13 Junho 2014
"Alguns bispos estão eufóricos com o Papa Francisco, mas outros estão decepcionados e pensam que ele está levando a Igreja na direção errada. Esses não vão mudar de direção. Muitos estão apenas confusos e com medo de se comprometer. Afinal, quanto tempo Francisco ainda vai ficar conosco? Poucos, como o cardeal Donald Wuerl, de Washington, são capazes de ficar tão entusiasmados com o Papa Francisco como ficavam quando os papas eram João Paulo II e Bento XVI. Eles conseguem mudar de direção com a confiança dos capitães qualificados que não entram em pânico quando o vento muda de direção", Thomas Reese, jornalista, jesuíta, publicada no National Catholic Reporter, 09-06-2014. A tradução é de Cláudia Sbardelotto.
Eis o texto.
Em novembro passado, quando os bispos dos Estados Unidos encontraram-se para a sua reunião anual em Baltimore, eles não tocaram em temas que são característicos do papado do Papa Francisco: preocupação com os pobres e marginalizados, a crítica do capitalismo e a misericórdia e compaixão de Deus. Em vez disso, eles continuaram a se preocupar com o casamento gay e o mandato contraceptivo e votaram pela redação de uma declaração sobre a pornografia. (Spoiler alert: os bispos são contra.)
Foi realmente embaraçoso ver a Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos (USCCB) em ação em Baltimore, especialmente para aqueles que se lembram dos anos de glória, quando os bispos eram vozes proféticas, com suas cartas sobre a paz e para a economia. Era como se tivessem perdido o memorando do Papa Francisco.
Esta semana, os bispos tem outra chance de entrar no vagão do trem de Francisco ao se reunirem de quarta a sexta-feira em Nova Orleans. Será que eles vão perder o trem de novo?
As "questões familiares" voltarão a ser o ponto central na reunião em Nova Orleans. Os bispos vão ter uma atualização de sua Subcomissão para a Promoção e Defesa do Casamento, presidida pelo arcebispo Salvatore Cordileone de San Francisco. Essa é a comissão que luta contra o casamento gay.
Eles também vão ouvir o arcebispo William Lori de Baltimore, que preside o Comitê Ad Hoc para Liberdade Religiosa da USCCB, que está liderando a luta contra o mandato contraceptivo do Affordable Care Act.
O foco na família é inevitável porque um relatório será levado ao próximo sínodo extraordinário dos bispos sobre a família, a ser realizado de 5 a 19 de outubro em Roma e outro relatório será encaminhado ao Encontro Mundial das Famílias, previsto para setembro de 2015, na Filadélfia.
Será interessante ver quanto tempo será dedicado às diferentes questões familiares (controle de natalidade, diminuição de casamentos, casamento gay, divórcio, abuso conjugal e infantil, comunhão para os católicos divorciados, igualdade de gênero, pobreza, etc.) O Papa Francisco levantou a questão da comunhão para os católicos divorciados. Será que os bispos têm a coragem de discutir isso em público?
Vamos torcer para que eles prestem atenção às respostas dos leigos ao questionário enviado pelo Vaticano, em antecipação do sínodo sobre a família. Os leigos deveriam poder contribuir nessas discussões sobre a família, assim como os sociólogos que passaram décadas estudando as famílias americanas. A última coisa que famílias problemáticas precisam é ouvir bispos citando encíclicas papais.
A boa notícia é que uma parte especialmente agendada dessa reunião será uma apresentação sobre o casamento e a economia. Será que os bispos vão finalmente reconhecer que a pobreza e o desemprego são ameaças muito maiores ao casamento do que o fato dos homossexuais se casarem? Vamos esperar que sim. As pessoas pobres são menos propensas a se casar, e as famílias em situação de pobreza são mais propensas a experimentar estresse, conflitos e divórcio.
Também na agenda está uma apresentação sobre a "nova evangelização e a pobreza". Houve um tempo em que eu pensava que a nova evangelização fosse o Catecismo da Igreja Católica com um sorriso. O Papa Francisco mostrou que a nova evangelização pode ser: uma ênfase na compaixão e no amor de Deus, em vez de regras e culpa; ênfase na solidariedade com os pobres, em vez de moralização hipócrita; ênfase no serviço em vez de contemplar o próprio umbigo; uma ênfase no Evangelho no lugar da escolástica.
Ver que alguém na conferência dos bispos esteja fazendo a ligação entre a evangelização e os pobres é encorajador.
Finalmente, os bispos receberão uma atualização e votarão uma proposta do grupo de trabalho sobre a declaração dos bispos sobre a responsabilidade política, também conhecida como "Faithful Citizenship" (Cidadania fiel). A declaração sobre a responsabilidade política tem sido emitida pela USCCB antes de cada eleição presidencial desde 1976.
A primeira surpresa é que essa proposta não está vindo das comissões episcopais de justiça, paz e desenvolvimento social, as quais foram responsáveis pela elaboração da declaração no passado, mas a partir de um grupo de trabalho especial.
Não é segredo que, antes da última eleição presidencial, os bispos estavam divididos entre aqueles que queriam enfatizar o aborto, o casamento gay e a liberdade religiosa (mandato contraceptivo) e aqueles que queriam que a declaração cobrisse toda uma gama da Doutrina Social da Igreja, incluindo a ênfase sobre o desemprego, a pobreza e a imigração.
Os bispos não poderiam resolver esse conflito pelo voto de maioria simples, porque as declarações da Conferência exigem uma maioria de dois terços. Em vez disso, eles simplesmente adicionaram uma nova introdução para a declaracão divulgada antes da eleição de 2008.
Será que o grupo de trabalho vai tomar partido nesse conflito? Será que ele vai tentar abranger as diferenças? Ou será que ele vai ter um plano para resolver o conflito?
O jornalista Michael Sean Winters relata que "o esquema já está montado", e a alta equipe da USCCB está do lado das pessoas que travam as guerras culturais, em vez daquelas que apoiam uma ética de vida mais consistente. Se isso for verdade, então a minoria progressista vai ter que votar contra outra vez e forçar a conferência a reeditar o documento Faithful Citizenship novamente.
Com sua ênfase sobre os pobres e marginalizados, não há muita dúvida sobre como o Papa Francisco votaria nesse debate - basta ler a Evangelii Gaudium. A hesitação dos bispos mostra que eles ainda não estão a bordo com o Papa Francisco.
Alguns bispos estão eufóricos com o Papa Francisco, mas outros estão decepcionados e pensam que ele está levando a Igreja na direção errada. Esses não vão mudar de direção. Muitos estão apenas confusos e com medo de se comprometer. Afinal, quanto tempo Francisco ainda vai ficar conosco? Poucos, como o cardeal Donald Wuerl, de Washington, são capazes de ficar tão entusiasmados com o Papa Francisco como ficavam quando os papas eram João Paulo II e Bento XVI. Eles conseguem mudar de direção com a confiança dos capitães qualificados que não entram em pânico quando o vento muda de direção.
A reunião dos bispos em Nova Orleans pode ser um momento decisivo para os bispos, mas eles irão navegar com o vento Francisco ou será que vão evitar as ondas da mudança?
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Será que os bispos dos Estados Unidos vão seguir o Papa Francisco? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU