30 Mai 2022
"Zuppi demonstrou em Bolonha aos mais céticos de ser um sacerdote do governo sábio, um cristão imparcial, um homem de paz e um pastor capaz de estilo sinodal: agora deve compartilhar essas virtudes com o secretário geral e com todos. Se for bem-sucedido, o país poderá contar com a Igreja na crise que o espera", escreve Alberto Melloni, historiador italiano, professor da Universidade de Modena-Reggio Emilia e diretor da Fundação de Ciências Religiosas João XXIII, de Bolonha, em artigo publicado em La Repubblica, 28-05-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
O cardeal Zuppi, arcebispo de Bolonha, é o primeiro presidente realmente eleito pela Conferência Episcopal Italiana - CEI. Cada um de seus antecessores de 1952 a 2017 foi escolhido pelo Papa, com ou sem consultas. Com o Cardeal Bassetti, a votação começou em uma lista tríplice. Mas naquela ocasião era evidente que o Papa preferia o arcebispo de Perugia: e isso lhe rendeu oito votos a mais que o segundo.
Com Zuppi, ao final de um procedimento muito delicado, aconteceu algo diferente. Foram os bispos que escolheram um nome que os expressa: e Francisco concordou de bom grado em indicar seu ex-auxiliar como presidente da CEI. E ele agiu de forma correta. Porque o problema do episcopado não é o quanto um bispo se parece com o Papa ou quantas vezes ele repete com convicção ou bajulação suas palavras-chave, mas quanta comunhão ele expressa. Porque a comunhão dos bispos que se torna comunhão das igrejas é graça da Eucaristia e fruto do Espírito.
Em 24 de maio, portanto, foi votada a capacidade dos bispos de certificar a insuficiência daquela comunhão e criá-la. O resultado era incerto. Não porque houvesse - como sempre – algum ‘bispete’ vaidoso que não consegue deixar de tratar como usurpador aquele que ascende a cátedras superiores à sua ou porque exista - como sempre - algum emérito que não tem as qualidades espirituais para exercer a discrição e de que deu provas Bento XVI.
O problema eram aqueles bispos que - depois de dez anos do prudente assentamento do cardeal Bagnasco e daquele amigável do cardeal Bassetti - pareciam perdidos.
Alguns explícitos em lamentar o verticalismo de Ruini que nem sequer conheceram e o cinismo político com que sua igreja sempre conseguiu fazer vencer Berlusconi (mas nunca contra Prodi) e sempre conseguiu derrubar Prodi (mas nunca sem maquinações).
Outros paralisados pelo drama dos dilemas que tiveram e têm pela frente.
Desmantelar teologicamente uma pregação que sobrepôs ao Evangelho a superstição chauvinista que abre a porta aos abusos, ao silêncio e ao feminicídio, ou se limita ao moralismo masoquista que só tem "vergonha" (vereor gognam) e pouco liga para um crime que perpassa toda a sociedade e destoe a vida de meninos e meninas? Neste clima, em que dizer “paz” parece uma blasfêmia derrotista, pode a Igreja dizer que este é o nome de Cristo ou deve apenas decidir de quem ser coroinha? E o sínodo pode ser um efetivo caminho de graça para decidir o que será o ministério após a extinção do clero ou deve alinhavar reuniões e questionários?
É este episcopado que foi chamado a votar e elegeu Zuppi, e por uma razão que o Papa, talvez, reconheceu. Ninguém pede a Zuppi para ser o terceiro presidente de uma decantação adormecida ou a longa manus de um papa com o braço já bastante comprido ou o vendedor de um partidinho católico morto e enterrado. A Igreja italiana pediu e pede a Zuppi para ser ele mesmo: e se a Igreja pede isso a ele, que todos os domingos leva à missa o dobro dos manifestantes de Cofferati contra o artigo 18, o país o pede a ele.
De fato, para além dos chavões açucarados sobre o "padre de rua" e "cardeal de bicicleta", Zuppi tem um mandato. Vacinado contra a autoironia por seu brasão eclesiástico (ele nasceu no Vaticano da irmã do secretário de Pio XI, e do diretor do Osservatore della Domenica) Zuppi demonstrou em Bolonha aos mais céticos de ser um sacerdote do governo sábio, um cristão imparcial, um homem de paz e um pastor capaz de estilo sinodal: agora deve compartilhar essas virtudes com o secretário geral e com todos. Se for bem-sucedido, o país poderá contar com a Igreja na crise que o espera.
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A missão de Zuppi. Artigo de Alberto Melloni - Instituto Humanitas Unisinos - IHU