28 Junho 2022
Nesta terça -feira, 28 de junho, a Comissão da Verdade apresentará ao país o Relatório Final sobre o conflito armado colombiano.
A extensa e exaustiva investigação conta com 28.543 relatos de vítimas, povos indígenas, afro, camponeses, membros de grupos armados ilegais, da Força Pública, políticos, empresários e outros atores da sociedade civil que alguma forma tiveram algo a ver com o conflito armado.
Este relatório também tem uma particularidade: como nenhum outro no mundo, contará os efeitos sobre as mulheres e a população LGBTI, crianças e adolescentes. Além disso, terá um capítulo inédito dedicado ao exílio: aqueles milhares de colombianos que tiveram que deixar o país por causa do conflito.
Durante quase três anos, 13 comissários - dois deles que morreram no desempenho de seu trabalho -, 290 pessoas em Bogotá, 200 pessoas distribuídas nos territórios e 120 transcritores examinaram e detalharam as verdades ocultas da guerra, quais foram suas causas e porque ela durou por tantos anos.
“A Colômbia precisava da convocação para essa grande paz acima de todos os interesses políticos dos partidos. Não tivemos a liderança nacional, não só da presidência, mas de toda a sociedade para construir a paz. E assim o discurso da paz foi rebaixado, foram colocados adjetivos para controlá-lo, foi retirado do estado de opinião e hoje na campanha política é politicamente incorreto falar de paz. Os candidatos não o mencionam porque a paz não dá votos. Com a ausência dessa grande paz, não houve transformação do sistema de segurança para as comunidades, nem a chegada do Estado com a Reforma Rural Integral. O resultado tem sido que mais de mil líderes foram assassinados desde que a paz foi assinada”, afirma Francisco de Roux.
Agora publicamos a nova entrevista exclusiva com o presidente da Comissão de Esclarecimento da Verdade da CEV, o jesuíta Francisco de Roux, realizada no domingo, 19 de junho, h. 12h30 na Igreja La Soledad em Bogotá, antes do encerramento das eleições onde o povo colombiano elegeu o novo presidente da República, Gustavo Petro.
O padre jesuíta Francisco De Roux, presidente da Comissão de Esclarecimento da Verdade da Colômbia (Foto: Reprodução | Religión Digital)
A entrevista é de Christian Morsolin, publicada por Religión Digital, 27-06-2022.
Fala-se que todos os comissários da CEV vão se refugiar na Argentina e no México devido ao perigo de possíveis ataques iminentes. Pe. Roux, o que você acha?
A guerra dos meios de comunicação nesta campanha eleitoral é impressionante. Como presidente da Comissão de Esclarecimento da Verdade da CEV, vou mostrar minha cara. Só sairei do país no dia 14 de julho para uma audiência no Conselho de Segurança das Nações Unidas para apresentar o relatório final da CEV, e no dia 15 de julho participarei de reuniões institucionais em Washington. Espero viajar a Roma em breve porque solicitei uma audiência pessoal com nosso amado Papa Francisco. Além desta agenda, estarei sempre na Colômbia.
Neste segundo domingo de turno (19 de junho de 2022), será eleito o novo presidente da república. Pe. Roux, o que você acha disso?
Como presidente da Comissão de Esclarecimento da Verdade da CEV, não posso comentar questões eleitorais.
Mas acho útil falar sobre o Evangelho de hoje para refletir junto com a Agência Sir e o Religión Digital.
O Evangelho de hoje fala sobre a distribuição dos pães e peixes que Jesus vai repartir com todos e sobraram 12 cestos de pão. Hoje na Colômbia estamos em uma situação em que desde o fechamento das assembleias de voto, às 16h da tarde e agora não sabemos o que vai acontecer. Eu os convido a serem crentes. Deus nos fala através dos eventos, Deus confia que o povo colombiano escolherá entre esses dois candidatos Petro e Hernández, ambos candidatos querem uma profunda transformação do país. Eles nos desafiam.
Gustavo Petro, em igreja em Jericó, Antioquia. (Foto: Reprodução | Religión Digital)
Pode ser um candidato ou outro, mas Deus nos dá um sinal claro de que NÃO temos medo, não temos que lutar. Deus move a história. Para não dizer, com os próximos resultados para escapar no exterior. Não. Deus pede ao povo colombiano que se una pelo bem comum do país, criamos um clima de nação com uma atitude serena de diálogo, como nos ensina o Papa Francisco na encíclica Fratelli Tutti.
Aceitamos os resultados e vamos construir uma nação com muitas diversidades, com os resultados eleitorais que sairão em breve.
Deus está nos chamando para agir, para construir um novo caminho para a transformação do país. Então vamos fazer um novo pacto, uma nova aliança onde Deus oferece seu sangue para ser derramado na Cruz.
Vamos todos construir uma nova comunidade de amor, de perdoar uns aos outros, de ser discípulos autênticos. Hoje existe a tragédia do medo, da insegurança, do assassinato de líderes sociais e ex-combatentes, onde na Colômbia levamos a níveis muito altos de violência em todos os níveis.
Francisco De Roux concedeu entrevista ao IHU, em 2015. (Foto: Leslie Chaves | IHU)
Deus vê o complicado drama humano na Colômbia e dá a sua vida, diz... "Conheço as tuas histórias pessoais na Eucaristia"... e Jesus, como mistério de Deus, chama-nos à reconciliação entre todos, à atenção a todos os famintos, aos abandonados nas prisões, aos sedentos de justiça, buscando o amor, a reconciliação, perdoemos a todos, não continuemos nos matando. Pedimos a Deus que nos dê audácia e esperança de sermos construtores da paz nos acontecimentos da história de hoje na Colômbia.
Na próxima terça-feira, 28 de junho, de Roux, será apresentado o relatório final...
Há muita pressão porque em oito dias vamos apresentá-lo. Em oito dias estamos prontos. Não entregaremos o relatório completo. Apresentaremos uma mensagem ao País e ao longo de julho publicaremos todos os volumes, mais de uma dúzia, do relatório completo da CEV para o bem comum da Colômbia. No dia 29 de junho apresentaremos um resumo das constatações, devidamente fundamentadas, e uma declaração do Estado. Agora vou a Villa de Leyva para ficar longe do barulho eleitoral.
De Roux, qual tem sido a tarefa da comissão da verdade desde que você iniciou sua investigação em novembro de 2018?
Ouvimos mais de 27.000 depoimentos de vítimas, de responsáveis, ouvimos de muitas pessoas que depuseram suas armas, que portavam armas legalmente do Estado. Mais de 27 mil, não só na Colômbia, mas em 24 países ao redor do mundo, onde há vítimas que deixaram a terra colombiana devido ao conflito armado interno.
Nossa principal tarefa tem sido ouvir, receber essa informação, analisá-la, contrastá-la com as fontes oficiais, identificar padrões e, a partir disso, produzir esta investigação. Mas este exercício de escuta sempre foi acompanhado por um exercício de diálogo público. Temos estado publicamente e em meio à pandemia por meio de vários aliados e meios de comunicação. Também permitimos o diálogo entre vítimas e responsáveis, sobretudo promovendo e acompanhando processos de reconhecimento de responsabilidade, onde aqueles que portaram armas reconhecem a violação, a dor que causaram e pedem perdão.
O presidente, Iván Duque, está a dois meses de concluir seu governo, deixando um legado de "fome e guerra" que fez o país retroceder "em elementos fundamentais dos Direitos Humanos", denunciaram nesta terça-feira, 14, cerca de 500 organizações sociais.
“É um legado que vem de uma linha autoritária e que historicamente violou os direitos humanos”, disse Aura Rodríguez, porta-voz da Aliança de Organizações Sociais e Afins, durante a apresentação do relatório em Bogotá.
De Roux, o que você pensa a respeito disso?
O padre jesuíta Francisco De Roux, presidente da Comissão de Esclarecimento da Verdade da Colômbia (Foto: Reprodução | Religión Digital)
Eu não queria falar sobre a política do presidente Duque... Melhor esperar o fim de seu mandato em agosto de 2022.
O Instituto para Paz e Desenvolvimento IPAZDE da Universidade Santos Tomas de Bogotá, dirigido pelo professor Andrés Inampues, acaba de entregar um relatório de apoio à Comissão de Esclarecimento da Verdade.
O que você acha das declarações da Comissária Lucia González, que conduziu uma lectio magistralis na Universidade Santo Tomas de Bogotá?
Agradecimentos ao Instituto de Paz e Desenvolvimento IPAZDE pelo relatório que estão me entregando e graças às contribuições da Universidade Santo Tomás.
Concordo com a comissária do CEV, Lucia González, que teve uma importante reunião na Universidad Santo Tomás. Estamos muito longe de ter uma sociedade e um Estado que reconheça a igual dignidade humana de todos, a começar pelos excluídos e empobrecidos, pelos jovens dos bairros marginais, indígenas, afros, camponeses.
Permitimos o diálogo entre as vítimas e os responsáveis, sobretudo promovendo e acompanhando processos de reconhecimento de responsabilidade, onde aqueles que portaram armas reconhecem a violação, a dor que causaram e pedem perdão
“Jamais chamaria padre Javier Giraldo (CINEP) ou padre Francisco de Roux (presidente da Comissão de Esclarecimento da Verdade) de jesuíta marxista”, comentou a deputada Juanita Goebertus (Aliança Verde) durante a conversa organizada no último domingo, 24 de abril de 2022, pelo jornal El Espectador e o projeto Colombia+20 (patrocinado pela Embaixada da Alemanha na Colômbia) na Feira Internacional do Livro FILBO 2022 em Bogotá, sob o título: “O Acordo de Paz foi quebrado?”
Francisco de Roux, você e o padre Javier Giraldo (Cinep e Tribunal Permanente dos Povos TPP) são jesuítas marxistas?
O padre Javier Giraldo e eu não somos marxistas, somos pessoas dedicadas a trabalhar pela paz e pela reconciliação. Sabemos que somos sinais de contradição porque onde houve tantas injustiças e mais de 10 milhões de vítimas, há muito medo da verdade. Mas vamos continuar trabalhando até o fim….
Francisco De Roux, em palestra concedida ao IHU, em 2015. (Foto: Susana Rocca | IHU)
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
“Apesar das ameaças, estarei sempre na Colômbia para mostrar a cara”, afirma o jesuíta Francisco de Roux, presidente da Comissão da Verdade - Instituto Humanitas Unisinos - IHU