12 Março 2022
“Os filmes do Wenders falam de tramas existenciais e deslocamento, que é o grande tema do século XXI. Você vê as pessoas na Ucrânia caminhando 12, 20 horas... as imigrações, a fuga por causa da guerra e, no caso do filme 'Paris, Texas', a fuga é por causa da dor de uma separação”.
A reportagem é de Vinícius Emmanuelli, estagiário e aluno do curso de jornalismo da Unisinos.
É difícil encontrar alguém que tenha visto o grande filme “Paris, Texas”, de Wim Wenders, e não tenha se emocionado com tamanho enredo. Ao contar a história de uma família que foi dividida e se reencontrou mais tarde, o diretor apresenta exemplos reais ou parecidos com dia a dia de muita gente. No início da história, antes da separação, a família tem vários problemas, a começar pelo ciúme obsessivo de Travis Henderson, personagem interpretado pelo ator Harry Dean Stanton.
O professor Faustino Teixeira, doutor em Teologia, conversou por live com o jornalista e editor do canal no Youtube “Paz e Bem”, Mauro Lopes, em evento promovido em parceria com o Instituto Humanitas Unisinos - IHU. “Eu vejo o cinema como uma das artes ou formas mais magníficas de traduzir e expressar o real que tanto gosto… do cotidiano e da vida. E Wim Wenders é um dos grandes expoentes do nosso cinema”, destaca Faustino.
A sinopse do filme narra um pouco do que a produção contará: Travis é encontrado cansado e com amnésia em meio ao deserto no sul dos Estados Unidos da América. Ao receber a notícia, seu irmão Walt (Dean Stockweel) corre para socorrê-lo após quatro anos desaparecido. O homem perdido e esquecido deixou para trás um filho pequeno e sua esposa Anne (Aurore Clément), que é mãe da criança chamada Alex (Hunter Carson).
“Os filmes do Wenders falam de tramas existenciais e deslocamento, que é o grande tema do século XXI. Você vê as pessoas na Ucrânia caminhando 12, 20 horas... As imigrações, a fuga por causa da guerra e, no caso do filme 'Paris, Texas', a fuga é por causa da dor de uma separação”, destaca Faustino. Segundo ele, os trabalhos do cineasta mostram muito as paisagens do local durante as filmagens, dando ainda mais emoções ao contexto que se apresenta para o espectador.
Com leque variado de pautas que se pode abordar ao longo da produção de Wim Wenders, é pertinente focar no ciúme entre casais, que tanto arruína casamentos e até famílias inteiras. É corriqueiro o relato de fatos negativos que acontecem devido a esse sentimento intenso, provocando até a morte em meio a um campo de batalha entre o amor e ódio.
Em 2014, o Papa Francisco deu uma declaração sobre o ciúme excessivo. Em janeiro daquele ano, o IHU publicou uma matéria (link aqui) sobre a posição do pontífice, na qual ele pede que as portas do ciúme, da inveja e das fofocas sejam fechadas na vida das pessoas. “O que o ciúme faz em nosso coração é uma inquietude cruel: não toleramos que um irmão ou irmã tenha algo que não temos”. Ele recorre à Bíblia para explicar: “Saul, ao invés de louvar Deus, como fizeram as mulheres de Israel, preferiu fechar-se e ficar lamentando consigo mesmo”.
O ciúme, continuou, “leva a matar. Foi pela porta da inveja que o diabo entrou no mundo. A Bíblia diz: ‘Pela inveja do diabo o mal entrou no mundo’. O ciúme e a inveja abrem as portas para o mal. Também divide a comunidade. Uma comunidade cristã, quando alguns dos seus membros sofrem de ciúme, de inveja, acaba dividida: uns contra os outros. É um veneno forte. É um veneno que encontramos na primeira página da Bíblia com Caim”, afirma.
Três anos depois, o Papa Francisco voltou a tocar no assunto do ciúme entre as pessoas. No mês de fevereiro de 2017, o IHU relatou o desejo do Papa de celebrar uma missa por um missionário especial que retornaria ao Oriente. Na ocasião, Francisco citou um trecho do livro de Gêneses, que falava sobre os irmãos Caim e Abel e a trágica história dos dois irmãos; é o primeiro relato de inveja e ciúme entre seres humanos, que culminou na morte de Abel. (link aqui)
Mas o que seria esse ciúme, muitas vezes doentio, e como ele se desencadeia? O ciúme patológico ou doentio, também conhecido como “Síndrome de Otelo” é uma sensação de que o indivíduo está sendo traído. Os relacionamentos envolvem o sentimento de ciúmes até em um certo estágio. Por isso, qualquer motivo tende a gerar sinais de traição, mesmo que não haja nada de concreto que possa apontar para tal traição. A pessoa ciumenta não traz argumentos baseados em fatos reais, mas em interpretações fora da realidade. Ela demonstra que seu(sua) parceiro(a) está se sentindo ameaçado(a) frente a uma situação.
Para quem gosta ou procura sentir as fortes emoções dos filmes, como a dor de uma separação, a força do amor, a incomunicabilidade, os longas-metragens do diretor Wim Wenders são excelentes para vivenciar e aprender com muitos temas que geram desconfortos na vida real de várias pessoas. “Eu fiquei muito tocado porque ele trabalha um tema que é muito forte: a destruição do amor. O amor tem uma força poderosa de aconchego, mas também de destruição”, enfatiza Teixeira.
Conforme analisa o pesquisador, o desenrolar do filme mostra que “todas as pessoas vivem um desencontro psíquico e, quando são acolhidas com palavras de amor, é o primeiro passo para a recuperação”. Não adianta apenas um lado demonstrar abertura; ambas as partes devem apresentar interesse em resolver os problemas e reatar o relacionamento que havia se perdido de alguma maneira. Não apenas em namoros ou casamentos, mas sim em qualquer tipo de vínculo interpessoal.
O vídeo do evento está disponível no Canal do IHU no YouTube e pode ser acessado aqui.
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Filme Paris, Texas e a destruição do amor - Instituto Humanitas Unisinos - IHU