Por: Jonas | 16 Julho 2012
“O governo espanhol continua repetindo mentiras para ver se em algum momento elas se convertem em sua própria verdade”, afirma o doutor em economia, Alfredo Serrano Mancilla, a respeito da posição da Espanha frente ao cenário econômico atual, em artigo publicado no jornal Página/12, 12-07-2012. A tradução é do Cepat.
Eis o artigo.
A Espanha está em transição. Uma transição intra-regime onde o rei tem seu papel invisível, o bipartidarismo consolida sua hegemonia, a União Europeia continua tomando decisões, o capital financeiro vem com o seu e ninguém se importa com o povo espanhol. Amanhã, o rei da Espanha acorrerá ao Conselho de Ministros, onde – imagino – algo será discutido sobre as novas medidas impostas pela rainha, não a senhora Sofia, mas a alemã (Merkel), usando sua fórmula preferida, a União Europeia. Os 30 bilhões de euros, emprestados ao banco espanhol, terão o seu preço econômico-político. A permuta é bem simples: resgatar o banco para afundar aos cidadãos. Intercâmbio desigual, como diriam Wallerstein ou Arrighi, mas desta vez na dimensão local.
Alguns, os bancos culpáveis de todo o estabelecido, são salvos pelas políticas econômicas da índole de “capitalismo corporativo”, isto é, intervencionismo a favor do capital financeiro. Outros, a grande maioria da população espanhola, são condenados a pagar o mais injusto de todos os impostos, o IVA [Imposto sobre o Valor Acrescentado], a trabalharem mais, no caso de funcionários públicos, a aumentarem os anos de contribuição, para desfrutarem de uma aposentadoria, e a se depararem com a redução do subsídio de desemprego, na quantia e no tempo.
Na Espanha, o governo (anti)popular continua acatando as imposições vindas da rainha bávara, no marco das invasões bárbaras na periferia europeia, nos últimos anos. E a Espanha continua pagando a dívida pública a juros recordes, enquanto a Alemanha, tão feliz, consegue financiamento a juros reais negativos.
Dito de outra forma, os investidores que conseguem rentabilidade muito elevada, com a dívida espanhola, pagam dinheiro (para a Alemanha) por colocarem seus abundantes benefícios na dívida Alemanha. Por outro lado, se tem o recente empréstimo de 30 bilhões de euros, como a primeira parte de futuras entregas, até chegar ao montante estimado pelos consultores dependentes. Os juros serão de 4% e não de 3% como disse o ministro Pinóquio da Economia. O governo espanhol continua repetindo mentiras para ver se em algum momento elas se convertem em sua própria verdade: “Não haverá cortes exigidos, nem condicionantes macroeconômicos”.
Novamente, o empréstimo virá das mãos dos homens de preto (troika), que vigiarão a economia espanhola a cada três meses. O empréstimo, como todos, vem com sua letra pequena, em forma de memorando, com 32 condições que já foram traduzidas em novos cortes. Estes milhões de euros computam como dívida pública, até que não esteja pronta a recapitalização direta de bancos. As conseguintes medidas de desajuste fiscal se sintetizam em duas conhecidas pílulas neoliberais: menos gasto social e mais impostos regressivos.
Jamais se propõe corrigir o déficit por meio de mais impostos às minorias enriquecidas. Existem alternativas de corrigir o déficit sem aumentar o IVA (que afeta aqueles que menos têm)? Sim, claro, é necessário apenas vontade política. Por exemplo, se for modificada a norma tributária, aprovada nestes últimos anos, que permitiu: a) reduzir as taxas de impostos para os benefícios empresariais; b) reduzir a taxa efetiva (o que realmente pagam) para a metade graças a uma mudança de base impossível por infinitas isenções fiscais; c) reduzir o pagamento de impostos às grandes fortunas sob modelo de sociedade de investimento de capital variável (pagam 1%), e d) reduzir a taxa de imposto sobre a renda para as pessoas que ganham mais dinheiro (que passaram de 56% para 45%).
Não obstante, a alternativa não é se questionar sobre como pagar a dívida ou como salvar os bancos privados; a opção deve ser praticar uma moratória da dívida e não pagar aquela que seja ilegítima. A alternativa é se preocupar com os cidadãos e não com o capital. Porém não, nada disto pode ser pensado numa nova transição na Espanha, que deseja salvar o capital financeiro espanhol e, mais concretamente, o capital financeiro alemão (credor em grande medida da dívida).
Na Espanha se conhece muito a respeito de transições. Há mais de 30 anos, houve uma transição por trás de uma bolha democrática e econômica, que apagava os mortos do passado, propondo um presente baseado num regime bipartidarista, de populares (muitos deles franquistas) e socialistas, em conivência com o rei, formando parte da armadilha europeia. Agora, nesta outra transição, de corte geopolítico, a Espanha passa a ser um “länder” alemão, com o Conselho de Ministros – em presença do rei – tendo que prestar contas à rainha da Alemanha.
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Uma nova transição na Espanha - Instituto Humanitas Unisinos - IHU