São mais de cinco mil registros em 2012 de mulheres vítimas de ameaça na região do Vale do Rio dos Sinos. A partir dos registros, onde a Lei Maria da Penha é aplicada, podemos constatar a realidade de muitas violências. Falar sobre a violência contra a mulher é enfrentar um problema social vivenciado e silenciado em muitas famílias.
Na opinião de Valquiria Eloisa dos Santos, “falar sobre violência contra a mulher, violência doméstica é sempre um assunto dolorido e delicado. Envolve relações humanas – desejo, amor, sexo, tesão, família, crenças, carinho, sonhos, planos, etc. – e quando a violência entra no meio disso tudo, traz consigo o sentimento de vergonha”.
Valquiria é graduada em Ciências Sociais, mestranda em Ciências Sociais pela Unisinos. A convite do ObservaSinos – IHU contribui na reflexão desta temática.
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A Lei Maria da Penha e as mulheres
A Lei Maria da Penha pode ser considerada um marco no extenso processo histórico de reconhecimento da gravidade da violência contra as mulheres como um problema social no Brasil. A origem desse processo pode ser remetido ao final dos anos 1970, quando mulheres militantes/participantes de diferentes correntes feministas e aquelas presentes nos movimentos sindicais e sociais vinculados às Igrejas, tornaram pública a discriminação praticada contra as mulheres no Brasil.
Sancionada pelo então presidente Lula, a Lei entrou em vigor em agosto de 2006. Dispõe sobre mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Embora pareça óbvio a que veio, muitas mulheres não têm conhecimento de sua aplicação na prática e deixam de denunciar casos de violência. Mesmo a Lei já tendo completado seis anos em vigor, ainda há muitas dúvidas sobre ela. Há no geral um conhecimento superficial sobre. Por exemplo, muitas mulheres não sabem que são protegidas por condutas que as ferem fora do ambiente familiar e que mulheres que sofrem violência sexual, moral e psicológica também podem recorrer. Também tem a questão do medo de denunciar, de ter que enfrentar a audiência, de ter que enfrentar o agressor que, em muitos casos, é o pai das/os suas/seus filhas/os e/ou o homem que ela ama.
Embora a Lei tenha empoderado consideravelmente as mulheres, ainda há muitas ações a serem realizadas e concretizadas em nível de políticas públicas, políticas econômicas, etc, que garantam as estas mulheres, que sofrem/sofreram violência, condições que assegurem a sua vida. De acordo com algumas pesquisas, os principais fatores que mantêm a mulher na relação violenta são a falta de condições econômicas para o próprio sustento e a criação das/os filhas/os. A emancipação de um relacionamento abusivo torna-se mais difícil para as mulheres de baixa renda e pouca escolaridade.
Apesar dos dados divulgados na semana anterior sobre os registros de violência contra as mulheres no Vale do Sinos apontar, no geral, uma leve queda comparando os anos de 2011 e 2012, além de comemorarmos, precisamos ficar atentas/os se essa redução não está relacionada a insegurança/coação ou medo da mulher de denunciar o agressor.
Espaços para o debate
Falar sobre violência contra a mulher, violência doméstica é sempre um assunto dolorido e delicado. Envolve relações humanas – desejo, amor, sexo, tesão, família, crenças, carinho, sonhos, planos, etc. – e quando a violência entra no meio disso tudo, traz consigo o sentimento de vergonha. Quando se sente vergonha, procura-se “esconder” o motivo.
O debate sobre a violência contra mulher e violência doméstica existe sim, mas ainda não abertamente e amplamente como seria o ideal. Quanto mais se fala sobre o problema, mais subsídios e meios de enfrentamento se desenvolvem. Neste sentido, o “falar” torna-se uma ferramenta de emancipAção.
O debate tem ocorrido, mas, ao meu ver, de forma ainda tímida. Escolas e instituições de ensino/educação em geral, deveriam abrir mais espaço para este debate. Nas igrejas, o problema da violência contra as mulheres e violência doméstica ganha uma proporção maior, pois muitas, por “n” motivos, trazem, historicamente, a construção simbólica de gênero e discriminação contra a mulher. Com isso não quero dizer que nas igrejas que não existam trabalhos e ações efetivas e eficazes de enfrentamento a violência contra as mulheres. Existem sim. Mas junto a isto urge a necessidade de rever/reverter a imagem da mulher ante uma construção histórica de submissão e subordinação.
Dos espaços para debate sobre a temática da violência, existem os centros de referência em alguns municípios. No RS, há em três cidades a Secretaria Municipal de Políticas para Mulheres e em, mais ou menos, 100 municípios as Coordenadorias Municipais da Mulher. Que, dentre outras coisas, realizam políticas e ações de enfrentamento e combate à violência contra as mulheres. Também há o trabalho de informação realizado por alguns programas “Mulheres da Paz”, que faz parte do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania – Pronasci.
O importante é buscar informação, não se calar e denunciar aos órgãos competentes caso haja casos de violência contra mulheres ou violência doméstica. De acordo com os resultados de estudos, houve uma mudança importante na percepção da sociedade brasileira sobre a gravidade do problema da violência contra as mulheres. Muitas/os afirmaram ter tomado algum tipo de providência para ajudar. Não se cale, denuncie, busque ajuda!
Por Valquiria Eloisa dos Santos