23 Outubro 2011
As religiões e os não crentes em busca, juntos para anunciar a "paz e bem" a um mundo marcado pela incerteza. Remo Bodei, filósofo, professor da Universidade da Califórnia, representa uma das "novidades" da peregrinação inter-religiosa prevista para a próxima sexta-feira em Assis, com a presença de Bento XVI.
A reportagem é de Lorenzo Fazzini, publicada no jornal Avvenire, 22-10-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O papa-teólogo quis que, na cidade de Francisco, também estivessem presentes alguns "não crentes" para representar a universalidade do evento que lembra os 25 anos do primeiro encontro inter-religioso desejado por João Paulo II.
Eis a entrevista.
Professor Bodei, por que você vai participar do encontro inter-religioso de Assis?
O convite veio a mim através do cardeal Ravasi. Eu já havia estado em Assis para um encontro semelhante em 1998 com o então primeiro-ministro Massimo D"Alema. Eu aceitei esse apelo de muito bom grado, porque o debate com o sagrado e as religiões é sempre interessante. Ninguém sabe ao certo o que acontece no mundo e na própria vida. A fé também é cheia de dúvidas: por isso deve ser levada adiante uma busca comum pela verdade. Especialmente no contexto atual, em que o panorama midiático e a política são marcados por um populismo que infantiliza as pessoas, como denunciado pelo filme O Show de Truman, onde a mentira substitui a realidade.
Além disso, na nossa situação, a verdade é concebida como uma "torta a ser compartilhada", em que cada um recebe uma fatia sob a condição de que o outro receba outra. Mas essa é uma visão da verdade degradada a opinião... Ao contrário, Bento XVI, a quem eu estimo pelos seus escritos sobre Agostinho, tem o grande mérito de ter sublinhado o valor "grego" do cristianismo, lembrando que a fé não é só intenção ou emoção, mas também racionalidade.
Nessa busca pela verdade, crentes e não crentes "pensantes" podem colaborar?
Desejo que, como fez o cardeal Bagnasco em Todi, a Igreja sempre voe mais alto. Jamais acreditei em compromissos com aqueles "ateus devotos" que instrumentalizam a religião. Acredito que, da Cátedra dos Não Crentes do cardeal Martini até o Átrio dos Gentios de Bento XVI, a instituição eclesial manifestou a disponibilidade de reler (sem pôr em discussão) seus próprios dogmas com relação ao presente. O Papa Gregório Magno dizia que os textos sagrados crescem com a leitura de quem os leva em consideração. A Igreja tem os seus problemas na sua relação com o moderno, embora este último não seja algo totalmente positivo.
Mas certamente está florescendo a consciência de que, se os dogmas religiosos entram em contato com as ideias do mundo e saem da sua clausura, isso se torna um fato positivo também para os "laicos", isto é, aqueles não crentes que não querem viver na banalidade. E não se conformam com o astrônomo Laplace, quando disse: "Perscrutei o céu e não vi Deus". Redescobrir a dimensão do sagrado, especialmente em um período de crise como este, em que a economia e o futuro dos jovens parecem ser incertos (nós, ocidentais, nos tornaremos mais pobres), constitui uma tarefa comum para crentes e não crentes, para além das cores dos partidos. É aí que se situa o justo papel da relevância pública da Igreja, sem que ela chegue a ditar leis. Essa colaboração é, em última instância, benéfica para a sociedade.
Assis remete à figura de São Francisco. Qual a herança do "Poverello" para o nosso tempo?
Eu sou um leitor dos livros de Chiara Frugoni, que tanto estudou a vida de Francisco. E não compartilho as leituras daqueles que consideram o seu pai melhor do que ele, ou preferem a abordagem capitalista à escolha da pobreza. Além disso, se lermos o Evangelho, encontramos um Jesus que vive como um homem que se privou de tudo, que dorme onde der, um "vagabundo" muito exigente ("Eu vim para trazer a espada"). Em suma, Cristo – e Francisco com ele – traz um radicalismo que, também no nosso tempo, faz bem. Considera que, na situação atual, uma redescoberta da espiritualidade franciscana, sob a marca da pobreza e da atenção ecológica de Francisco, devem ser muito bem-vindas.
Qual mensagem o senhor deseja que saia do encontro da Úmbria?
Penso que o desejo do pax et bonum, em um mundo em grande turbulência como o nosso (pense-se na Líbia...), seja de extrema eloquência. Desejo que venha um apelo de paz e um convite para se sentir em busca, todos os homens, no esforço comum de salvar a humanidade da deriva rumo ao pior. Considero este encontro de Assis como uma etapa, um degrauzinho(Dante fala de Assis como de "ascese") para uma maior coesão e busca daqueles valores universais como os direitos humanos, a tolerância, a rejeição do confronto, que nos congregam como seres humanos.
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"Recomecemos de Assis" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU