03 Setembro 2022
O teórico da “colapsologia” Pablo Servigne publica, com Gauthier Chapelle, um livro pedagógico, L'Effondrement (et après) expliqué à nos enfants… et à nos parentes [O colapso (e depois) explicado aos nossos filhos… e aos nossos pais]. Nesta ocasião, Marianne conversou com essa figura-chave da ecologia, que nos contou as razões de um silêncio de dois anos na mídia.
A entrevista é de Youness Bousenna, publicada por Marianne, 01-09-2022. A tradução é do Cepat.
Desde o primeiro confinamento, Pablo Servigne desapareceu dos radares. Tendo ganhado os holofotes após ter teorizado o possível colapso da nossa civilização em Comment tout peut s’effondrer (Como tudo pode desmoronar), escrito em parceria com Raphaël Stevens (Seuil, 2015), o engenheiro agrônomo de 44 anos tornou-se uma figura midiática e polêmica. Após meses de intensa exposição, decidiu parar tudo na primavera de 2020, retornando apenas neste outono com um novo livro voltado para o público em geral.
Por que você sentiu a necessidade de escrever um novo livro sobre o colapso?
Percebemos que nossos livros anteriores eram muito intelectuais e não atingiam muito o grande público. Ora, escrever livros para todos faz parte do nosso projeto. Como Jean-Marc Jancovici fez com Le monde sans fin (O mundo sem fim), sua história em quadrinhos co-escrita com Christophe Blain, precisamos de formatos mais diversos. Le Seuil, a editora que nos edita, nos propôs completar sua coleção “explicada para minha filha”. Faltou sobre este tema um pequeno livro intergeracional e acessível, legível dos 7 aos 77 anos.
Este retorno editorial acontece após um longo silêncio, consecutivo a uma onda de muita exposição na mídia. Por que essa retirada?
A mídia não é um objetivo em si e, de fato, optei por dar um passo atrás durante o confinamento porque estava exausto. Tive que me dar tempo, analisar os acontecimentos, mas também digerir todas as expectativas, críticas e solicitações geradas pelo frenesi midiático em torno da colapsologia [disciplina que estuda o colapso forjado em Como tudo pode desmoronar, em 2015]. Todos viram o que queriam ver, e alguns se divertiram fazendo disso um espantalho retórico para melhor derrubá-la. Nunca procurei essa exposição toda: a notoriedade é a minha pedra de Sísifo, que carrego como dever porque quero que a nossa mensagem seja transmitida.
Desde a pandemia, recusei 95% dos convites que chegavam às dezenas, principalmente para deixar espaço para outros lançadores de alertas e jovens. Com o confinamento, os microfones do mundo inteiro se voltaram para mim para me perguntar se era o fim do mundo. No entanto, não quero produzir blá blá blá, mas pensamento. Eu preciso de muito tempo. Em 2020, eu me esgotei ao cair num ativismo, e então parei tudo: meus projetos, falar em público, a política... Tive que descansar e me recentrar, com meus entes queridos. Agora estou recomeçando pouco a pouco. É por esta razão que este livro aparece quase três anos depois. Ele amadureceu com nossos avanços, nossas fragilidades e nossos filhos.
Após ter provocado fascínio, a colapsologia viu-se acusada de todos os males e, você, um profeta da desgraça. Como explicar tantas paixões?
As razões do entusiasmo pela colapsologia me intrigam, e não é de hoje. Acredito que o poder de Como tudo pode desmoronar é que pensamos que estávamos fazendo ciência, mas na verdade criamos uma narrativa. E em um país antirreligioso desprovido de uma narrativa sobre seu futuro, esse plausível risco de colapso despertou um mito, o do fim do mundo, reprimido no inconsciente coletivo. Inicialmente, nossa editora imprimiu mil exemplares do livro, achando-o muito deprimente para vender: já passou da marca de 100.000!
Durante três anos, tivemos críticas favoráveis e boas vendas, o que o tornou um best-seller no meio ecológico. Mas 2018 representou um ponto de inflexão: o pedido de demissão de Nicolas Hulot, o relatório especial do IPCC, o estudo científico que evoca a possibilidade de que a Terra pudesse se tornar um “planeta estufa”, as marchas pelo clima, o surgimento de Greta Thunberg e do Extinction Rebellion, seguido da revolta dos coletes amarelos, repercutiu com a publicação do nosso segundo livro, Une autre fin du monde est possible (Um outro fim do mundo é possível), e entrevistas no canal Thinkerview e no Le Monde. De repente, nos tornamos uma espécie de ícones.
Foi nesse momento que saímos do nicho ecologista para atingir um público mais amplo. Muitos se sentiram compelidos a dar sua opinião sobre a colapsologia e autorizados a dizer qualquer coisa: o debate tornou-se então amplamente irracional. Nosso trabalho científico, complexo e transdisciplinar, tornou-se menos visível, o bebê colapso transformou-se em um monstro de Frankenstein e escapou do nosso controle. Penso que o lançamento do livro de Yves Cochet, Devant l’effondrement (Diante do colapso), publicado pela Les liens qui libèrent, 2019, irritou muita gente porque descreveu esse cenário único como certo. Tudo foi então colocado no mesmo saco, provocando muitos mal-entendidos.
