nenhuma lei nova, porque o Direito Canônico já considerava como crime o encobrimento de abusos sexuais. O que estava faltando, no entanto, era um sistema claro para fazer cumprir essa lei.
Francisco também aprovou a atribuição dos recursos necessários para o estabelecimento deste tribunal. Isso permitirá que o departamento contrate pessoal, apesar do congelamento das contratações do Vaticano imposto pelo pontífice argentino em 2013.
Fontes disseram em off que o objetivo é a contratação de pessoal nos próximos meses na esperança de ter o departamento funcionando já no meio do segundo semestre, antes da visita do Papa Francisco aos Estados Unidos, em setembro.
Esta notícia vem no encerramento da 10ª reunião do Conselho de Cardeais (ou “G9”), órgão que assessora o Papa Francisco na reforma da Igreja.
O Vaticano anunciou o novo tribunal numa coletiva de imprensa na quarta-feira. O Rev. Federico Lombardi, porta-voz do Vaticano, disse que o G9 aprovou a proposta por unanimidade.
Em um comunicado divulgado em fevereiro passado, a Comissão para a Tutela dos Menores havia dito que estava se concentrando na responsabilização de “todos na Igreja – clero, religiosos e leigos – que trabalham com menores”.
“Parte de assegurar a responsabilização é elevar o nível de consciência e entendimento sobre a gravidade e urgência de implementar procedimentos de salvaguarda corretos”, disse o comunicado.
A Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores foi anunciada em dezembro de 2013, tendo sido oficialmente criada em março de 2014. Hoje, ela possui 17 membros: 10 representantes leigos (incluindo seis mulheres e dois sobreviventes de abuso sexual), além de cinco sacerdotes e duas freiras.
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Vítimas de abuso: O Papa está escutando - Instituto Humanitas Unisinos - IHU