26 Junho 2023
Como uma teologia sempre agônica definiu Luiz Carlos Susin a Teologia da Libertação, algo que nasce de seu desígnio e sua missão: “ser um pensamento de luta com a morte em defesa da vida”.
A reportagem é de Luis Miguel Modino.
Em sua intervenção no Encontro de Ameríndia, que acontece em Manaus de 22 a 26 de junho, Luiz Carlos Susin refletiu sobre o grito agônico originário da Teologia da Libertação, algo presente em frei Antônio de Montesinos, no início do anúncio do Evangelho nas Américas, que denuncia “o ‘pecado original’ que está na raiz da condição colonial das Américas e da América moderna”, o que também foi assumido por frei Bartolomeu de las Casas, em quem “emerge a má consciência escondida do sacrifício em grande escala nos alicerces da economia colonizadora”. Ambos se tornaram incômodos, afirmou Susin, “foram execrados em vista do bem maior de todo um sistema colonial legitimado a abençoado pela religião da cruz”.
“Pensar dói”, segundo o frei capuchinho, que defendeu que “é necessária uma fortaleza interior para continuar pensando a dor com a esperança de vencer a dor”, insistindo em que “pensar é buscar libertação de toda dor”, e junto com isso em que “a fé viva, que não se reduz a uma burocracia religiosa”, definindo-a desde sua sensibilidade, o que faz com que a Teologia da Libertação seja vista por Susin como “mais do que um pensamento estritamente intelectual”, afirmando que “tornou-se uma teologia pública”, sendo assumida como bandeira de luta de movimentos sociais e de pessoas concretas.
O frei capuchinho questionou sobre os motivos do ódio à Teologia da Libertação, uma atitude presente desde seu nascimento, hoje muito frequente na vitrine caótica da internet, onde é presentada como algo maléfico para a Igreja, mesmo sabendo, citando o pensamento de Diogneto, que “os que odeiam não sabem dizer o motivo de seu ódio”, mas lincham todos os suspeitos de fazer parte dela. Nesse ódio se unem, segundo Susin, “o conservadorismo e os privilegiados eclesiásticos com a direita política protegendo ou reclamando seu status quo e tendo em ambos os espaços o povo como massa de manobra”.
Os princípios da libertação, da misericórdia e da esperança, constitutivos da Teologia da Libertação, tem, segundo Suzin, “raízes bíblicas profundas" (Foto: Luis Miguel Modino)
O teólogo refletiu sobre a memória dos lugares teológicos, afirmando que “a Teologia da Libertação ganhou muito com a recuperação da historicidade do pensamento e dos contextos sociais e culturais em que se pensa”, um lugar teológico do qual fazem parte essencial “os povos da América Latina, com seus clamores e riquezas culturais e espirituais”, enfatizou. Susin constata que os adeptos da Teologia da Libertação têm afinidades com aqueles que “trabalham pela transformação da realidade em vista da justiça social, da dignidade dos mais pobres e dos movimentos sociais que têm energia de transformação”.
Ele convidou a “se questionar pelo lugar desde onde Deus se revela, para que não seja um Deus fabricado por nossos desejos”, que a Escritura situa no “lugar da humildade, do clamor, do que é pequeno, do último e do que é mais frágil, do oprimido e do mais vulnerável, enfim, do pobre, do escândalo e da loucura, dos que nada são para confundir a soberba dos que pensam que são”.
O princípio libertação, o princípio misericórdia e o princípio esperança são princípios constitutivos da Teologia da Libertação, afirmando Susin que “todos têm raízes bíblicas profundas”, estando relacionados entre si, insistindo em que “na Teologia da Libertação não há uma ordem linear e hierárquica”, considerando-a como algo circular, sabendo que o círculo é “a festa da Trindade”.
Susin mostrou teologias que se apoiam no princípio libertação, analisando a relação entre o princípio decolonial e a Teologia da Libertação, que desde o início se posicionaram “como a crítica ao eurocentrismo, à economia de mercado e sua globalização colonialista, a crítica à colonização cultural e inclusive religiosa”. O teólogo convidou a não ficar só na denúncia, afirmando a necessidade de “demostrar a diversidade de dons, de riquezas humanas e ecológicas”, buscando a conexão com o Reino de Deus, de “um Deus que se aproxima, que baixa em kénosis”, pois “não há transfiguração sem a cruz”.
O teólogo insiste em que “há muitas razões para a teologia lutar, ela é um princípio de libertação, dar condição de agonia aqueles que estão em iminência de morte”. Junto com isso, o princípio misericórdia, que é a sensibilidade, a compaixão que une aqueles que estão em condições realmente de iminência de morte”. Em relação ao princípio da esperança, ele o definiu como “aquele que olha para além da batalha, olha o futuro, ainda que o presente seja muito difícil. É lutar contra toda esperança, mas é sempre lutar. A Teologia da Libertação tem esse aspecto de luta, junto com lutas populares, lutas dos movimentos sociais, aquelas lutas que fazem a história se mover. E essa mobilidade, ela é radical, exatamente porque ela é feita nesse abismo entre a vida e a morte”, afirmou.
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Teologia da Libertação: “Um pensamento de luta com a morte em defesa da vida”, afirma Luiz Carlos Susin - Instituto Humanitas Unisinos - IHU