12 Abril 2023
"Paz, desarmamento, direitos, inclusão social: só raciocinando e agindo sobre essas questões é que podemos entender a atualidade e a força desse legado que nos foi deixado por Martin Luther King", escreve Paolo Naso, em artigo publicado por Riforma, revista das Igrejas Evangélicas Batistas, Metodistas e Valdenses, 07-04-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
Há cinquenta e cinco anos, em 4 de abril de 1968, em Memphis, no estado do Tennessee, foi assassinado o pastor batista afro-americano Martin Luther King, líder do movimento pelos direitos civis. Nascido num país ainda segregado, em que havia espaços só para brancos e outros só para negros, onde na prática se impedia o direito de voto para os afro-americanos, em uma época ainda marcada pelo racismo mais violento, King morreu em um país que estava se transformando. A lei de 1965 tinha finalmente reconhecido também aos negros o pleno direito de voto, formalmente haviam sido eliminadas as leis sobre a segregação e, pelo menos em algumas áreas, iniciava-se uma reflexão crítica sobre o pecado original dos EUA: o racismo, com seus trágicos corolários de tráfico, comércio e uso de escravos para fazer progredir a economia nacional. Foi uma página imoral e até blasfema porque, com raríssimas exceções, igrejas e comunidades cristãs nos Estados Unidos aceitaram a escravidão como fato natural, uma variável possível das relações sociais e econômicas.
O movimento de King foi político, é claro, mas acima de tudo ele reuniu uma frente de consciências: num país também dividido por barreiras confessionais, soube unir católicos e protestantes, judeus e muçulmanos, leigos e agnósticos e, em alguns casos, até conservadores e progressistas. Foi um tempo de esperanças excepcionais, perfeitamente expressas no famoso discurso que King proferiu no Lincoln Memorial em Washington em 28 de agosto de 1963.
Um discurso memorável, proferido de improviso, no qual aquele pregador negro delineou o verdadeiro sonho americano: aquele de um país reconciliado que busca a justiça e derruba as barreiras da cor da pele e da origem étnica. No entanto, em poucos meses, aquele sonho se transformou em pesadelo.
Poucas semanas após o grande comício em Washington, de fato, um atentado racista da Ku Klux Klan assassinou em Birmingham no Alabama 4 garotinhas negras. Elas estavam participando de uma aula da Escola dominical na Igreja Batista da 16th Street quando uma bomba letal explodiu às 10h30. Não foi a última. Naquele que o próprio King chamava de caminho no deserto rumo à terra prometida, haveria outras atribulações, outras vítimas, outras lutas. Como aquela que King estava conduzindo na véspera de seu assassinato: a organização de uma grande marcha contra a pobreza, uma mobilização que teria unido brancos e negros atingidos por uma crise econômica em grande parte causada pelos investimentos militares para financiar a guerra no Vietnã.
Essa foi a última batalha de King antes de ser morto: a denúncia do entrelaçamento entre racismo, militarismo e pobreza, faces de um único mal que atentava contra a consciência dos EUA. E é nesta denúncia que deve ser buscada a chave de seu assassinato que, segundo as investigações, não teria mandantes, mas apenas um modesto executor de baixo perfil criminal. Depois de tantos anos a sentença condenatória para o único responsável por aquele atentado parece fraca e cheia de interrogativos.
Cinquenta e cinco anos depois os EUA mudaram muito, tiveram até um presidente negro e o próprio King é uma espécie de herói nacional.
No entanto, o racismo estadunidense não está morto. Muitos afro-americanos na prisão, muitos que vivem abaixo da linha da pobreza, muitas vítimas negras inocentes mortas pela força policial, muitos bairros só para negros, cada vez mais degradados e marginais.
Tampouco cessou a corrida armamentista, contra a qual King se engajou nos últimos anos de sua vida, pedindo a conversão dos gastos bélicos em investimentos sociais. E então, mais do que os monumentos que celebram o pregador negro, é preciso olhar para os movimentos que os interpretam a sua herança moral, política e espiritual.
Paz, desarmamento, direitos, inclusão social: só raciocinando e agindo sobre essas questões é que podemos entender a atualidade e a força desse legado que nos foi deixado por Martin Luther King.
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O legado de Martin Luther King - Instituto Humanitas Unisinos - IHU