28 Setembro 2011
Deve ser porque com os "vizinhos" é mais fácil ser sincero do que com os estranhos. Mas, certamente, na sua viagem à Alemanha, o papa foi claro.
A reportagem é de Alessandro Speciale, publicada no sítio Vatican Insider, 26-09-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Não era nenhuma surpresa que a situação encontrada em sua pátria pelo papa alemão não seria fácil. O livro distribuído pela Conferência dos Bispos da Alemanha para a imprensa depois da viagem também não escondia os problemas: daquele antigo, da queda das vocações, àquele cada vez mais urgente dos abandonos da Igreja – 180 mil só no último ano, mais do que aqueles que "entraram" com o batismo.
Uma situação, além disso, que se tornou ainda mais complexa com a explosão do escândalo da pedofilia no ano passado: não só porque fez com que a Igreja perdesse "credibilidade" perante a sociedade em geral, mas também, e talvez sobretudo, perante os olhos do pontífice, porque reacendeu as demandas por reformas estruturais já latentes há décadas, mas que estavam adormecidas nos últimos anos.
Da obrigação do celibato ao papel das mulheres, da escolha dos bispos à moral sexual: pedidos que se precipitaram pelo famoso memorando "Uma reviravolta necessária", assinado por um terço dos professores de teologia católicos – os novos "colegas" do professor Ratzinger – e ainda por um documento assinado por políticos de primeiro plano do partido conservador CSU.
E, novamente, temas muito sentidos na sociedade, como a situação dos divorciados em segunda união – tema levantado também pelo presidente alemão, Christian Wulff (na foto, ao lado do papa), que vive essa situação em primeira pessoa – ou a comunhão para os casais "mistos" católico-protestantes. Todos foram levantados, de uma forma ou de outra, perante o Papa Ratzinger nos inúmeros encontros que ocorreram durante a viagem.
Tudo isso, segundo os críticos, ocorria no silêncio e na substancial "cumplicidade" dos bispos alemães, culpados não só de não terem respondido de forma suficientemente dura a essa suposta "insubordinação", mas também de terem, ao contrário, iniciado um amplo "processo de diálogo" com os leigos/as e as suas instâncias.
Muitos esperavam que o papa evitaria tocar no assunto, substancialmente. Ao contrário – como previsto por alguém que o papa conhece bem, o cardeal alemão Walter Kasper – ele "agarrou o touro pelos chifres".
E fez isso já no primeiro dia, quando, no Olympiastadion de Berlim, lembrou que quem olha para a Igreja "detendo-se em seu aspecto exterior" só pode alimentar "insatisfação e descontentamento", porque não vê "realizadas as suas ideias superficiais e errôneas de "Igreja" e os seus próprios "sonhos de Igreja"".
Desde então, ao longo dos quatro dias que se seguiram, essa foi a música que tocou muitas vezes nos ouvidos dos católicos e bispos alemães.
Para o Comitê Central dos Católicos Alemães – a poderosa organização dos leigos/as, da qual alguns expoentes são políticos de primeiro plano –, o papa recordou que a riqueza exterior pode esconder uma pobreza interior, também na Igreja: "Na Alemanha, a Igreja está organizada de um modo ótimo... Mas devemos dizer que há uma excedência das estruturas com relação ao Espírito". E acrescentou: "A verdadeira crise da Igreja no mundo ocidental é uma crise de fé. Se não chegarmos a uma verdadeira renovação na fé, toda a reforma estrutural será ineficaz".
Aos seminaristas, ele tomou como exemplo o grupo "Nós Somos Igreja" – movimento internacional para a reforma na Igreja Católica – para lembrar que, "na comunidade dos fiéis, sim, há, por assim dizer, demandas de uma maioria legítima, mas nunca pode haver uma maioria contra os Apóstolos, contra o Santos. Nesse caso, trata-se de uma falsa maioria".
Aos fiéis reunidos para a missa em Friburgo, ele reafirmou que "a Igreja na Alemanha [só] continuará sendo uma bênção para a comunidade católica mundial" se permanecer "fielmente unida com os Sucessores de São Pedro e dos Apóstolos", ou seja, com o Vaticano.
O sentido, porém, dessa insistência se esclareceu somente com a última etapa de destaque da viagem, o encontro com os católicos comprometidos com a sociedade, ainda em Friburgo, pouco antes de embarcar no voo para Roma.
Parafraseando um provérbio, segundo o papa, quem pede reformas na Igreja "olha para o dedo e não para a lua". Pede que as estruturas mudem, mas estas são secundárias: o que importa é o que as anima.
De fato, Bento XVI foi ainda mais radical: quando dá muita importância "à organização e à institucionalização", a Igreja está se acomodando e se adaptando aos "critérios do mundo", traindo a sua missão.
Por isso, paradoxalmente, a secularização – que despojou a Igreja primeiro do seu poder temporal, depois dos privilégios e hoje, em muitas partes, até do status social – deve ser bem-vinda, porque, "para corresponder à sua verdadeira tarefa, a Igreja deve sempre novamente fazer o esforço de se destacar da mundanidade do mundo".
Só quando está "liberta do seu fardo material e político", de fato, é que "a Igreja pode se dedicar melhor e de um modo verdadeiramente cristão ao mundo inteiro, pode ser verdadeiramente aberta ao mundo. Pode novamente viver com mais fluidez o seu chamado ao ministério da adoração a Deus e ao serviço do próximo".
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Alemanha: as respostas do papa a quem pede reformas na Igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU