20 Mai 2024
Em seu blog, Andrea Grillo escreve: “Foi publicado nestes dias o livro ‘Senza impedimenti. Le donne e il ministero ordinato’ [Sem impedimentos. As mulheres e o ministério ordenado] (Ed. Queriniana, 2024).
“Trata-se de um exercício de ‘parrésia’ para descobrir que não há impedimentos à admissão da mulher ao grau do diaconato do ministério ordenado.”
“O livro dos Atos dos Apóstolos termina com três palavras que se referem ao modo como Paulo ensinava em Roma. O texto se conclui com πάσης παρρησίας ἀκωλύτως, ‘cum omni fiducia, sine prohibitione’, com franqueza e sem impedimentos.”
“Este livro quer ser uma experiência de ‘parrésia’, que pode amadurecer em uma Igreja que não proíbe a pesquisa séria e documentada, e que consegue reconhecer que não há impedimentos ao acesso das mulheres ao ministério ordenado.”
“Proponho aqui uma breve descrição do texto, retirada da minha ‘Introdução’. O livro inclui um prefácio de Marinella Perroni e as intervenções de Emanuela Buccioni, Cristina Simonelli, Luigi Mariano Guzzo, Serena Noceti, Luca Castiglioni e Andrea Grillo. Nós o escrevemos para que, na próxima Assembleia Sinodal de outubro, não ouçamos mais nem silêncios embaraçosos, nem palavras vazias, nem preconceitos mascarados.”
“Sem impedimentos. As mulheres e o ministério ordenado”, novo livro de coautoria de teólogas e teólogos italianos (Foto: Divulgação)
O texto foi publicado em seu blog Come Se Non, 16-05-2024. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
“Em segundo lugar, o fato por demais conhecido, isto é, o ingresso da mulher na vida pública: mais acentuado talvez em povos de civilização cristã; mais tardio, mas já em escala considerável, em povos de outras tradições e cultura. Torna-se a mulher cada vez mais cônscia da própria dignidade humana, não sofre mais ser tratada como um objeto ou um instrumento, reivindica direitos e deveres consentâneos com sua dignidade de pessoa, tanto na vida familiar como na vida social” (João XXIII, Pacem in terris, n. 22).
A contribuição que este livro quer oferecer ao debate sinodal, em vista da necessária discussão sobre o tema da plena valorização das mulheres no exercício do ministério eclesial, move-se na perspectiva de um objetivo muito simples: permitir que todos os componentes da Igreja, os ministros e todos os fiéis, os competentes e os simples interessados, compreendam a fragilidade da posição assumida pelo magistério nos últimos 50 anos e tentar sugerir um olhar diferente sobre o assunto, para assumir eclesialmente a possível autoridade de decisão, e não para se despojar de toda a autoridade exclusivamente sobre este tema.
No plano bíblico-exegético, Emanuela Buccioni, com o título “O que está escrito na Bíblia? Como você a lê?”, reconstrói cuidadosamente tanto os limites da leitura dos textos bíblicos oferecidos pelo magistério quanto o horizonte para recuperar o contexto esquecido dos textos invocados em apoio à tese oficial.
São assinaladas algumas sobreposições de termos – sobretudo entre ministério apostólico e colégio apostólico, metáfora conjugal e guia pastoral da comunidade – que levam a assumir o texto bíblico não como fonte, mas como mero instrumento de confirmação de estereótipos e de preconceitos fundados em outros lugares e de outra forma.
O cotejo com o texto bíblico, como já desejado pela Comissão Bíblica ignorada de 1976, poderia ajudar a evitar novas polarizações e a abrir caminhos legítimos de inovação, que a exegese da Escritura não veta e, portanto, não exclui.
No plano histórico-patrístico, Cristina Simonelli, sob o título “O recurso aos Padres: um mecanismo coletivo de defesa”, desenvolve um rico raciocínio que se articula em duas partes: na primeira, analisa as graves “remoções que obscurecem a visão e invalidam o processo”, determinando uma espécie de leitura distorcida dos textos do Novo Testamento e dos usos que os Padres fizeram deles, dentro de uma cultura profundamente misógina.
