15 Dezembro 2014
O Sínodo dos Bispos de 2015 deve se centrar mais nas realidades da vida familiar, em como ela é, de fato, vivida em todas as suas variadas formas, sublinhou o cardeal Christoph Schönborn, arcebispo de Viena, em entrevista.
A reportagem é de Christa Pongratz-Lippitt, publicada pela National Catholic Reporter, 09-12-2014. A tradução de Isaque Gomes Correa.
Foi bom que algumas opiniões polêmicas vieram à tona no Sínodo dos Bispos de outubro deste ano, disse o religioso: a Igreja estava lutando para encontrar o seu caminho numa sociedade pluralista e cada vez mais secular, e discutir o caminho que ela deveria tomar e se envolver em temas polêmicos foi, portanto, “absolutamente essencial”.
Numa entrevista de quatro páginas na edição de dezembro da aclamada revista mensal alemã Herder Korrespondenz, Schönborn explicou por que assumiu este ponto de vista extremamente positivo:
“O Sínodo marcou o início de um grande processo. Eu voltei muito motivado e energizado, e não teria gostado nada se não houvesse tido confrontos abertos. Eu já participei de muitos Sínodos em que os bispos não estão preparados para baixar a guarda e, simplesmente, mantendo uma conversa meiga, discussões em que ninguém se atreve a dizer onde o calçado dói ou onde as reais necessidades se encontram.”
Por causa da renúncia do Papa Bento XVI, quando este disse abertamente que não mais tinha forças para dirigir o escritório papal, Schönborn falou que a cultura fechada na Igreja teria mudado. Hoje, outras altas autoridades vaticanas falam abertamente. A decisão de Bento de renunciar “foi o ponto decisivo de inflexão. De repente, os cardeais se levantaram e admitiram que se sentiam amargurados na Cúria. Nunca tinha ouvido os cardeais falarem tão abertamente, e com tanta liberdade, como fizeram nas discussões pré-conclave após a renúncia do Papa Bento”.
No Sínodo, Schönborn disse que sugeriu aplicar-se o princípio do gradualismo à questão do matrimônio.
“Ao discutir o matrimônio e a família, devemos primeiramente nos perguntar por que os cônjuges de todo o mundo moram juntos, muitas vezes, sem se casar. Antes de avaliar isto do ponto de vista moral, precisamos aprender a entender por que até mesmo alguns católicos comprometidos somente descobrem, aos poucos, o caminho do Sacramento do Matrimônio”, disse.
Esta sua sugestão legou a debates acalorados. Ele falou que pretendeu, no entanto, usar esta abordagem porque ela era útil.
“Quando dissemos que há elementos de verdade e santidade nas outras religiões, não estamos dizendo que concordamos com tudo o que se acredita nelas”, declarou o cardeal. “Reconhecemos alguns aspectos: a busca, o caminho, o processo”. Da mesma forma, disse, reconhecer que os casais que moram juntos podem estar no caminho para o Sacramento do Matrimônio não significa concordar com a coabitação como um todo.
Muitos dos seus colegas bispos mostraram-se temerosos com esta abordagem e, em certa medida, o Sínodo caracterizou-se pelo medo, disse ele. Alguns bispos temiam que os debates sinodais pudessem fazer com que o papa e a Igreja desistissem da firmeza e claridade dos ensinamentos. Segundo o religioso, eles estavam com medo de que os muitos católicos que se esforçam em manter os valores da família – como o milhão ou mais de católicos franceses que foram às ruas demonstrar os valores da família – se sentiriam abandonados.
“Este é um assunto que devemos levar muito a sério. A Igreja é a única grande instituição no mundo que claramente diz sim ao casamento e à família”, disse. “Eis um alto valor, e o medo de que este bastião irá cair por terra é grande”.
“O que dizer aos bispos que sentem este medo?”, perguntou-se Schönborn, continuando com a parábola do Filho Pródigo:
“Os bons católicos que são católicos no melhor sentido da palavra lembram-me, às vezes, do filho mais velho presente nesta parábola. Este se decepciona porque o seu pai está preparando uma festa para o seu irmão mais novo, apesar do fato de que este irmão fez tudo errado e que, portanto, ele irmão não está se sentindo recompensado por sua lealdade. A resposta do pai é uma das frases mais belas no Novo Testamento: ‘Filho, você está sempre comigo, e tudo o que é meu é seu’ (Lucas, 15,31). Eu diria a estas famílias católicas que eles deveriam ficar felizes e agradecidos por testemunharem o fato de que os casamentos podem ser bem-sucedidos, mas que eles deveriam também de se alegrarem e acolherem nos seus lares os que não alcançam este ideal.”
Em seguida, Schönborn foi perguntado sobre o que disse aos cardeais que manifestaram um desejo pela autoridade quando estavam em Roma para o Sínodo e apontaram para a forma como o presidente russo Vladimir Putin estava defendendo os valores da família. Schönborn respondeu dizendo que lhes falou de quão preocupado ele se encontrava ao ouvir o que estavam dizendo.
“Neste momento, há uma certa tentação de sonhar com uma Igreja poderosa, o desejo por um catolicismo político que vá impressionar as pessoas com a sua suposta força e apresentá-la como uma potência cultural”, disse. “Estas pessoas ficam extremamente preocupadas quando pensam que veem sinais de que o poder do papado está diminuindo e que o papa está, em certa medida, descendo de seu trono”. Schönborn falou que algumas pessoas estavam apreensivas com o papado do Papa Francisco, e esta apreensão engatilhou as histórias de que Francisco não havia sido eleito de forma válida.
No final do Sínodo dos Bispos, Schönborn disse que falou com o Papa Francisco sobre as polêmicas entre os bispos e perguntou-lhe se, talvez, eles estavam exagerando nos confrontos. Francisco, porém, disse-lhe para confiar em Deus.
“O Senhor conduz a Igreja e a conduzirá através destas polêmicas”, disse Francisco segundo Schönborn.
Quanto ao que espera para o Sínodo de 2015, Schönborn falou que gostaria de ver os participantes assumirem um olhar mais aberto às realidades da vida e entrarem na história do matrimônio e da família.
“No Sínodo Extraordinário, o matrimônio e a família foram, muitas vezes, debatidos como se fossem algo que acontecesse no espaço interestelar, e não num período particular da história, numa sociedade particular sob certas condições”, declarou Schönborn. “Por fim, gostaria de que déssemos conta das fraquezas em nossa teologia, sobretudo em questões fundamentais de moral. Esta tarefa precisa ser feita, pois ela [a teologia] desempenha um grande papel no pano de fundo dos debates sinodais. Como dominicano, gostaria muito de convidar a todos para se orientarem segundo uma moralidade que enxerga as pessoas ‘in via’ (...), uma moralidade que é inerente à esperança cristã.”
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Cardeal Schönborn: O próximo Sínodo deve centrar-se nas realidades da vida familiar - Instituto Humanitas Unisinos - IHU