Disparidades salariais entre homens e mulheres no mercado de trabalho gaúcho

  • Quinta, 29 de Novembro de 2018

O Observatório da Realidade e das Políticas Públicas do Vale do Rio dos Sinos – ObservaSinos, programa do Instituto Humanitas Unisinos - IHU publica, em parceria, com os alunos de Ciências Econômicas da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, campus São Leopoldo, artigos relacionados à estrutura do mercado de trabalho gaúcho, em especial na Região Metropolitana de Porto Alegre -RMPA e do Vale do Sinos.

Este artigo discorre sobre as disparidades salariais observadas entre homens e mulheres na região metropolitana de Porto Alegre - RMPA e no Vale dos Sinos. Os alunos, ao longo do texto, mostram ao leitor importantes dados em relação ao hiato salarial e participativo entre homens e mulheres nos postos de trabalho das regiões supracitadas.

Os dados mostram que há uma diferença estrutural na taxa de participação masculina se comparada à feminina. Ademais, o rendimento real das mulheres em 2017 correspondeu a 89% do rendimento dos homens e apenas 34,39% do total de trabalhadores que recebiam mais de 7,01 salários mínimos eram mulheres, enquanto essa proporção entre homens era de 65,61%.

Por fim, o artigo nos convida a refletir sobre a rigidez estrutural e o peso de constructos socioculturais enraizados que acabam sobrepujando as punições e diretrizes cunhadas por lei. Assim, o texto termina com algumas alternativas e ações capazes de reverter esse quadro nefasto no mercado de trabalho gaúcho.

Eis o texto

1 Introdução.

O presente artigo tem como objetivo apresentar as principais características do mercado de trabalho gaúcho, com foco nas disparidades salariais observadas entre homens e mulheres na região metropolitana de Porto Alegre - RMPA e no Vale dos Sinos. Para tanto, além desta introdução, foi feita uma breve caracterização do mercado de trabalho gaúcho nos anos recentes, com foco nos municípios da região metropolitana de Porto Alegre. Após, foram apresentados dados acerca das disparidades salariais entre homens e mulheres na RMPA e no Vale dos Sinos e propostas alternativas para a redução dessas desigualdades. Por fim, foram apresentadas as considerações finais.

2 O mercado de trabalho gaúcho nos anos recentes.

Com uma população de 11.286.500 habitantes distribuídos em uma área de 281.748,5 km² (FEE, 2016), o Rio Grande do Sul é um dos estados com maior participação econômica no Brasil, ocupando a quarta posição no produto interno bruto entre os 27 entes federados da nação. Tal caracterização é refletida em um dinâmico mercado de trabalho, que sofreu de forma bastante intensa com a crise econômica nacional a partir de 2015.

Segundo a Pesquisa de Emprego e Desemprego da Região Metropolitana de Porto Alegre - PED-RMPA, que analisa dados do mercado de trabalho para 34 municípios gaúchos, a taxa de desemprego na região, após a mínima recente de 5,6% de desempregados em relação à população economicamente ativa, atingiu 12,8% em dezembro de 2017, o que explicita a lenta e frágil retomada econômica em curso no Brasil, que se reflete fortemente no Rio Grande do Sul. Nesse último período, a população economicamente ativa da região foi de 1,8 milhão – soma de 1,6 milhão de ocupados e 239 mil desempregados. Desse total de empregados, a maioria trabalha no setor de serviços: 53,3% e 24,4% na indústria de transformação e na construção.

Com relação ao rendimento médio real dos assalariados na região metropolitana de Porto Alegre, a PED-RMPA divide-os em quatro grupos: o quarto do total com menores rendimentos, os dois quartos intermediários e o quarto superior, que absorve as remunerações mais altas da região. Com dados de janeiro de 2018, em ordem crescente, os rendimentos reais obtidos pelos quatro blocos de assalariados foram os seguintes: 1) R$ 1.044,00; 2) R$ 1.342,00; 3) R$ 1.753,00; 4) R$ 3.765,00. Além disso, a variação do rendimento obtido em janeiro de 2018 em comparação com o mesmo mês de 2017 demonstra que a base da pirâmide salarial – isto é, composta por aqueles com menores rendimentos – viu sua remuneração aumentar em 9,4%, ao passo que o grupo de maior remuneração observou queda de 1% na mesma base comparativa.

Em linhas gerais, são essas as características básicas observadas recentemente no mercado de trabalho gaúcho, em especial nos municípios que compõem a região metropolitana de Porto Alegre.

3 Disparidades salariais entre homens e mulheres.

O gráfico abaixo mostra a taxa média anual da participação no mercado de trabalho gaúcho, dividida entre homens e mulheres. É possível observar que durante todo o período 2013/2017, a participação masculina foi superior à participação feminina.



Fonte: FEE

A partir do ano de 1998, a linha de baixo faz um movimento que parecia indicar o início de um estreitamento entre as linhas, apontando uma maior participação feminina no mercado de trabalho. No entanto, ela permaneceria constante pelos próximos 9 anos, voltando a crescer em 2008, e logo em seguida retraindo novamente. Podemos inferir que os momentos de crescimento econômico são favoráveis à ampliação da participação da mulher no mercado de trabalho, mas não alteram a sua proporção entre os gêneros de maneira significativa.

O ano com maior participação das mulheres no mercado de trabalho gaúcho foi 2008, correspondente a 51,4%, enquanto a melhor taxa de participação foi no ano de 1997, correspondente a 42,3%. Ao longo dos anos analisados, não se pode dizer que houve um crescimento da taxa de participação feminina, mas observa-se a ocorrência de uma variação positiva de 1,14%, comparando-se a taxa média de 1993 com a de 2017.