Vocês não participaram situando o debate em um terreno irracional com a palavra “colapso”, que evoca um imaginário apocalíptico?
Devo confessar nossa ingenuidade: enquanto trabalhávamos em Como tudo pode desmoronar, não tínhamos toda consciência do valor religioso da palavra. Trabalhamos essencialmente sobre uma bibliografia científica no idioma inglês que utilizava o termo “collapse”, que encontramos em centenas de artigos! Nossa abordagem foi aproveitar essa literatura que evocava colapsos em disciplinas particulares para fazer uma análise transversal buscando avaliar um risco sistêmico. Era também uma palavra bombástica para fazer as pessoas reagirem, e é a que mais provocou afetos na sociedade na escala de toda a história da ecologia política. Mas é uma palavra muito poderosa porque o singular, isto é, o mito, muitas vezes esmaga o plural, que é a ciência.
Então este novo livro responde a um desejo de colocar o tema sobre novas bases?
O colapso me cansa, mas ainda faltam dois ou três pregos para acrescentar para completar o movimento. Por exemplo, após a colapsologia e a colapsosofia, um terceiro livro sobre a “colapso-praxis” está em andamento. Além disso, este livro para o público em geral era necessário porque a educação popular está no centro do meu compromisso. Este mais novo é, portanto, um trabalho de pedagogia ao mesmo tempo em que fornece atualizações e informações aprofundadas. Permite-nos especialmente aproximar a noção de geração, porque nós mesmos nos tornamos simultânea e estranhamente jovens e idosos, presos entre os mais velhos dos Trinta Gloriosos que vivem em uma adolescência patológica do “sempre mais”, e os jovens radicais que entram na ecologia pela porta do radicalismo.
Essa geração Greta é, para mim, semelhante à dos combatentes da resistência: aqueles que tinham 20 anos em 1940 não tinham horizonte de futuro e viam seu compromisso como uma questão de vida ou morte. Sua energia é muito mais adulta do que a da geração boomers com seus medos infantis dos limites, do sofrimento e da morte. Aos 44 anos, sinto que posso falar para todo mundo.
Você parece ter evoluído em alguns pontos: enquanto “Como tudo pode desmoronar” destacou amplamente os riscos de uma escassez de petróleo, você escreve neste novo livro que o desafio é “agora” deixá-lo no subsolo.
Se eu fosse reescrever Como tudo pode desmoronar, de fato desenvolveria mais o risco climático, que se agravou em sete anos. O problema com o petróleo é que temos ao mesmo tempo muito e pouco. A metáfora do viciado é perfeita: muito, é a overdose (risco climático), e pouco, é a violência da retirada (risco de escassez). É grave consumir gás em excesso, mas também não ter mais nenhum! A colapsologia consiste justamente em articular esses riscos e empregar o pensamento complexo para compreender esse paradoxo.
O desafio seria, em última análise, acelerar o colapso da civilização termoindustrial para preservar a habitabilidade da biosfera, fazendo tudo para garantir que esse colapso não leve ao caos e a milhões de mortes. É uma linha de crista política e moral.
Com sete anos de retrospectiva, o rumo dos acontecimentos valida sua leitura?
Desde a introdução do nosso livro de 2015, nós alertamos que o colapso seria heterogêneo: dependerá da sucessão de eventos, países e culturas. Somente os historiadores do futuro poderão dizer se estamos vivendo o início de um colapso global. No entanto, observo que, desde 2015, houve muitas mudanças: o clima, a pandemia, as guerras ou a trumpização do mundo.
Há sete anos teria sido impensável imaginar apelos de sobriedade vindos das grandes petrolíferas ou de Emmanuel Macron! Mas, enquanto isso, alguns também trabalharam sua resiliência, como as finanças, que ainda não entraram em colapso, o que é catastrófico [risos].
Que modelos o inspiram em vista de uma sociedade pós-colapso?
Não gosto de pensar em modelo, porque é a visão de um engenheiro. Prefiro ver o futuro como uma floresta depois de um incêndio: brotos novos surgirão em cada território, e não sabemos como será a floresta do futuro. Tudo deve ser feito do chão, de baixo, de forma coordenada, porque o que vem de cima é tóxico e consome muita energia.
A grande questão política é escolher o que queremos empurrar para o colapso (a Bolsa, as companhias petrolíferas...) e o que queremos evitar que entre em colapso, como os lençóis freáticos e as florestas. Coloquemo-nos no lugar dos resistentes: quando o horizonte está bloqueado, o esforço a ser feito é nos unir e imaginar um futuro. Então encontrar a coragem para agir e confiar um pouco na sorte, sem certeza do sucesso. A esperança consiste nisso.
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“O bebê colapso transformou-se em um monstro Frankenstein e escapou do nosso controle”. Entrevista com Pablo Servigne - Instituto Humanitas Unisinos - IHU