18 Janeiro 2018
O Pentágono quer banalizar a bomba atômica, construindo uma “pequena”, que tornaria o seu uso menos aterrador. A revelação circula há três dias e ajudou a inspirar o alerta público do Papa Francisco sobre os riscos de conflito atômico.
A reportagem é de Federico Rampini, publicada por La Repubblica, 17-01-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A primeira versão, publicada no The Huffington Post e citada no jornal La Repubblica, não foi desmentida pelo Pentágono, que se limitou a defini-la como “ainda não decidida”. Agora, uma detalhada antecipação do Wall Street Journal explica que se trata da “Nuclear Posture Review”, elaborada pelo Departamento de Defesa e que já se encontra sobre a mesa de Donald Trump.
Há um ano, o presidente pedira uma revisão estratégica sobre a adequação do arsenal nuclear, na esperança do seu reforço. Os generais lhe explicam por que e como consideram que devem auxiliá-lo.
As novas armas nucleares “leves” seriam fabricadas em duas versões. Uma poderia ser montada sobre os mísseis Trident fornecidos aos submarinos atômicos. A outra poderia se tornar a cabeça de mísseis Cruise fornecidos à Marinha dos Estados Unidos.
O fato de o novo arsenal estar destinado à Marinha confirma a hipótese de poder usá-lo em cenários de guerras distantes, não para a defesa imediata do território dos Estados Unidos. A natureza das novas armas nucleares é definida como “low-yield”, isto é, de baixo rendimento, apenas porque a comparação é feita com as outras ogivas atômicas (cerca de quatro mil) do arsenal estadunidense: que vão de 100 a 455 kilotons em comparação com os 15 kilotons de Hiroshima.
Mesmo assim, se trataria de bombas atômicas, ou seja, de armas com uma capacidade de destruição enorme em comparação com os explosivos convencionais. A bomba atômica “de bolso”, porém, ofereceria a vantagem de poder justificar o seu uso tático, para um ataque preventivo, sem que isso deva desembocar na Terceira Guerra Mundial. Mais política do que militar, a lógica é a de reduzir as resistências que, depois de Hiroshima e Nagasaki, sempre impediram o conflito nuclear, até nos momentos mais tensos da Guerra Fria. O equilíbrio do terror entre as duas superpotências EUA-URSS mantinha ambas à beira do precipício, por medo da aniquilação mútua.
A hipótese de uma minibomba atômica “tática”, no entanto, não é nova. Ela foi antecipada pelos soviéticos nos “euromísseis”, que anunciavam, nos anos 1970, a possibilidade de um conflito atômico limitado à Europa, portanto, com a possível desvinculação dos Estados Unidos da defesa dos outros países da Otan.
Antes ainda, um uso limitado de bombardeios nucleares foi levantado como hipótese pelo general Douglas MacArthur contra a China de Mao, durante a Guerra da Coreia (1950-1953). Mas o presidente Truman expulsou MacArthur.
Agora, é novamente em Moscou e em Pequim que se deve procurar a justificativa da virada estadunidense. Antes antes de olhar para a ameaça da Coreia do Norte, o documento do Pentágono lança um alerta sobre o rearmamento nuclear das outras duas superpotências.
Rússia e China, defende o documento entregue a Trump, vem se movendo há anos na direção oposta à da desnuclearização. Vladimir Putin quis desenvolver uma nova geração de mísseis de cruzeiro terra-ar de porte intermediário, que seria, a reedição dos euromísseis: um arsenal estudado para o cenário de um conflito nuclear “limitado”.
Ainda de acordo com o documento do Pentágono, esses mísseis de nova geração violariam o tratado assinado em 1987 por Ronald Reagan e Michail Gorbachev. Ao contrário das novas armas russas, as ogivas nucleares “de baixa intensidade” que são propostas pelo Pentágono não violariam os tratados existentes, precisamente por serem instaladas em navios e submarinos. A fabricação dessas novas bombas, se Trump der o sinal verde, demoraria dois anos. A decisão do presidente está prevista para o fim de janeiro.
O anúncio da reviravolta ocorre no pano de fundo de uma crise aberta com a Coreia do Norte. A “hipótese MacArthur” será reproposta? Foi confirmado várias vezes que o Pentágono faz simulações sobre possíveis ataques militares contra Pyongyang, para atacar os seus arsenais nucleares para fins preventivos, já que agora os mísseis norte-coreanos podem alcançar os Estados Unidos.
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Bombas atômicas ''leves'', a nova ameaça de Trump - Instituto Humanitas Unisinos - IHU