07 Março 2024
Órgão instaurou procedimento administrativo para acompanhar as políticas públicas para combater as irregularidades na área de influência da rodovia, sobretudo a invasão de áreas públicas.
A reportagem é publicada por ClimaInfo, 06-03-2024.
Se a Ferrogrão é a “Belo Monte” dos trilhos, a versão rodoviária da tragédia socioambiental representada pela hidrelétrica é a BR-319. Com cerca de 900 km entre Manaus (AM) e Porto Velho (RO), a estrada, cujo asfaltamento do trecho do meio está sendo estudado pelo governo, já é um manancial de problemas antes mesmo de ser pavimentada. Ainda assim, políticos da Amazônia e o vice-presidente Geraldo Alckmin defendem a obra.
Diante da pressão crescente (no fim de janeiro, o secretário-executivo do Ministério dos Transportes, George Santoro, disse que asfaltar a rodovia é um “compromisso” do governo Lula), o Ministério Público Federal (MPF) resolveu agir. O órgão instaurou procedimento administrativo para “acompanhar as políticas públicas para combate de abertura de ramais, grilagem de terras e degradação e/ou desmatamento na área de influência” da BR-319, “impulsionadas pela invasão de Áreas Públicas, especialmente em Florestas Públicas não Destinada”, diz a Portaria 10 do MPF, publicada na 5ª feira passada (29/2), informa o 18horas.
A rodovia já tem mais de 5.000 km de ramais nos municípios de Canutama, Humaitá, Manicoré e Tapauá, no Amazonas, de acordo com informações do Observatório da 319, rede de organizações civis que monitora a influência da estrada em 13 municípios e 111 áreas protegidas. Seus principais motores são a grilagem de terras, o desmatamento e a degradação florestal, diz Tayane Carvalho, consultora do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam).
“A BR-319 viabiliza o surgimento e expansão de ramais e, juntamente com a BR-230 (Transamazônica), são os principais vetores de desmatamento nesses municípios”, descreveu a especialista.
Imagens de satélites e bancos de dados públicos mostram que a maior rede de ramais está em Canutama (1.755,7 km), seguido por Manicoré (1.704,1 km), Humaitá (1.455,6 km) e Tapauá (176,8 km). Terras Indígenas ao sul de Manicoré estão entre as 10 mais desmatadas na Amazônia há meses. E alguns ramais se aproximam da Floresta Estadual de Tapauá.
Nada disso parece sensibilizar Geraldo Alckmin, vice-presidente da República e também ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. Em reunião da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) na semana passada, Alckmin não só defendeu o asfaltamento da BR-319 como reforçou seu apoio à exploração de potássio em Autazes, em área reivindicada pelo Povo Mura, informa a Folha.
A pavimentação da BR-319 também foi defendida pelo senador Omar Aziz (PSD-AM). Segundo o parlamentar, Amazonas e Rondônia “não pertencem à Federação Brasileira” sem o asfalto na rodovia, segundo a Folha BV.
Aziz, que se destacou pelo rigor à frente da CPI da COVID, ao mostrar a tragédia que foi o governo do inominável na administração da pandemia, precisa ler urgentemente um artigo dos pesquisadores Lucas Ferrante, da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), e Guilherme Becker, da Universidade Estadual da Pensilvânia (EUA). O estudo mostra que o asfaltamento da BR-319 pode prejudicar as metas climáticas ao acelerar a perda da biodiversidade no bioma, além de propiciar saltos de zoonoses – doenças infecciosas transmitidas dos animais para os seres humanos – que podem desencadear novas pandemias.
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Ramais ilegais e grilagem na área de influência da BR-319 na mira do MPF - Instituto Humanitas Unisinos - IHU