Uma segunda parte desenvolve, por sua vez, uma “lição dos Padres” diferente, que, por analogia com a elaboração de uma nova compreensão da penitência, possa recuperar uma leitura dinâmica e aberta da teologia patrística, a ser reproposta na discussão do Sínodo, em que a dissidência e a discussão animada poderão criar o espaço para um avanço comum.
Se a liberdade de consciência pôde ter sido definida como um “delírio” no século XIX e com a máxima autoridade, não se pode excluir uma evolução também sobre o ministério das mulheres.
No plano canônico-institucional, Luigi Mariano Guzzo, com o título “A atribuição da ordem sagrada a uma mulher: perfis jurídicos”, oferece uma leitura muito límpida das contradições internas ao sistema jurídico produzidas pelo direito canônico, no que diz respeito ao sacramento da ordem em relação aos sujeitos batizados de sexo feminino.
O fôlego da análise verifica com perspicácia as tensões internas ao ordenamento, tanto em relação ao princípio de igualdade, que entra em contraste com um pretenso direito divino, quanto à sobreposição entre lógicas teológicas e lógicas jurídicas, que criam cones de sombra e consequências paradoxais em muitos aspectos da normativa.
Para completar a análise, a identificação de “privilégios” concedidos à experiência monástica feminina da tradição beneditina e cartuxa mostra claramente como a integração da mulher no exercício de funções diaconais não é apenas uma possibilidade, mas também já é uma realidade.
No plano eclesiológico-ministerial, Serena Noceti, com uma contribuição intitulada “Orientar-se no labirinto: qual teologia do ministério ordenado?”, predispõe uma releitura abrangente da questão de gênero dentro de uma visão dinâmica do ministério eclesial, assumindo com rigor crítico a abordagem cristológica e mostrando os limites evidentes de sua tradução conceitual, tanto no modelo pré-conciliar quanto em algumas expressões prioritárias da recepção pós-conciliar da formulação que a Lumen gentium tinha dado profeticamente à compreensão do ministério, em termos pneumatológicos e eclesiológicos.
Ao lado dessa pars destruens, configura-se uma leitura diferente, inspirada no Concílio Vaticano II, que, no plano fundamental, pode permitir uma nova visão do sujeito ministerial, superando os gargalos de uma “reserva masculina” não apenas teologicamente justificada, mas até mesmo reivindicada como definitiva. Sair desse labirinto, que mistura argumentos de fato e argumentos de autoridade, é, enfim, não só possível, mas também necessário.
No plano teológico-dogmático, Luca Castiglioni, com o título “Mulheres e ministerialidade eclesial”, desenvolve uma apresentação do tema em que se analisa, com grande atenção e refino, a emergência da atenção a ele a partir de 1964, durante o Concílio, com a preparação de uma série de argumentos, que são minuciosamente revisados, oferecendo uma leitura límpida e persuasiva deles, da qual emergem os limites teológicos e os condicionamentos culturais dos procedimentos discursivos com os quais se tentou responder à nova compreensão da mulher na cultura e na sociedade.
A investigação acurada das argumentações a propósito da ordenação presbiteral e da ordenação diaconal, distinguindo bem entre razões fundamentais, argumentos de conveniência e silêncios constrangidos e constrangedores, chega a uma releitura da questão que, se avaliada no que diz respeito ao tema mais geral da reavaliação do ministério, aparece como “segunda”, mas de forma alguma pode ser considerado secundária.
No plano histórico-sistemático, Andrea Grillo, sob o título “Sem autoridade para admitir ou sem autoridade para excluir?”, examina o desenvolvimento histórico das argumentações, mostrando uma virada epocal na passagem da “sociedade da honra” para a “sociedade da dignidade”, recebida pela Igreja Católica a partir da encíclica Pacem in terris (1963).
A elaboração de novos argumentos, devido à imediata inviabilidade de todos os argumentos clássicos, fundamentados no preconceito em relação à mulher, leva a uma “negação de autoridade”. Se a teologia constatou nos últimos 50 anos que o sexo feminino não é mais um “impedimento” ao exercício da autoridade, desse modo desbloqueia-se o dispositivo cultural e eclesial, que, durante séculos, considerou a reserva masculina como um dado insuperável. O fato de não poder incluir transforma-se, assim, quase inadvertidamente, em não poder excluir.
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“Com toda parrésia e sem impedimentos” (At 28,31): as mulheres e o ministério ordenado. Artigo de Andrea Grillo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU