03 Fevereiro 2025
"O soberanismo dos Estados Unidos não pode se reduzir a uma atitude vingativa e rancorosa em relação a tudo e a todos: dessa forma, parece mais fraco e limitado, reduzido a uma ambição pequena e sem projeto global.", escreve Mario Giro, professor de Relações Internacionais na Universidade para Estrangeiros de Perúgia, na Itália, em artigo publicado por Domani, 24-01-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Onde está a América que se coloca à frente do mundo livre? A América que guia o globo e aponta para o futuro comum da liberdade? Não apenas aquela da Nova Fronteira kennedyiana ou do New Deal rooseveltiano, mas também aquela de Eisenhower, Reagan e dos Bushes: a América líder do mundo livre, que venceu fascismo e comunismo e enfrentou impávida terrorismos de todo tipo.
No discurso de posse de Trump, não havia sinal dessa América: nenhuma referência aos aliados nem à visão americana do mundo, nem a como gostaria de moldá-lo nem à história. Ele praticamente se isolou em uma esfera pequena e mais íntima que, se não fossem os Estados Unidos, poderia ser definida de “provinciana”, pelo menos como pensamento.
É uma América que vale só para si mesma, sem ninguém ao redor e, acima de tudo, sem ambição de moldar nada. Uma América que não oferece nada, pretende e ponto. O soberanismo dos Estados Unidos não pode se reduzir a uma atitude vingativa e rancorosa em relação a tudo e a todos: dessa forma, parece mais fraco e limitado, reduzido a uma ambição pequena e sem projeto global.
A verdadeira aspiração estadunidense, o “destino manifesto” da “casa sobre a colina”, deveria brilhar no alto, visível para todos, um exemplo para todos, um modelo para cada uma das outras nações, envolvente, não importa se curvado para direita ou para esquerda. Deveria ser uma América dona da história.
Sempre haverá adversários, às vezes até inimigos, é óbvio. Mas sem um apelo que atraia a todos, não existe América, mas apenas um país banalizado, semelhante a outros, focado apenas em seus próprios interesses econômicos (como todos), o mais forte e poderoso, mas que não seduz e não atrai. Não importa se a visão venha a se explicitar na versão republicana ou democrata: a América sempre foi uma exceção, justamente porque, além de ser o país mais forte e rico, é também aquele que propôs uma ideia comum e um sonho para cada homem e cada país sobre esta terra.
Pode ser um projeto oposto a outros, severo e inflexível, mas ainda assim oferecido a todos.
Uma ideia imperial. Fala-se muito da Roma antiga como exemplo, mas nas palavras de Trump faltava exatamente o apelo às outras nações, não havia nem mesmo um convite para se curvar à visão estadunidense do bem comum global. A grandeza dos Estados Unidos sempre foi uma aspiração ao universalismo de seus valores de liberdade, democracia e livre iniciativa. Caso contrário, trata-se de uma América que não quer impérios, sem sonho, sem voo, sem despregar de asas, uma espécie de reedição da Europa colonial e egoísta de outrora, mas fora do prazo de validade.
Não estamos mais no século XIX e outras nações reagem de forma diferente, sem aceitar nenhuma supremacia a menos que seja acompanhada de uma paixão coletiva. Sem ser estadunidenses, como se sentir dentro do discurso de Trump na posse? Somente se tornando estadunidenses, o que, a propósito, está cada vez mais difícil. Não havia naquelas palavras nenhuma ideia de comunidade de nações, nem sequer dependente da férrea hegemonia de Washington. Ou estava implícita demais.
O resto do mundo simplesmente não existia, exceto a parte descrita como hostil e criminosa. Não havia aliados, amigos, fiéis e nem mesmo súditos. Não ouvimos uma proposta para eles ou para o mundo.
Mas uma América enrodilhada sobre si mesma e sem ambição global, que tipo de país é? Cabe se perguntar isso agora que começa o segundo governo Trump. E seus (e nosso?) adversários mais fortes têm uma proposta para todos, como Moscou e Pequim pregam há muito tempo. Eles certamente atraem pouco, mas se Washington parar de tentar “conquistar os corações e as mentes”, terão mais chance. Não se trata de ter medo, mas de esperar e torcer para que a América volte a ser realmente si mesma: uma América para o mundo.