A respeito dos salários, dentro do modelo de participação abordado acima, apresentamos o gráfico a seguir, que nos mostra os rendimentos médios reais por sexo, na Região Metropolitana de Porto Alegre no período 2000/2017. 



É possível observar que os rendimentos, tanto feminino quanto masculino, acompanham o movimento do desempenho da economia. Nossas pesquisas indicam que o rendimento real das mulheres em 2017 correspondeu a 89% do rendimento dos homens. Analisando por setores de atividade econômica, a maior redução ao longo do período apresentado está no setor de Serviços (-2.7%), seguido por “Comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas” (-2.6%).  

No que diz respeito ao Vale dos Sinos, o Observatório da Realidade e das Políticas Públicas do Vale do Rio dos Sinos (ObservaSinos), em maio de 2017 e utilizando dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), desenvolveu importante levantamento acerca das disparidades salariais entre homens e mulheres na região. Segundo a pesquisa, apenas 34,39% do total de trabalhadores que recebiam mais de 7,01 salários mínimos eram mulheres, enquanto essa proporção entre homens era de 65,61%. Na base da pirâmide salarial, isto é, entre aqueles que recebiam até um salário mínimo, a participação feminina no total era maior: 54,87%. A maior discrepância entre os recebimentos salariais se dá na faixa entre dois e quatro salários mínimos: apenas 33,33% dos rendimentos nesse intervalo são obtidos por mulheres.

Assim sendo, a pesquisa demonstra claramente uma relação inversa entre os níveis salariais e a proporção feminina na obtenção desses salários: quanto maiores os rendimentos, maior o protagonismo dos homens no recebimento dos mesmos. 

Por fim, vale destacar que, nesse estudo, os municípios analisados foram: Canoas, Esteio, Nova Santa Rita, Sapucaia do Sul, São Leopoldo, Portão, Novo Hamburgo, Campo Bom, Estância Velha, Araricá, Nova Hartz, Sapiranga, Dois Irmãos e Ivoti, sendo o período de análise os anos entre 2012 e 2015.

4 Alternativas para redução das desigualdades salariais entre homens e mulheres.

Para apresentar alternativas para redução das desigualdades salariais, é necessário entender as causas dessa disparidade. Primeiramente, destaca-se que a igualdade salarial é um direito garantido, através da CLT:

[...]Art. 461. Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, no mesmo estabelecimento empresarial, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, etnia, nacionalidade ou idade. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017) [...]

Apesar disso, esta lei não é fiscalizada, o que resulta na discriminação da mulher no mercado de trabalho, seja por conta do gênero, questões históricas ou até mesmo uma penalidade pelo ônus da maternidade, que exige que a mulher interrompa sua carreira mais frequentemente que o homem. Independente da razão, o fato é que a mulher vem desempenhando seu papel de forma secundária na economia, conforme destaca o quadro a seguir.



Fonte: G1 Notícias. Acesso em 13 jun. 2018

Essa diferença fica mais clara conforme vai aumentando o grau de escolaridade, uma vez que mesmo em situações onde as mulheres têm mais experiência e nível de especialização que os homens, elas permanecem com um salário menor que o sexo oposto. 

 Seria utópico apresentar soluções de nível macroeconômico, pois a discriminação de gênero é profundamente enraizada na sociedade capitalista moderna em que vivemos, e é necessária uma reestruturação completa das nossas instituições para enfrentá-la. Portanto, devemos iniciar no nível microeconômico para atingir o nível macroeconômico, ou seja, através de iniciativas aplicadas nas empresas, como políticas de incentivo fiscal para aquelas que cumprem a lei e/ou penalizações mais efetivas para aquelas que descumprem. Ademais, as políticas internas devem incentivar a mulher a conciliar a maternidade com o trabalho, e não criar um ambiente conflituoso entre ambos.

Considerações finais.

Conclui-se, portanto, que o Rio Grande do Sul acompanha o cenário nacional e apresenta diferença considerável nos salários dos homens e das mulheres. De acordo com o Boletim Informe Mulher e Trabalho, publicado pela FEE em 2015, sabe-se que a mulher possui maior escolaridade e ocupa mais postos que exigem maior especialização no mercado de trabalho do Rio Grande do Sul. Isso aponta para uma real discriminação de gênero, visto que mesmo quando a mulher é mais qualificada, ela permanece com a menor remuneração.

Para que haja alteração desse quadro, que na teoria deveria ser punido por lei, é necessária uma profunda mudança sociocultural no país e no estado. A equiparação salarial entre os gêneros deve ser pauta constante, e soluções devem ser aplicadas na prática, como a remuneração por nível de escolaridade ou a fiscalização periódica de folhas de pagamento.

Autoria de:

Daniel Consul de Antoni
Priscila Ferreira
Stéfani Torres
Tatiane Enzweiler

Referências selecionadas:

FEE – PED, Série Histórica Mensal.

Disponível em: https://www.fee.rs.gov.br/publicacoes/ped-rmpa/serie-historica-mensal/. Acesso em: 01 jun. 2018.

Mulheres e trabalho: evidências da desigualdade no Vale dos Sinos.

Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/observasinos/vale/trabalho/mulheres-e-trabalho-evidencias-da-desigualdade-no-vale-do-sinos. Acesso em: 01 jun. 2018.